Estórias da nossa história

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Como Barrigana perdeu 200 contos.

Barrigana, guarda-redes que o Sporting cedera... gratuitamente ao F. C. Porto, em vez de aceitar o convite do Vasco preferiu ir para Pedras Salgadas.

Em 18 de Maio de 1947 anunciou-se em Assembleia Geral que fora já feita a escritura de promessa dos terrenos das Antas e que o F. C. Porto entregara já 50 contos de sinal, ficando o preço do negócio combinado em 1440 contos.
Em Novembro, a Direcção informaria em Assembleia Geral que os terrenos da Vilarinha tinham sido vendidos à Câmara Municipal do Porto por 1440 contos, quantia essa que se destinava à compra dos terrenos das Antas, na antiga Quinta de Salgueiros, com 48 mil metros quadrados.
A edilidade ofereceria ainda, já em 1948, 600 contos para as obras das Antas... E, dois dias depois, em Assembleia Geral, o F. C. Porto decidiu reatar relações com o Benfica...
Em Julho o F. C. Porto defrontou os brasileiros do Vasco da Gama, tentando os seus dirigentes ganhar dinheiro que lhes alargasse o laço da corda que lhes cingia a garaganta, mas... Os portistas perderam por 0-2 e perderam, mais agrestemente, na tesouraria, já que o Lima não apresentou a enchente que se esperava, as despesas de organização tinham ascendido a 350 contos — só o Académico recebeu 20 contos, referentes a cinco por cento da receita líquida que continuava a cobrar pela cedência do seu campo e a jornada mais trouxe à colação, de forma cruciante, a necessidade do campo próprio...

Andebol... Clube do Porto – ou o fulgor com as mãos

Dois meses depois, o F. C. Porto, que fora apenas terceiro classificado no seu Campeonato Regional, considerado pela crítica em flagrante crise (a exemplo do futebol...), chegou ao Campeonato Nacional, sentiu a mística de uma prova onde sempre agiu como grande senhor, agigantou-se, conquistou com galhardia o direito de finalista e, na luta derradeira, contra o Sporting, reapossou-se brilhantemente do título... A grande figura voltou a ser Fabião. O extremo-esquerdo do F. C. Porto somou o seu oitavo título. Amador puro, chegou a sacrificar-se para que a sua equipa e o seu clube correspondessem, nunca desistindo ante qualquer contrariedade. Quando o F. C. Porto abandonou a prova, no ano anterior, após lamentável série de atitudes que o feriram, Henrique Fabião foi dos primeiros a lamentar a desistência. No entanto, disciplinado, sempre correcto, achou que à Direcção do clube cumpria decidir em último lugar e conformou-se. Mas Fabião era um combatente. E de si para si disse que haveria de voltar a ser campeão pelo... F. C. Porto. E foi. Por isso, ao receber a taça não foi capaz de conter uma lagrimeta de emoção. Venceu o Campeonato Nacional de Andebol (ainda de 11) pela oitava vez consecutiva em nove anos!
Por essa altura, em jeito de chacota, dizia-se em Lisboa que não tardaria a mudança de nome para... Andebol Clube do Porto, que talvez assim o clube passasse a ganhar alguma coisa no... futebol!

Barrigana disse não a 200 contos e foi a banhos.

Ao Porto chegou, entretanto, Gastão, jogador que ao serviço da Cuf se revelou das mais radiosas promessas do futebol português. O angolano deixou o Barreiro antes sequer de possuir a carta de desobrigação. Irredutível. E deixou claro que só jogaria no F. C. Porto. «Não jogaria em nenhum clube de Lisboa. Ofertas não me faltaram. Não me sentiria bem. Se quiser explicar-lhe porquê, nem mesmo eu o saberei. É uma preocupação de ordem sentimental....»
Barrigana, que o Benfica tentara contratar, convidado para ingressar no Vasco da Gama, em vez de fazer as malas e partir à conquista de quase 200 contos por ano preferiu ir a banhos... «Vou para Pedras Salgadas fazer o meu tratamento anual e como quero ir descansado fui dos primeiros a assinar a ficha pelo F. C. Porto». Era o tempo do futebol romântico...
Desolados, os dirigentes do F. C. Porto concluíram que o clube não poderia ter mais de 7500 associados, devido ao espaço acanhado do seu Campo da Constituição, onde estava previsto gastarem-se 300 contos para obras, de forma a não ter de pagar domingo sim, domingo não, cinco por cento das suas receitas líquidas ao Académico do Porto pelo aluguer do Lima. Era, de facto, uma sinecura para os academistas. Por isso, o F. C. Porto dificultou o acesso a novos associados, aumentando a jóia e as... quotas.
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22 irmãos de Ângelo e fuga de Szabo.

Saturado de derrotas, Szabo deixou o Porto sem dizer água vai... Da Argentina veio substituto, que se estreou no jogo em que o árbitro mandou prender um espanhol...

Szabo habituara-se a ganhar. O doce sabor da glória enternece. E embebeba como um néctar de deuses. Quem se habitua a ele descoroçoa-se na derrota. Foi o que lhe aconteceu. Por isso, bateu com a porta. E deixou o F. C. Porto sem sequer dar cavaco aos dirigentes, sem sequer querer receber cerca de 50 contos que tinha em dívida. Era Agosto de 1947 e na cidade corria o rumor de que fora para o Olhanense, pago a peso de ouro, com promessa de viver como um sibarita, em casa à beira-mar...
Carlos Nunes, então «capitão-geral» do F. C. Porto, assumiu interinamente o comando da equipa, que continuava em esforço de renovação e remoçamento. Um mês depois estreavam-se Virgílio Mendes, Gastão e Ângelo, mas apenas em Outubro, Cesário Bonito contratou, definitivamente, novo treinador: o argentino Vaschetto, que não muito antes integrara a equipa de São Lourenzo de Almagro, que goleou todas as equipas portuguesas...

Garrafa à cabeça de Ângelo...

Para jogar em Espanha, o Valência ofereceu ao F. C. Porto, para além de todas as despesas pagas, 50 contos e 300 pesetas por cada dia de jornada a cada um dos seus jogadores. Que sim. E foi já com Vaschetto que os portistas partiram. Para jornada de brilharete. O F. C. Porto bateu espectacularmente o Valência, campeão de Espanha, no seu próprio terreno, por 1-0, graças a golo de Catolino.
Grandes figuras da equipa foram, contudo, Gastão, Barrigana, Araújo e Ângelo Carvalho, jovem que se impunha na equipa. Curiosa a sua história: o aguerrido médio tinha, então, 11 irmãos vivos. Outros 12 tinham morrido, entretanto. E, em Valência, nesse jogo inesquecível para si, Ângelo Carvalho viveu, para além do prazer de uma grande tarde, incidente insólito: um espectador atirou-lhe uma garrafa à cabeça, ferindo-o ligeiramente. Pegou no projéctil, queixou-se ao árbitro, Pedro Escartin (que era correspondente de «A Bola» em Espanha), que lhe pediu «desculpa como espanhol» — e, suspendendo o jogo, dirigiu-se a um polícia, apontou o espectador, intimando o agente da autoridade: «Prenda-o à minha ordem.» E preso ficou...
Dois dias depois do regresso de Valência, a notícia brutal, mas já nem por isso inesperada: o falecimento de Miguel Siska, no dia 25 de Outubro...
Chegara ao Porto com 18 anos, tornou-se um dos símbolos do clube, foi campeão de Portugal como jogador, como treinador levou o F. C. Porto à conquista dos dois primeiros Campeonatos Nacionais da I Divisão. Quando a doença cruel lhe atacou os pulmões o F. C. Porto empregou-o na secretaria, continuando a pagar-lhe mensalmente o que lhe pagara como treinador: 1500 escudos, que ele não quis mais, podendo, se quisesse, ganhar o décuplo. O seu amigo Valdemar Mota dava-lhe 500 escudos por mês do seu próprio bolso para que pudesse comprar medicamentos. Ainda em vida, o F. C. Porto e o Boavista jogaram entre si e apuraram 10 contos de receita.
E, após a morte do ídolo, o clube organizou um festival desportivo, em que participou o Benfica, que rendeu 100 contos para a família de Miguel Siska, que fora aconselhado aos portistas por Akos Tezler — e depressa se nacionalizou português, rapidamente aprendeu a falar a nossa língua correctamente e a escrevê-la, de tal modo que assinou crónicas várias para jornais do Porto.
Secretamente, fora dos primeiros profissionais do F. C. Porto, nunca exercendo a profissão que escolhera na Hungria: mecânico-dentista...
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Comprar macaca para abater «leões»

O Sporting não parava de ganhar no Porto. Correu o rumor de que era obra de uma macaquinha. Ex-presidente portista comprou-a e prendeu-a na quinta dos jogadores

Desta feita o fulgor do F. C. Porto não chegou, sequer, ao Natal. Depois de duas vitórias nas duas primeiras jornadas do Campeonato Nacional de 1947/48, a 22 de Dezembro derrota em casa, frente ao Belenenses: 0-2. E, oito dias depois, nova derrota, no Campo Grande, frente ao Benfica, 1-4, em desafio que, para além de acentuar o eclipse dos portistas, teve cenas lamentáveis, envolvendo Guilhar e Julinho, com escaramuças várias, jogos de pontapés e esboços de cabeçadas, sempre com o árbitro a fazer vista grossa. Chegou a parecer que se estava no Parque Mayer...
Em Fevereiro, na penúltima jornada da primeira volta, o F. C. Porto bateu o super-Sporting por 4-1. Houve festa, como não se via na cidade havia muito. E para os portistas houve, na vitória que acendera outra vez a chama da esperança, um toquezinho de misticismo.

...E o ex-presidente comprou a exótica macaca

Sempre que o Sporting se deslocava ao Porto estagiava em Oliveira de Azeméis, onde existia uma macaca que era o seu amuleto. Os jogadores adoravam-na. A ela começaram a ligar, supersticiosamente, as «leoninas» façanhas.
E um dia o Sporting chegou a Oliveira de Azeméis e viu que a macaca da felicidade havia desaparecido. Sebastião Ferreira Mendes, que não muito antes chegara a presidente do F. C. Porto, sabendo dos seus estranhos atributos, decidira, num golpe audacioso, comprar a macaca. Pelo menos poderia ficar de consciência mais tranquila: o Sporting, se vencesse, não seria pelo empenho daquele exótico «décimo segundo jogador». E ciosa e secretamente a guardou na Quinta da Fonte Vinha, onde continuava a funcionar, no jeito modesto (e salazarengo) da casa portuguesa com pão e vinho sobre a mesa e não muito mais do que isso, para além de alguns animaizinhos de estimação criados pelos próprios jogadores, o lar dos jogadores.
O Sporting perdeu e nos anos seguintes voltaria a vacilar. E a tropeçar. A memória e o misticismo da macaca não deixavam de latejar como fantasma na cabeça dos seus jogadores, técnicos e dirigentes que, inclusivamente, se calhar para afastar os maus fumos da superstição, deixaram até de estagiar em Azeméis.
Mas, ao fim de algum tempo e de outros tantos insucessos, o Sporting voltaria a ganhar no Porto. Precisamente num jogo marcado por uma série de contratempos dos portuenses, com jogadores magoados e uma arbitragem muito infeliz.
Bizarro (ou talvez não): nesse dia se finara a macaca! E, um afilhado de Sebastião Ferreira Mendes, sportinguista devoto, quebrando o segredo do padrinho, denunciou a compra do místico animal, sem que, no entanto, desconcertasse quem quis ouvi-lo, garantindo que a vitória do Sporting fora obra do Além: «A macaca morreu e lá do outro mundo, ela que se recordou dos primeiros amores, não deixou de pedir pelo Sporting. Foi ela que fez o milagre...»

Traídos pelo amigo do bandarilheiro

A vitória por 4-1 sobre o Sporting, se tinha deixado a lucilar uma luzinha de esperança, de pouco valeu, já que, oito dias depois, as ilusões estilhaçadas, definitivamente, com a derrota do F. C. Porto, na Amoreira, frente ao Estoril, por 1-4. Figura do jogo, Bravo, autor de dois golos, estorilista que se despediu do clube, com palmas dos... adversários.
Conhecera, na pensão onde vivia, um bandarilheiro espanhol que se entusiasmara com o seu futebol, movendo esforços para que assinasse contrato com a Real Sociedad. E, pelos bons empenhos do toureiro, Bravo recebeu 60 contos por ano, de luvas, 2500 pesetas por mês, prémios e pensão paga em San Sebastian...
Apesar dessa derrota, os portistas estavam com 22 pontos, a dois pontos do Belenenses e do Sporting e a um do Estoril e do Benfica. Logo...

Os homens que o árbitro foi buscar à estação da CP

A 19 de Maio de 1948 o presidente da Direcção do F. C. Porto, Júlio Ribeiro de Campos, demitiu-se. A equipa de futebol acabara de se quedar pela segunda eliminatória da Taça de Portugal, arredada pelo Barreirense, mercê de um golo de Martins. Começara a disputar-se a competição em novo figurino — à inglesa, num único jogo a eliminar.
Logo na primeira eliminatória, os barreirenses protagonizaram um dos casos mais insólitos da história da Taça: ao fim dos 90 minutos estava o Barreirense empatado com o Vitória de Setúbal, a zero, o árbitro ignorava que em caso de empate tinha de haver prolongamento, deu o jogo por findo. Quando deu pelo lapso, ou alguém lhe chamou a atenção para a gaffe, resolveu recomeçar a partida, mas para isso foi preciso ir buscar à estação da CP os jogadores do Barreiro. Que ganhariam. E, depois, destruiriam mais uma vez o sonho portista...
A demissão de Ribeiro de Campos não passou de manobra de diversão — ou de jogada estratégica para reforço de confiança. E serviu também para, uma vez mais, denunciar as manobras contra o F. C. Porto em que se conchavavam, mais ou menos discretamente, alguns dos poderes do futebol português. Os sócios reconduziram-no e ele continuou a remar contra a maré...
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No reino de Salazar era assim

Scopelli fora humilhado pelo presidente do Belenenses. A DGD deu razão ao patronato, que usara a polícia para afastar o treinador. O F. C. Porto aproveitou...

Na ilusão de que pudesse ser ele o feitiçeiro por que se esperava já sebastianicamente, no arranque para a época de 1948/49 o F. C. Porto contratou para seu treinador Alejandro Scopelli, que pouco antes fora despedido do Belenenses. Fugira da guerra de França, fora acolhido pelo clube e como jogador se notabilizou. Treinador se fez e na rota do sucesso se manteve. Até que Octávio de Brito, treinador do Belenenses, tentou impor-lhe equipa para actuar na festa de despedida de Rafael. Não aceitou. O próprio presidente se ufanou de o ter expulso das cabinas das Salésias, com a ajuda da polícia «por se ter recusado a cumprir uma ordem da Direcção». Scopelli, assim despedido e humilhado, recorreu ao Tribunal do Trabalho, mas, apesar da razão moral que lhe pertencia, a 11 de Agosto recebeu da DGD despacho que «o despedimento resultante de graves incidentes foi legal e legítimo e nem outra solução se poderia adoptar e nenhuma indemnização terá o clube de pagar ao treinador»...
No dia 5 de Setembro de 1948, em partida em que se estrearam Vieira e Lino, contra o Famalicão (3-0), por deliberação da FPF, os jogadores portistas utilizaram, pela primeira vez na sua história, camisolas numeradas de 1 a 11.
Uma semana depois debutava na equipa o brasileiro Da Silva, que jogara na época anterior no Barcelona. Mas o F. C. Porto não se ficaria por aí na tentativa de reforço dos seus quadros. Que tão carecidos estavam.
Em Outubro, contra o Sporting de Braga (derrota por 0-1), estreou-se o argentino Fãndino, oriundo do Porto Alegre e que custara 20 contos ao F. C. Porto. Mas, dois meses depois, abandonava o Porto, partindo para Barcelona.
Em Março de 1949, Júlio Ribeiro de Campos foi eleito presidente do F. C. Porto, mas, desta feita, não chegaria, sequer a tomar posse. Crise interna, mais uma e... em Maio, Miguel Pereira acabaria eleito para o substituir...
O horizonte outra vez carminado de angústia. Araújo, o único jogador do F. C. Porto com lugar mais ou menos cativo na Selecção, que, por isso mesmo, em Lisboa Tavares da Silva considerara, com ironia ácida, ser o Sport Lisboa e... Araújo, foi atacado por misteriosa doença.
Fora um padre, Marcelino da Conceição, quem o descobrira para o futebol, em Paredes, onde trabalhava como funcionário da Câmara Municipal. Quando Portugal venceu pela primeira vez a Espanha, por 4-2, com dois golos seus, Araújo foi recebido, na terra, com bandas de música, foguetes e sessão de boas-vindas, que os heróis tinham de tratar-se assim.
Ensarilhado em problemas, consultado por médicos vários, não entrevia melhoras, antes pelo contrário. Afagava mágoas, dedicando-se à columbofilia. E os portistas suspiravam por ele. Entretanto, o Centro de Medicina traçou-lhe, implacável, o destino: «Para o futebol é caso liquidado.» Sem mais. Por feliz acaso do destino, um médico portuense, José Fernandes, descobriu-lhe a origem da mazela. «A grande lesão que se dizia que tinha nos rins, afinal era na... garganta. Era uma lesão crónica que me fazia engolir continuamente o pus que dela dimanava. E era esse maldito pus que me provocava o sofrimento nos rins, no qual os médicos do Centro de Medicina encontraram o motivo para a minha justa reprovação.»
E o horizonte só não se carregou ainda mais porque o ministro da Guerra decidiu fazer um jeitinho ao F. C. Porto. Virgílio Mendes e Carlos Vieira tinham sido colocados em Elvas e em Tancos para cumprimento de serviço militar.
Os dirigentes portistas desmultiplicaram-se no sentido de transferi-los para um dos regimentos do Porto. Conseguiram-no numa altura em que corriam já rumores de que poderiam ir parar a um quartel de Lisboa por estarem a ser cobiçados por um grande clube da capital...

A fuga de Da Silva e a tinta branca de Boavida

Para agravar ainda mais a situação, em Maio de 1949 o brasileiro Da Silva fugiu para o... Brasil, sem dar cavaco aos dirigentes portistas, tentando, depois, jogar numa equipa brasileira para que pudesse, então, regressar a Espanha como detentor da sua carta. O F. C. Porto apresentou queixa à FIFA e à CBF e Da Silva sentiu o seu futuro em risco. Correu ao Porto pedindo compreensão — e que agradecia que o negociassem para Barcelona. Assim se fez, o F. C. Porto arrecadou 100 contos e numa das cláusulas da transferência combinou-se a disputa de um jogo entre o Barcelona e o F. C. Porto, na Catalunha...
A viagem para a Catalunha forneceria duas notas pitorescas. Ambas envolvendo Diógenes Boavida, que continuava no F. C. Porto como reservista e quase já com o canudo de medicina no bolso. À chegada a Barcelona, quando o funcionário da alfândega perguntava os nomes dos portistas, um a um, o angolano respondeu... Diógenes Boavida. O homem tirou os óculos e comentou: «Nada de piadas, o nome?!»
Diógenes Boavida, repetiu ele, entre gargalhadas de colegas, que não perceberam a ironia fina do homem do guichet...
...E que era, obviamente, muito mais culto, muito mais espirituoso, que o funcionário de uma repartição do Porto encarregado de tratar da documentação para os passaportes de que a comitiva carecia para viajar para Barcelona. Os jogadores foram colocando as impressões digitais nos documentos, mas quando chegou a vez de Diógenes Boavida o funcionário, embaraçado, parou. Indeciso mirou e remirou o assento da tinta negra e... levantou-se. Soube-se, depois, que fora perguntar se para um negro não seria precisa tinta branca, que ele não tinha.
O Barcelona acabaria por vencer o F. C. Porto por 3-1, em partida que serviu para homenagear uma das suas «estrelas» mais refulgentes: Escolá. Os portistas alinharam com Barrigana; Virgílio e Alfredo; Carvalho, Joaquim e Romão; Lino, Fândino, Sanfins, Gastão e Vieira.
No regresso ao Porto, oportunidade ainda para o F. C. Porto defrontar uma selecção de Saragoça (que contou com o ex- -estorilista Bravo), vencendo por 5-2, tendo Augusto marcado quatro golos...
Os bons ventos depressa volveram aziagos. O F. C. Porto não conseguiria ir além do quarto lugar no Campeonato Nacional de 1948/49, sendo eliminado pelo Vitória de Setúbal nos quartos-de-final da Taça de Portugal.
Mas não foi por isso que Scopelli abandonou o clube. Foi contratado pelo Desportivo da Corunha, sendo por isso sem surpresa que, em Agosto, Alberto Augusto, irmão do primeiro internacional do F. C. Porto, Artur Augusto, interior-esquerdo que ficaria famoso por ter marcado o primeio golo de um português ao mítico Zamora, que, após abandonar a carreira, exerceu funções técnicas no F. C. Porto, mas uma enfermidade nos olhos, seguida de doença grave, acabaria por ceifar-lhe a vida prematuramente.
Alberto Augusto jogara ao lado do irmão e de... António Ribeiro dos Reis, nesse primeiro jogo internacional de Portugal e brilhara já como treinador. No F. C. Porto tentaria, sentimentalmente, prosseguir a carreira que o destino não quisera que o irmão Artur seguisse. Alberto Augusto assinou contrato por dois anos e recebeu de imediato o prémio de assinatura, mas não quis usar o direito aos prémios por jogos ganhos ou empatados. Prémios apenas se ganhasse o Campeonato ou a Taça de Portugal...
E foi já com Augusto que o F. C. Porto partiu para uma digressão a Angola, onde somaria 10 vitórias em 10 jogos... Uma viagem que foi preparada com um programa que apontava para disputa de jogos em Luanda, Benguela, Nova Lisboa, Leopoldville (Congo) e Joanesburgo (África de Sul). E que era para ser feita em avião, especialmente fretado à TAP ao preço de... 300 contos, já com 50 por cento de desconto. Era muito dinheiro para um clube em crise de tesouraria. Por isso, foram de barco. No paquete «Império». E só jogaram em Angola. A chegada a Luanda foi apoteótica. Um cortejo com mais de cem automóveis levou a comitiva do cais a Câmara Municipal, onde se ofereceu um «porto de honra». Na equipa estreou-se o caldense José Maria.
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> E foi já com Augusto que o F. C. Porto partiu para uma digressão a Angola, onde somaria 10 vitórias em 10 jogos... Uma viagem que foi preparada com um programa que apontava para disputa de jogos em Luanda, Benguela, Nova Lisboa, Leopoldville (Congo) e Joanesburgo (África de Sul). E que era para ser feita em avião, especialmente fretado à TAP ao preço de... 300 contos, já com 50 por cento de desconto. Era muito dinheiro para um clube em crise de tesouraria. Por isso, foram de barco. No paquete «Império». E só jogaram em Angola. A chegada a Luanda foi apoteótica. Um cortejo com mais de cem automóveis levou a comitiva do cais a Câmara Municipal, onde se ofereceu um «porto de honra». Na equipa estreou-se o caldense José Maria.

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A respeito desta viagem, do FC PORTO, a Luanda, na revista dos «DRAGÕES» de Novembro de 2007, ela é contada ao pormenor. É um relato um pouco extenso, mas vale a pena a ler.
 
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A 1ª viagem do FC Porto a África (1949)

Do Porto a Luanda no paquete Império

(Parte 1)

Se o leitor é um apaixonado pela bibliografia do nosso clube (eu, confesso, sou-o), aconselho a não perder de vista um livro chamado «Caravana da Saudade», uma edição de autor (Delfim Pinto da Costa) publicada em Maio de 1950, com a chancela das edições Maránus.
Não sei se serão muitos ou poucos os livros editados, porque a tiragem não é referida. Tão pouco sei se estas crónicas da viagem (a primeira) que o FC Porto fez, em 1949, a terras de África – porque é disso que o livro trata – teriam preço de capa. Sei que é uma relíquia, um enormíssimo contributo para a história do Futebol Clube do Porto que hoje, passados quase sessenta anos, vale a pena ler. Ler com o sorriso permanente de quem, vivendo a realidade de hoje, recua mais de meio século e se sente confrontado a realidade do «antigamente», alicerçada no mais puro amadorismo.
Hoje uma equipa de top, daquelas a que se convencionou chamar de «alta competição» vai a qualquer parte do mundo num salto de pulga. Há os Fokker, os Airbus, os Boeings, Lockeds ou Tristars, uma frota diversificada de aeronaves, para viagens de qualquer curso, que permitem almoçar tranquilamente no Porto, aproveitar uma escala para comer uma bucha em Lisboa, jantar e dormir no avião, acordar ao nascer do sol sobrevoando a Tailândia ou jantar comodamente em Portugal e tomar o pequeno-almoço no hotel, em Angola, alongando o olhar pela maravilhosa baía de Luanda.
Há sessenta anos tudo era diferente. O futebol era um desporto. Só isso. As chuteiras tinham «travessas», os postes das balizas eram de madeira e as bolas já não sendo de trapos, ainda tinham o chamado «pipo». O ponto H onde, acertando-lhe, tomavam um efeito imprevisível.
É certo que já existiam, também, grandes aviões – os Dakota e os Constelations, mas muitas das viagens de longo curso ainda eram feitas de barco e, por exemplo, para se chegar do Porto a Luanda (que é o nosso caso) demoravam-se, números exactos, 12 dias! Havia escalas na Madeira e S. Tomé. Bordejavam-se as costas da Libéria. Via-se Dakar. Cheirava-se a Serra Leoa.
É de uma viagem assim, de barco – ou, mais pomposamente, de paquete -, do Porto até Luanda, feita pelo FC Porto, no Verão de 1949, que a Caravana da Saudade nos fala.
O autor, Delfim Pinto da Costa (a importância do apelido já vem de longe, embora nenhum grau de parentesco o ligue a Jorge Nuno Pinto da Costa), à altura funcionário superior do clube, integrou-a. Viveu o dia-a-dia. Ouviu palmas e viu lágrimas. Testemunhou os pormenores e os por maiores da vida social que sempre andou de braço dado com a vida desportiva durante os 35 dias passados entre viagens, jogos e eventos sociais. Hoje convidamo-lo(a) a integrar connosco, numa viagem revivalista pelos trilhos da saudade, a caravana histórica que, por águas outrora navegadas, nos vai levar a África.
Tarefa complicada. Sempre são umas 150 folhas a 30 linhas cada página, para compactar em espaço reduzido, o que nos vai obrigar, também a nós, a uma ou duas escalas para reflexão e reordenamento de ideias antes de chegarmos a bom porto, dando a missão por cumprida.
Em frente! Peguemos nas malas e embarquemos nesta aventura evocativa.
11 De Julho
A estação de S. Bento, então sala de visitas do tráfego humano e ferroviário, que, por carris, ligava o Porto a Lisboa foi o ponto de partida. Na altura não circulavam os Intercidades e os Alfas Pendulares. Apenas Foguetes e Rápidos. Foi num destes que a equipa do FC Porto viajou. «Uma viagem sem história», conta-se, a que levou a equipa de S. Bento ao Hotel Suíço Atlântico, à altura o ninho Azul e Branco na capital.
12 De Julho
Um dia de cortesias. Um abraço de amizade ao primeiro grande historiador do Clube (Rodrigues Telles), convalescente na sua casa da Amadora, a apresentação de cumprimentos oficiais ao senhor ministro da Educação Nacional, na pessoa do seu chefe de gabinete, e a indispensável vacinação no Instituto das Doenças Tropicais ocuparam a manhã e a tarde.
À Noite houve «suelto» para a rapaziada, mas não para os directores. Esses, porque as novas tecnologias dos faxes e e-mails eram então uma enorme miragem, andavam de porta em porta, pelas redacções dos jornais «diários» e desportivos, a levar em mão o programa oficial! Não a pé ou de táxi, mas no Buick do amigo Teixeirinha, possivelmente gente do alto, a avaliar pela máquina topo de gama.
Chegados ao hotel, «dois cavalheiros ajoujados ao peso de três taças descomunais estavam à nossa espera», conta Delfim Pinto da Costa. Eram portadores de três das cinco taças encomendadas para os jogos e queriam que viajassem com a bagagem Azul e Branca, de preferência com bilhete de ida e volta.
Missão impossível, a bagagem era mais que muita, roupeiro não havia e, sem técnico de equipamentos, cada qual teria de ser o guardião do templo onde repousavam as suas próprias bagagens.
Remata, assim, o autor: «Os cavalheiros trocaram olhares entre si e, perante a inabalável recusa, lá foram outra vez com as taças que, durante a noite, nos apareceram em agradáveis sonhos».
13 De Julho
O despertar foi cedo e as «formalidades alfandegárias foram rápidas». Ao bater das nove horas já tudo estava dentro do paquete – Império de seu nome – (uma pequena vila flutuante com 900 pessoas a bordo), pronto a ocupar os seus lugares na 3ª Suplementar, única classe com lugares disponíveis quando as negociações com a filial do FC Porto em Luanda ficaram preto no branco.
Ninguém esperava as mordomias de uma classe executiva dos tempos actuais com champanhe e lagosta, aperitivos ou menus opcionais, com assinatura de cozinha de autor mas, também ninguém esperava ficar instalado no meio de duzentos passageiros, onde se misturavam dorminhocos e noctívagos, num cruzar non stop entre aqueles que já se levantavam e os que ainda se deitavam.
Como se não bastasse este pequenino incómodo para uma comitiva de desportistas, que carregava a responsabilidade de representar o clube, a sua cidade e o seu país, outras vozes mais altas se levantavam. Já não a dos foliões cantando ao som da guitarra, mas as da brigada do limpopó que apareciam, pontualmente, ás cinco da manhã «de vassoura em punho para fazer limpezas». A partir do romper do dia nada a fazer – quem dormiu...dormiu, quem não dormiu…dormisse!
Do mal, o menos - «os leitos eram limpos e decentes» e, se o toque do recolher apontava obrigatoriamente na direcção da 3ª suplementar, a partir do toque de alvorada havia livre-trânsito para passear por todo o paquete e tomar as «refeições» na «luxuosa sala de 2ª». Zonas de outras nobrezas, como o deck de 1ª, eram palco de festivais nocturnos durante os quais «os criados serviam aperitivos á descrição». E como se tudo isto ainda não bastasse, «alguns elementos da Caravana arranjavam refeições “suplementares”». «A horas mortas iam confraternizar com os maquinistas nos seus ágapes monumentais». Assim mesmo, sem acrescentar uma vírgula ou tirar um ponto final ao que o diário de bordo nos relata.
14 De Julho
Três horas da tarde. Terra à vista. Com mais rigor, Porto Santo em ponto de mira. «A cascata colorida da ilha da Madeira» aproximava-se. Ancorado ao largo o Império e dada ordem de desembarque pela Polícia Marítima, começou o vaivém das «lanchas na faina de levar e trazer gente». No seu interior estavam os dirigentes do União e do Marítimo para os cumprimentos de boas vindas e tentar um jogo no regresso da equipa.
Findo o desembarque e em carros cedidos pela direcção do Marítimo, os elementos da comitiva assistiram (fortemente ovacionados) à 2ª parte do Marítimo-Benfica, visitaram a sede do clube anfitrião e confraternizaram com os directores madeirenses num jantar servido no restaurante Apolo. Ao bater da meia-noite, todos regressaram ao paquete.
15 De Julho
Estava na altura de tratar do físico, sem tirar as pernas do descanso e começar «de manhã cedo com as sessões de ginástica. O ponto mais alto de bordo, junto à chaminé», foi o local eleito.
O treinador, «mestre Alberto Augusto encafuado nas suas calças brancas dá ordem aos rapazes e estes, virados ao sol, vão fazendo os seus movimentos rítmicos. No fim da ginástica, um banho de chuveiro retempera os músculos e abre o apetite para a refeição das oito da manhã». Não consta a ementa dos pequenos-almoços a não ser que incluía umas carnes frias e que «davam o melhor dos alentos para a fatigante vida a bordo».
Consta, isso sim, porque está escrito que o «lanche das 16 horas era espectáculo inolvidável». Aos «saborosos pastéis saídos naquele momento das mãos do cozinheiro mágico de bordo ainda se podia torcer o nariz, mas o delicioso chá gelado e os coloridos sorvetes constituíam uma tentação demasiado forte para ser desprezada». Entre come e bebes ainda sobrou tempo para avistar as Berlengas, «montanhas rochosas sem qualquer vestígio de vegetação» e ver, pela primeira vez, «os peixes voadores. Saem quase debaixo da quilha do barco e fogem sobre as ondas em voo planado».
16 De Julho
Página em branco na conta corrente da viagem. Como diz Delfim Pinto da Costa, »viajar é, realmente, um prazer dos Deuses!».
17 De Julho
A viagem dá para tudo – ver, de perto, a baía de Dakar, procurar «as belezas mais acessíveis de bordo» e perspectivar flirts, embora «quase todas as belezas do navio usem calças à homem», o que não desmotiva a Caravana porque «o hábito não faz o monge». Dá ainda para jogar a prova dos balões (medalha de ouro para Sanfins), ver o Joaquim «imitar um bailarino negro na fascinação do batuque» e para espreguiçar «nas lonas que servem de cobertura ao porão, cantando e misturando modas brasileiras com nostálgicas canções folclore».
18 De Julho
Outra branca no deve-haver de cada dia. Como nada se passou de relevante – calculamos nós – aproveitamos para dar a resposta a uma pergunta que o leitor estará farto de fazer. Mas, afinal, quem constituía essa Caravana da Saudade?
Aqui fica a informação. Directores: Carlos Nunes (o director «adido aos atletas»), Dr. Cesário Bonito (médico dedicado e orador brilhante, convidado como porta voz oficial do Clube) e Delfim Pinto da Costa (director geral da Caravana). Convidado de Honra: João de Almeida Campos, representante do Governo Civil do Porto, um diplomata que «se transfigurou ao entrar no Império e passou a ser um despreocupado e admirável vivant». Treinador: Alberto Augusto (iniciou funções nesta viagem). Massagista: Francisco Gonçalves (o popular Xico Gonçalves, que dada, na altura, a escassez mão-de-obra na sua especialidade, recebeu interessante proposta para ficar em África). Atletas: Alfredo Pais, Romão, Virgílio, Carvalho, Araújo, Diógenes Boavida, Pinto Vieira, Francisco Costa (Chico), Gastão, Joaquim Machado, Fragata, José Lino Moreira (Lino), José Maria, Freitas, Sanfins e os guarda-redes Valongo e Graça.
19 De Julho
A quatro dias da chegada a Luanda, o Império navegou à vista da costa da Libéria depois de ter sido «sacudido pelo temporal que sempre faz no Oceano quando se atinge a proximidade da Serra Leoa». Não consta que alguém da Caravana tivesse enjoado, apesar de durante o dia ter havido festa rija - «a Teresinha fez 18 anos!». «Uma figura de porcelana com os mais lindos do Império» - sublinha a narrativa. «Um sorriso amável».
Graças a esse sorriso, a «Caravana resolveu presentear a aniversariante com uma caixa de bombons e o distintivo dourado do Clube». O Dr. Cesário Bonito ofereceu as prendas, discursou em nome de todos e todos esperaram a chegada do bolo de aniversário para os «Parabéns a Você» em conjunto. Num passe de mágica o bolo – oferta do Império – virou pudim (!!!) e chegou «com 18 velinhas a brilhar». A Teresinha balbuciou um «obrigado», repartiu o pudim com a rapaziada e ofereceu ela mesmo o champanhe para o brinde.
Natural do Lobito, a Teresinha regressava a África depois de umas curtas férias em Albergaria e, se hoje ainda for viva, terá muito perto dos oitenta anos. Talvez tenha ficado portista, guarde o distintivo doirado do Clube e se lembre da efeméride. Até porque, entre a euforia e o drama, a fronteira é, por vezes, um simples rodopiar dos ponteiros do relógio.
Não houve mais festas nem música. Não houve mais sorrisos. Apenas lágrimas. «Nem se viu mais o sorriso alegre da Teresinha que tanta luz dava à Caravana». Pelas quatro horas da tarde falecia o seu pai. «Doente há dias, na enfermaria de bordo, só os médicos conheciam a gravidade do mal». Vivera durante anos (vinte) em África e era, então, altura de regressar para ver, pela primeira vez, o neto que o filho «desejava mostrar-lhe à chegada». Temeu-se que o corpo tivesse de ir para o mar, sem cerimónias religiosas, já que a bordo não havia qualquer sacerdote. Por sorte, a «ilha de S. Tomé estava próxima e foi conseguida permissão para descer ali o cadáver».
21 De Julho
Pensar em chegar a Luanda, sair do Império, almoçar, descansar e, de imediato, defrontar o Futebol Clube de Luanda – a nossa filial -, era coisa de por os cabelos em pé.
Uma hipótese não desejada, mas com o carimbo de quase certeza. Isso mesmo transmitiu o comandante do paquete à Caravana. Telegramas para Luanda pedindo o adiamento do jogo por 24 horas, telegramas para o Império mostrando a impossibilidade desse adiamento e o nó para desatar. A paragem em S. Tomé
Era ouro sobre azul, solicitando-se um campo que permitisse a função. Tentaram as autoridades locais, como moeda de troca, que o treino fosse conjunto com um combinado local. Impossível, disse o FC Porto – o que se pretendia era mesmo um treino em família.
22 De Julho
A chegada a S. Tomé aconteceu pela madrugada. De lancha rumou-se para terra. O pouco tempo disponível não permitiu folga, quer para directores, quer para atletas. Os directores fizeram questão de acompanhar o pai da Teresinha à sua última morada - «o cemitério local, situado numa encosta da ilha, entre luxuriante vegetação».
O staff técnico foi para o campo de jogos. Tinha as portas abertas, as redes postas, o piso marcado, mas não havia viva alma a receber a equipa. Ao jeito de self-service cada qual amanhou-se o melhor que pôde e o treino cumpriu-se. Do que se passou, não ficou registo para memória futura. Os únicos registos que há são os de regresso a bordo, com «as lanchas a dançar sobre a calema, batidas pelas ondas», e a fobia que o Francisco Costa, o Chico, tinha aos tubarões que afinal… «primaram pela ausência». Apenas foi avistado um «em terra, mas esquartejado e disputado pelos negros, que também comem essa carne escura e repelente».
23 De Julho
Finalmente Luanda à vista. Um dia mais e vão começar «as inevitáveis dores de cabeça do sentido imperfeito das consequências que nos aguardam». Um misto de entusiasmo e nervosismo apoderou-se da Caravana. Na 3ª suplementar, nessa noite, ninguém pregou olho, aguardando que o Império atracasse «suavemente no moderno cais da cidade».
24 De Julho
Já acordada há muito, a cidade recebeu o Império às oito da manhã. «Em volta do barco giravam vedetas “out-rigers” dos clubes náuticos e muitos “dongos”, barcos feitos de troncos de árvores, com indígenas, agitando bandeirinhas de papel azuis e brancas, aos berros ao Porto. No cais havia um mar de gente. A bordo entrou «a comissão de recepção e os directores da nossa filial. Todos se abraçaram sem nunca se terem visto». «O desembarque foi feito no meio de palmas, vivas e cumprimentos sem fim» e foi a passo de caracol que se alcançaram os automóveis que esperavam a caravana. Foi tempo para um longo cortejo de viaturas. Entupiu-se a marginal de Luanda, passou-se pelo estádio e parou-se na Câmara para a inevitável recepção oficial. Saudou-se o «Porto-cidade» e o «Porto-Clube». Lamentou-se o DR. Cesário Bonito, no seu improviso, de não ter «braços bem grandes para abraçar tanta Luanda».
E sempre por entre alas de povo, alcançou-se finalmente o hotel, melhor dizendo os hotéis, já que a Caravana não ficou junta. Uma parte ficou no edifício central do Avenida Hotel. Outra instalou-se no Pena, um edifício grande da Avenida Salvador Correia, em frente ao café Portugália, bem no coração da cidade. Era chegada a hora do descanso, porque dentro de momentos seguia-se o jogo no campo dos Coqueiros.
«Stop» para a Caravana da Saudade e «stop» para nós também. A viagem através destas memórias prosseguirá no próximo numero. Afinal, só agorachegámos a Luanda. Vai saber bem pernoitar, finalmente, em terra firme «longe do pesadelo da 3ª suplementar». Uma coisa podemos, desde já prometer – o regresso será em 2ª classe.
Revista dos «Dragões» Nov./2007
 
H

hast

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A caderneta do padre Marcelino
Para angariar fundos para a construção do Estádio das Antas, o padre Marcelino lançou um campeonato em que os golos se mediam em escudos

Em Junho de 1949 o F. C. Porto tinha já na sua posse 48 mil metros quadrados de terreno, nas Antas. Mas o projecto do futuro estádio previa a necessidade de 63.220. Era, pois, preciso comprar os 15.220 metros quadrados em falta — ou esperar que o Estado expropriasse essa parcela.
O padre Marcelino da Conceição, portista indefectível que levara Araújo para a Constituição, escreveu no jornal «O Porto» uma carta apelando à necessidade de construção imediata do estádio e propondo uma campanha junto dos sócios e simpatizantes de todo o Mundo para angariar fundos. Deu a ideia: a criação de um campeonato que ajudasse a recolher 10 milhões de escudos e aventando que cada escudo valeria um... golo.
A Direcção do F. C. Porto colocaria os golos num Montepio Geral e só poderia levantar esse dinheiro para construção do campo. «Haverá marcador de muitos e de pouco, pouco importa. Um petiz marca o seu golo e lá virá o seu nome. No fim, a Direcção encadernará as folhas em livro e isso ficará como o melhor monumento proclamador de que o Porto é o Porto.»
O próprio jornal «O Porto» decidiu marcar os primeiros... 500 golos. Hermenegildo Costa, 250, Leite Maia, 150, padre Marcelino, Miguel Pereira, Albano Araújo, Gomes Sousa, António Meneses, Sousa Pereira, Hermínio Caiano e Armando Tavares, com 100 golos cada, foram os marcadores seguintes. Engrossar-se-ia, depois, o rol de gente famosa, do desporto, do espectáculo, da política.
A campanha correu bem. Como correra outra que acabara por se saldar em proeza digna de «Guinness»: os adeptos portistas colocaram na sua sala de troféus o maior do Mundo...
Um ano antes o F. C. Porto destroçara o Arsenal, então considerada a melhor equipa mundial. Feito que não poderia, pois, ficar marcado, nos anais, por meros caracteres. Era preciso prata que o perpetuasse.
Assim, um grupo de adeptos do F. C. Porto atirou-se à ideia de subscrição pública para compra de um troféu condigno. Fez-se a Taça do Arsenal, constituída por duas peças monumentais. Uma, o relicário, pesando 120 quilos, rematado com um grupo escultório constituído por uma figura de atleta, de joelho em terra, dominando um leão, que tem uma bola junto dele. Na mão esquerda segura a bandeira do F. C. Porto. O relicário tem 2,80 metros de altura e é uma espécie de caixa assente em quatro dragões de prata, com quatro portas de cristal. Dentro dele o troféu, construído totalmente em prata e constituído por três figuras esculturais de mulher, erguendo-se nas pontas dos pés, segurando a taça, circundada por três dragões dominados por três atletas que procuram alcançá-la para beberem dela o vinho da vitória.
Na sua construção gastaram-se 130 quilos de prata e todo o conjunto, pesando mais de 250 quilos, custou, em 1949, 200 contos! Mas, mais que o dinheiro, valia a prata que perpetuava a façanha do histórico dia 7 de Maio de 1948, em que, deslumbrando o Lima, o F. C. Porto bateu o Arsenal por 3-2, com golos de Araújo e Correia Dias (2). «Meia hora de futebol diabólico destroçou a equipa londrina» — escreveu-se em «A Bola». De facto, aos 30 minutos os portistas já venciam por 3-0. Depois foi só resistir. Com alma até Almeida. Na reedição da lenda de David e Golias...
Em 28 de Novembro de 1949 Alberto Augusto foi substituído por Carlos Nunes, vítima de uma derrota humilhante no Estádio Padinha, frente ao Olhanense: 1-6!!!
E, oito dias depois, o ministro das Obras Públicas de Salazar, Frederico Ulrich, que, nos seus tempos de juventude, ao serviço do CIF, fora campeão nacional de barreiras, entregou os terrenos das Antas ao F. C. Porto. E, no dia seguinte, a 5 de Dezembro de 1949, ajudou a lançar a primeira pedra do campo de jogos do F. C. Porto, que por essa altura parecia, outra vez, em queda livre, perdendo, na última jornada do ano, com o Sporting de Braga, por... 0-6.
Antes do Ano Novo, vitória sobre o Desportivo da Corunha, por 3-1, no Lima, uma vitória que empolgou porque, na semana anterior, os galegos tinham batido o Sporting por... 5-1, alinhando com Barrigana; Francisco e Alfredo; Carvalho, Gastão e Romão; Sanfins, José Maria, Vital, Monteiro da Costa e Vieira.
Na primeira ronda de 1950, nova derrota. Na Constituição. Contra o Benfica. 0-1. A partida pejou-se de incidentes. Aos 65 minutos Virgílio, já «Leão de Génova», que meses antes recusara negociar propostas do Real Madrid e do Barcelona, foi duramente tocado por Rogério e teve de abandonar o terreno, regressando, depois, a coxear, para mero ofício de corpo presente. O benfiquista foi atingido com apupos e... almofadas. Pouco depois, Barrigana defendeu um remate de Julinho e, já de posse da bola, deu um pontapé em Rosário. O árbitro, Reis Santos, expulsou-o e assinalou grande penalidade. Para a baliza foi o extremo-esquerdo Vieira, que, com orgulho, defendeu o penalty apontado por Rogério e tudo o mais. Heroicamente.
Augusto Silva foi, entretanto, convidado para treinador do F. C. Porto, deixando o cargo de seleccionador nacional, sendo substituído por Ted Smith, treinador do Benfica. Recebeu o F. C. Porto em 9.º lugar, com os mesmos pontos que o 11.º primeiro, num Campeonato de 14.
Sentiram-se ligeiras melhorias. Nuvens negras outra vez acasteladas com a derrota em Vila Real de Santo António, com o Lusitano, por 1-3, num jogo que teve como principal figura um ex-leixonense que lá chegara, quase anonimamente, para fazer a tropa, José Maria Pedroto de seu nome.

O Benfica a 19 pontos e o nono a... um!!!

Derrotado, a 20 de Fevereiro, pelo Sporting, no Lumiar, por 1-4, o F. C. Porto desceu ao 8.º lugar do «Nacional» da I Divisão. Barrigana, que durante toda a primeira parte defendera até o... indefensável, acabou por sofrer um «frango monumental», num pontapé quase de meio campo de Albano. Desolado, largou em berro: «Senhora da Hora! Como é que foi aquilo?!» O sportinguista, babado de gozo, não perdeu a oportunidade de despejar a bílis com toda a mansidão do cínico encartado e, abeirando-se do guarda-redes ainda impávido, atirou: «Como foi?!... Foram as tenazes do Barrigana que não suportaram a brasa do Albano...» E, apesar de amargos desaires na Covilhã (2-4) e na Tapadinha (1-4), o F. C. Porto acabaria por selar o Campeo-nato Nacional de 1949/50 em quinto lugar, com 26 pontos, aproveitando-se da fase final titubeante do Sporting da Covilhã (25), da Académica, do Olhanense e do Sporting de Braga, todos com 25 pontos. Não fora isso... O Benfica somou 45 pontos ao longo das 26 jornadas da prova, o Sporting foi segundo, com 39, o Atlético terceiro, com 30, o Belenenses quarto, com 27. Pouco depois, com Carmona e Salazar na tribuna de honra, inaugurou-se, em Braga, o Estádio 28 de Maio, com a disputa de dois emotivos jogos: F. C. Porto, 3-Braga, 3; e Benfica, 3-Sporting, 2. Os portistas estiveram lá, como «lídimos representantes do desporto do Norte». Pois. Mas o fulgor continuava arredio, apesar de, ainda antes do fecho da temporada, o F. C. Porto ter imposto a primeira derrota aos brasileiros do Santos, então em digressão por Portugal, graças a um golo de Vieira...
Começa, pois, a cristalizar a ideia de que a equipa de futebol do F. C. Porto era óptima no intervalo dos campeonatos. E o orgulho da Taça Arsenal provava isso. Só que os portistas queriam mais, mesmo sabendo que os árbitros continuavam a ser os seus «anjos negros».
in«abola»
 
H

hast

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130 quilos de prata no orgulho Portista.

O F.C.Porto não era ainda o clube dos insaciáveis dragões das línguas de fogo. As frustrações sucediam-se, cristalizado estava o complexo de inferioridade e a presunção cada vez mais dolorosa de que, em Lisboa, por ardis vários, se teciam manobras para o desfavorecer e apequenar. De queixas dos árbitros se fazia quase só o rosário das suas lamentações. Mas, ano a ano, renascia a esperança de...

No arranque para a época de 1948/49, o F. C. Porto contratou Scopelli, entretanto despedido do Belenenses, na ilusão de que pudesse ser ele o feitiçeiro por que se esperava, sebastianicamente, havia muito. Mas não. De ventos aziagos se fez a época, outra vez. Primeiro contratempo: misteriosa doença atacou Araújo, o único jogador do F. C. Porto com lugar mais ou menos cativo na Selecção Nacional, que, por isso mesmo, com ácida ironia se chegava a chamar Sport Lisboa e... Araújo.

Fora um padre, Marcelino da Conceição, quem o descobrira para o futebol, em Paredes, onde trabalhava como funcionário da Câmara Municipal. Quando Portugal venceu, pela primeira vez no seu historial, a Espanha, foi recebido, na terra, com bandas de música, foguetes e sessão oficial de boas vindas, que os heróis tinham de tratar-se assim. Pouco antes de a doença o atacar, fora contactado por dirigentes do Celta de Vigo e do Arsenal de Londres. De Inglaterra, recebera «proposta milionária, como nunca se vira em Portugal». Mas...

Ensarilhado em problemas, consultado por médicos vários, não entrevia melhoras, antes pelo contrário. Afagava mágoas, dedicando-se à columbofilia. E os portistas suspiravam por ele. Entretanto, o Centro de Medicina traçou-lhe, implacável, o destino: «Para o futebol, é caso liquidado.» Sem mais. Por um feliz acaso do destino, um médico portuense, José Fernandes, descobriu-lhe a origem da mazela. «A grande lesão que eu tinha nos rins, não era nos rins, era na garganta. Era uma lesão crónica que me fazia engolir continuamente o pus que dela dimanava. E era esse maldito pus que me provocava o sofrimento nos rins, no qual os médicos do Centro de Medicina encontraram o motivo para a minha justa reprovação».

E, assim, pouco depois, Araújo voltava ao futebol. Precisamente numa altura em que o F. C. Porto continuava implacavelmente submetido à triste sina de discreto comparsa à mesa dos grandes triunfadores da bola: Sporting, Benfica e Belenenses — mesmo com Scopelli. De baixa estava, também, Barrigana, que partira um pé num jogo particular, entre as selecções do Porto e de Coimbra, acreditava ele, por não ter jogado com a camisola verde que era o seu talismã. Recusara-se mesmo a ir para a baliza, mas perante os risos de mofa dos directores, lá se dispôs, defendendo-a com a camisola que Mota, do Boavista, lhe emprestara. Pediu várias vezes para ser substituído. Em vão. De súbito, um choque com Bentes, a perna partida. Alguns meses antes o academista passara pelo mesmo suplício, mas por ter caído das escadas de sua casa...

Portanto, naquele ano, para além de um «vitória meio histórica» sobre os super-violinos do Sporting, mas tomada à conta de algum misticismo, o único momento de fervente orgulho dos portista registou-se no dia em que se colocou na sua sede o «maior troféu do Mundo». Um ano antes, o F. C. Porto destroçara, através de meia hora de futebol diabólico, o Arsenal de Londres, então considerada a melhor equipa do Mundo. Feito que não poderia, pois, ficar marcado, nos anais, por meros caracteres. Era preciso prata que o perpetuasse. Assim, um grupo de adeptos do F. C. Porto atirou-se à ideia de subscrição pública para compra de um troféu condigno. Assim se fez a Taça do Arsenal, constituída por duas peças monumentais. Uma, o relicário, pesando 120 quilos, rematado com um grupo escultório constituído por uma figura de atleta, de joelho em terra, dominando um leão, que tem uma bola junto dele. Na mão direita, o atleta ergue um facho, no espaço. Na mão esquerda segura a bandeira do F. C. Porto. Por detrás dele, dominando toda a peça, a figura da vitória.

O relicário tem 2,80 metros de altura e é uma espécie de caixa assente em quatro dragões de prata, com quatro portas de cristal. Dentro dele (troféu), construído totalmente em prata e constituído por três figuras esculturais de mulher, erguendo-se nas pontas dos pés, segurando a taça, circundada por três dragões dominados por três atletas que procuram alcançá-la para beberem dela o vinho da vitória. Na sua construção gastaram-se 130 quilos de prata e, todo o conjunto, pesando mais de 250 quilos, custou, em 1949, 200 contos!
in«abola»
 
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hast

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> \"...no dia em que se colocou na sua sede o «maior troféu do Mundo». Um ano antes, o F. C. Porto destroçara, através de meia hora de futebol diabólico, o Arsenal de Londres, então considerada a melhor equipa do Mundo. Feito que não poderia, pois, ficar marcado, nos anais, por meros caracteres. Era preciso prata que o perpetuasse. Assim, um grupo de adeptos do F. C. Porto atirou-se à ideia de subscrição pública para compra de um troféu condigno. Assim se fez a Taça do Arsenal, constituída por duas peças monumentais. Uma, o relicário, pesando 120 quilos, rematado com um grupo escultório constituído por uma figura de atleta, de joelho em terra, dominando um leão, que tem uma bola junto dele. Na mão direita, o atleta ergue um facho, no espaço. Na mão esquerda segura a bandeira do F. C. Porto. Por detrás dele, dominando toda a peça, a figura da vitória.

O relicário tem 2,80 metros de altura e é uma espécie de caixa assente em quatro dragões de prata, com quatro portas de cristal. Dentro dele (troféu), construído totalmente em prata e constituído por três figuras esculturais de mulher, erguendo-se nas pontas dos pés, segurando a taça, circundada por três dragões dominados por três atletas que procuram alcançá-la para beberem dela o vinho da vitória. Na sua construção gastaram-se 130 quilos de prata e, todo o conjunto, pesando mais de 250 quilos, custou, em 1949, 200 contos!

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Já tive o prazer de admirar, de bem perto, este «monstro». Quem estiver à espera de vêr uma grande taça ou coisa parecida que se desiluda, isto não é um troféu. É algo que parece saído de um conto de fadas, megalómano, espectacular e grandioso.

Por onde é que andará?
 

fcporto56

Tribuna Presidencial
26 Julho 2006
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Sacramento
> hast Comentou:

> > \"...no dia em que se colocou na sua sede o «maior troféu do Mundo». Um ano antes, o F. C. Porto destroçara, através de meia hora de futebol diabólico, o Arsenal de Londres, então considerada a melhor equipa do Mundo. Feito que não poderia, pois, ficar marcado, nos anais, por meros caracteres. Era preciso prata que o perpetuasse. Assim, um grupo de adeptos do F. C. Porto atirou-se à ideia de subscrição pública para compra de um troféu condigno. Assim se fez a Taça do Arsenal, constituída por duas peças monumentais. Uma, o relicário, pesando 120 quilos, rematado com um grupo escultório constituído por uma figura de atleta, de joelho em terra, dominando um leão, que tem uma bola junto dele. Na mão direita, o atleta ergue um facho, no espaço. Na mão esquerda segura a bandeira do F. C. Porto. Por detrás dele, dominando toda a peça, a figura da vitória.

O relicário tem 2,80 metros de altura e é uma espécie de caixa assente em quatro dragões de prata, com quatro portas de cristal. Dentro dele (troféu), construído totalmente em prata e constituído por três figuras esculturais de mulher, erguendo-se nas pontas dos pés, segurando a taça, circundada por três dragões dominados por três atletas que procuram alcançá-la para beberem dela o vinho da vitória. Na sua construção gastaram-se 130 quilos de prata e, todo o conjunto, pesando mais de 250 quilos, custou, em 1949, 200 contos!

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Já tive o prazer de admirar, de bem perto, este «monstro». Quem estiver à espera de vêr uma grande taça ou coisa parecida que se desiluda, isto não é um troféu. É algo que parece saído de um conto de fadas, megalómano, espectacular e grandioso.

Por onde é que andará?

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Deve de estar no museu:)
 
H

hast

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A consolação e a farsa...

Com uma dívida de 700 contos, as bancadas a ruir, apenas a consolação de o F. C. Porto ganhar ao Benfica, em Lisboa, que era coisa que não acontecia havia 14 anos

A hipocrisia do falso amadorismo não se sopeara ainda. O futebol nacional, no arrebol dos anos 50, era ainda uma farsa, que Cândido de Oliveira resumira assim: «Os futebolistas portugueses são amadores que recebem salário e descontam dois por cento para o fundo de desemprego.» Nunca se cansou de denunciar esse tartufismo e, um dia, em artigo ponteado de ironia, publicou em «A Bola» as artes e os ofícios de alguns dos mais afamados jogadores de então. O F. C. Porto tinha nas suas fileiras três comerciantes (Virgílio, Carvalho e Joaquim), dois corticeiros (Barrigana e Osvaldo Cambalacho), um torneiro de metais (Teixeira), um funcionário municipal (Monteiro da Costa). No Sporting, despontavam dois industriais (Vasques e Travassos), por acaso (ou talvez não) sócios da mesma empresa de frigoríficos na qual investiram 600 contos, financiados pelo clube para melhor os segurar, um maquinista (Martins), um operário fabril (Rola), um funcionário público (Veríssimo), dois estudantes (Barros e Mendonça) e quatro empregados de comércio (Carlos Gomes, Caldeira, Pacheco e Passos). O Benfica possuía um leque ainda mais alargado de profissões: Bastos era serralheiro, Moreira metalocravador, Corona corticeiro, Arsénio torneiro-mecânico, Caiado desenhador, Félix industrial, Rogério comerciante de automóveis, Fernandes empregado de escritório e José Águas... estudante.
No Belenenses, Serafim exercia (ou disfarçava que...) a profissão de serralheiro-mecânico, Sério a de funcionário corporativo, Castelo a de funcionário administrativo, Matateu a de empregado de escritório, Feliciano a de comerciante. As profissões de todos, obviamente, se o eram, não o eram de facto em full-time.

Dia de obras pago por Bacelar

Por essa altura, o F. C. Porto possuía 8057 sócios, mais 1400 no que no ano anterior. As dívidas ascendiam a 700 contos. Era preocupante, mas...
Se a crise não alanceava os seus dirigentes era porque todos eles sabiam que poderiam contar com o coração imenso e a bolsa maior de alguns dos seus mais ilustres pares. Por isso, foi sem surpresa que José Bacelar, então sócio n.º 1 do F. C. Porto, se ofereceu a pagar os salários de todos os trabalhadores em função no primeiro dia de obras para a construção do Estádio das Antas.

Quando a palavra não basta e muitas cabeças rolam

Com a eleição de Júlio Ribeiro para a presidência do F. C. Porto, em Março de 1950, Augusto Silva, que aceitara o encargo de treinar o clube sem sequer assinar um documento, deixando, inclusivamente, o honroso cargo de seleccionador nacional, para se dedicar de alma e coração ao projecto de relançamento do F. C. Porto, foi estranhamente afastado do comando técnico do clube, por não ter caído (ninguém imaginava bem porquê e sem que nunca mais se soubesse por que artes ou por que tramas) nas boas graças do presidente, sendo substituído, em Abril, por Francisco Reboredo. Não foi muito feliz o argentino. Sem surpresa, o alemão Vogel assumiu, no dia 8 de Outubro de 1950, o cargo de treinador do F. C. Porto, numa altura em que, com quatro jornadas disputadas no Campeonato Nacional de 1950/51, o Sporting somava quatro vitórias. Glória no dilúculo: o F. C. Porto bateu o Benfica, na Constituição, por 5-2. Estrondeou a euforia nas bancadas e como herói renascido saiu do campo Araújo, que fora apenas autorizado a jogar sob vigilância médica, uma vez que ainda se suspeitava padecer de uma nefrotapia crónica. Na partida nada se notou, antes pelo contrário.
A façanha dava pábulo aos sonhos portistas. Mas, oito dias depois, em Alvalade, derrota, por 1-2, ficando apenas a afuzilar uma luzinha ao fundo do túnel. O desafio ficou marcada por lamentáveis incidentes: Mário Wilson, que logo na primeira parte tivera entrada dura ao estômago de Pinto Vieira, lançando-o três minutos para fora de campo a fim de receber assistência, envolveu-se, depois, quezilento, com Carvalho, acabando por ser agredido pelo portista que pontapeara antes, sendo ambos expulsos.
Ainda antes de Novembro, ao empatar em Braga a um golo, o F. C. Porto permitiu que o Sporting aumentasse para quatro pontos a sua vantagem. Seis pontos seria o avanço dos «leões» à entrada para 1951. Logo... a cabeça de Vogel rolara já. Em Dezembro, o húngaro Gencsi Deseo assinara contrato de treinador de uma equipa que parecia vogar num mar de indefinições. Janeiro entrevia-se mês terrível para os portistas. Mas... A 14, o F. C. Porto bateu o Benfica, no Campo Grande, por 2-0, com dois golos de Monteiro da Costa. Gencsi considerou o desfecho histórico. Mas mais exultou Barrigana, como se nesse comenos tivesse voado à glória como nunca antes: «Tenho tido muitas alegrias, porém como a de hoje, nenhuma. Faltava-me ganhar ao Benfica na sua própria casa.» Ted Smith, treinador benfiquista, resignado, disse apenas que ganhara a melhor equipa, «sobretudo a que tivera melhor estofo».

As esperanças e as bancadas duas vezes em ruína

Aos portistas rasgaram-se horizontes de onde bafejaram outra vez auras de esperança. O F. C. Porto ao sopear o Sporting (3-0), na décima oitava jornada do Campeonato, reduziu para três pontos a desvantagem em relação à equipa de Galloway e Álvaro Cardoso. O jogo disputou-se no velhíssimo e acanhado Campo da Constituição e só por protecção divina não se transformou em tragédia. Ainda antes de a partida se iniciar, a vedação do campo rebentou sob o impulso da mole de gente, um garoto caiu, precipitando-se sem nunca largar a sua bandeira do F. C. Porto. Ficou sob a avalancha, acabando, milagrosamente, por sofrer apenas pequenas escoriações. Ao menino e ao borracho...
Pouco depois, outra vedação do alquebrado campo não resistiu à pressão e tombou. Mais quedas, mais escoriações, mas nada de muito grave. E como a vitória portista amansou todas as dores...

Ilusões desfeitas e escaramuças na Tapadinha

Mas, como as bancadas de madeira puída, as ilusões portistas esbarrondaram--se, uma semana volvida, na Tapadinha, derrotadas, sem apelo, pelo Atlético (1-4). Escaramuças várias se registaram dentro e fora do terreno, resultado ainda da guerra aberta pela fuga de Vital, ídolo alcantarense e grande esperança do futebol nacional, para o Porto, a troco de promessa de um ordenado mensal de cinco contos. O portista Carvalho queixou-se de Ben David: «O avançado do Atlético atirou-se sobre mim e com o piton deixou-me o pés neste estado.» Mostrou um autêntico trambolho. Alfredo bradava contra o árbitro. Gencsi, afamado também pelos seus méritos de... xadrezista, deitou água na fervura: «É preciso calma, é preciso saber perder.» O «capitão» portista ripostou: «Queira perdoar, mister, mas para aceitar esta derrota é necessário mais do que isso, é preciso possuir um espírito forte para lutar sob a coacção de um árbitro que nos prejudicou imenso.»
O alcantarense Martinho rejubilou. Pela vitória e por ter ganho um relógio de ouro, prémio prometido ao marcador do primeiro golo do desafio.
Recrudesceu a angústia entre os portistas. Derrota em Coimbra, derrota no Estoril... Tropeções que permitiram que o Sporting terminasse o Campeonato com 45 pontos em 52 possíveis, mais 11 que o F. C. Porto, mais 15 que o Benfica e o Atlético, que perdeu o terceiro lugar nos últimos 20 minutos do Campeonato, consentindo empate com o Boavista
As receitas brutas de bilheteira ascenderam a 8148 contos, o F. C. Porto ficou apenas com 538 contos, muito menos que o Sporting (847 contos) e o Benfica (738 contos).
E, na Taça de Portugal, outra vez amargura, mais amargura. Nos oitavos-de-final, a emoção de uma vitória do F. C. Porto sobre o Olhanense por... 11-0. Mas, nas meias-finais, a eliminação ante o Belenenses, que depois de ter vencido, nas Salésias, por 2-0, resistiu estoicamente no Porto. Para desgraça de Gencsi, que em Junho foi dispensado das suas funções de treinador.

Outra vez a honra salva pelas... mãos

Nesse comenos, o F. C. Porto, batendo o Sporting por 3-1, venceu, mais uma vez, o Campeonato Nacional de Andebol de 11. E pouco antes de, a 26 de Junho de 1951, ter sido lançada a semente da relva do Estádio das Antas, anunciara-se que o argentino Vaschetto era, novamente, treinador do F. C. Porto.
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hast

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O presunto que traiu Barrigana
À entrada para 1952, o F. C. Porto liderava com algum descanso o Campeonato. Mas sem dizer água vai, o seu treinador fugiu para o México e foi a desgraça

O Campeonato Nacional da I Divisão de 1951/52 ainda mal saíra do adro. Emoções quentes se viveram no Campo da Constituição, onde sportinguistas e portistas empataram a duas bolas. Aos 11 minutos de jogo o F. C. Porto vencia já por 2-0, com golos de José Maria. Goleada à vista. À beira do intervalo o Sporting reduziu. A 30 segundos do final, o empate. Em jeito de drama. Remates uns a seguir aos outros, corações arfando de medo, a bola a esgueirar-se, o temor de tudo se esboroar, mais remates, mais defesas de Barrigana e, de súbito, um toque de Jesus Correia, a bola a resvalar pelo corpo de Virgílio, a trair o guarda-redes e a anichar-se, caprichosamente, no fundo das redes. As bancadas, regorgitando de portistas, emudeceram. Os espectadores voltaram a arrojar o perigo de morte ante as ameaças de queda das bancadas. Por isso, em Novembro, a Direcção do F. C. Porto resolveu fazer novo contrato com o Académico do Porto para utilização do seu Estádio do Lima, enquanto não se inaugurasse o Estádio das Antas, predispondo-se a pagar como aluguer cinco por cento das receitas líquidas de todos os jogos.
Entretanto, o Benfica cedeu o primeiro ponto no «Nacional». O F. C. Porto, quebrando enguiço antigo, passou no Estoril, vencendo por 2-1. Uma semana depois, mais um ponto perdido pelo Benfica, contra o Belenenses, o F. C. Porto com 14 pontos, igualado no primeiro lugar, ao fim da oitava jornada. E o Sporting, ao bater o Atlético, na Tapadinha, por 5-2, a um só ponto de ambos.

Como Cesário Bonito resgatou Arcanjo à cegueira

Miguel Arcanjo, que viera de Angola, com rótulo de craque, quando o paquete que o transportava cruzava a Madeira, ergueu-se ao convés para avistar a ilha que lhe disseram ser paraíso, um chisco entrou-lhe num olho, alanceado de dores ficou até desembarcar no Cais do Conde de Óbidos. Pensou que seria coisa passageira. Mas não. Chegou a temer-se que pudesse ficar cego, foi dado como inapto para o futebol. Sentindo-se de ilusões desfeitas, com as faces de ébano aljofaradas de lágrimas mais de dor do coração que dos olhos, pediu que o clube não o desprezasse assim. Não. Cesário Bonito encarregou-se dele e no dia 12 de Dezembro de 1951, depois de complicada operação à retina, foi autorizado a voltar a jogar futebol. Era uma boa nova.

O Volvo do sorteio e o goleador velocista

Cinco dias depois, o Boavista bateu o F. C. Porto no Bessa, por 1-0. Nesse comenos se anunciou a abertura de um «Monumental Sorteio Pró-Estádio». Quinze tostões custava o bilhete. E o vencedor ganhava um automóvel Volvo avaliado em 78 contos.
A 2 de Dezembro, perdendo em Guimarães, por 1-2, o Benfica cedeu o comando ao F. C. Porto, que bateu o Sporting da Covilhã por 6-1, com quatro golos entre os 53 e os 63 minutos.
Na décima segunda jornada, a 9 de Dezembro, o F. C. Porto venceu na Tapadinha, mantendo a liderança. Antes de a partida se iniciar, através dos altifalantes do estádio foi anunciado que uma pastelaria de Alcântara ofereceria um bolo-rei ao marcador do primeiro golo. Coube a Hernâni, que o recebeu e com ele fez uma minifesta nos vestiários.
Uma semana volvida, com três golos do velocíssimo Vieira (que não muito depois se haveria de sagrar campeão de Portugal de 100 metros!!!), o F. C. Porto bateu, no Estádio do Lima, o Benfica por 3-0, deixando o trio B-S-B a três pontos no final da primeira volta do «Nacional». Foi tal a emoção dos portistas que, no final, Virgílio agarrou-se ao seu massagista e chorou convulsivamente, como se tivesse ganho o... Campeonato do Mundo. Mas, ainda sem que os portistas o percebessem, o destino estava já contra eles.
No último dia de 1951 o argentino Vaschetto abandonou a cidade. De fuga se falou em cicio. Moreira de Sousa, chefe da Secção de Futebol, tentou aquietar os espíritos, asseverando: «Vaschetto está de férias e fui eu quem lhas deu.» Só não sabia que o técnico já nem sequer estava em Portugal. E que se bandeara de facto. Evangelicamente acreditava que os rumores que corriam pela cidade não passavam de boatos e aspergindo água para a fervura, redarguia: «Vaschetto não pode ter-nos traído, não tinha motivos para isso, antes pelo contrário. Por outro lado, os seus fatos de Verão e até as próprias mobílias ficaram no Porto e continuam a ser propriedade sua.» Por essa altura tinha o F. C. Porto 10.715 sócios.

Os anjos negros de Setúbal e o presunto que traiu Barrigana

Princípio da tempestade: o F. C. Porto derrapou em Braga: 0-2, três dias antes de Urgel Horta ter sido eleito presidente da Direcção.
A 26 de Janeiro: queda livre. Derrota no Barreiro por 0-2, e cedência do comando ao Benfica, que somava 27 pontos, mais um que os portistas. E depois das derrotas em Braga e no Barreiro, o F. C. Porto empatou no Lima com o Belenenses: 1-1. Matateu estragou a festa. De passo perdido e coração ferido, mais um desaire: 1-2 em Alvalade. Com dois golos marcados por Jesus Correia e um muito discutido golo invalidado aos portistas por Evaristo Santos, árbitro de Setúbal. Outra vez, mais uma, os árbitros do Sado, que, então, os portistas consideravam os seus «anjos negros», a fazerem das suas...
Mas o sonho do título só ficaria de todo desfeito algum tempo depois. Por uma cruel partida do destino. Alto preço pagaria Barrigana por um salto ao Montijo, onde nascera para o futebol e deixara muitos amigos — tudo por causa de um naco de presunto, comido por lá. O fígado deu o flanco e foi o diabo. Durante a noite, cólicas fortíssimas reduziram Barrigana, ensarilharam-no, destroçaram-no. E no jogo... «Não sei bem o que sentia. Fui atacado por tonturas e por má disposição geral, a tal ponto que as minhas tenazes não aguentaram as brasas atiradas à baliza.» E, desolado, com bagadas de suor caindo-lhe ainda do rosto macerado, deixou descair: «Esta derrota matou as nossas últimas esperanças.»
Era forte ainda o abalo da fuga de Vaschetto para o México, entretanto substituído pelo espanhol Pasarin, que chegou ao Porto de olhos fechados e demorou a abri-los...
O Sporting, que em finais de Fevereiro estava a seis pontos do Benfica e a dois do Belenenses e do F. C. Porto, com um forcing fulgurante acabou por revalidar o título, somando 41 pontos, mais um que o Benfica e mais cinco que o F. C. Porto e o Belenenses.
Ficou, entretanto, a saber-se que o Campeonato Nacional da I Divisão gerara uma receita de bilheteira de 10.318 contos, vendendo-se quase um milhão de bilhetes. Em 1935 esse valor fora de apenas 875 contos. E para que se perceba bem a diferença, é preciso não perder de vista que, então, a taxa de inflação era muito baixa... Para o Benfica o maior valor líquido da época: 1118 contos, cabendo ao Sporting 981, ao F. C. Porto 790 e ao Belenenses 671.
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hast

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O Eládio Vaschetto já tinha orientado o FC Porto em 1947/48, época que não correra bem a nível interno, já que os portistas acabaram em 5º, em igualdade pontual com o 4º (Estoril-Praia). No entanto, o futebol praticado pelos \'azuis e brancos\' deslumbrou, dada a sua forte vocação ofensiva, que conduziu Araújo ao título de melhor marcador do campeonato com 36 golos. Para além disso, o FC Porto deixou boa imagem nos encontros internacionais: venceu o Valência, campeão de Espanha, por 1-0, com golo de Catolino, e o Arsenal de Londres, por 3-2, com golos de Correia Dias (2) e de Araújo.
Três anos depois regressou, já que dirigentes, adeptos e atletas desejavam que voltasse ao comando técnico dos \'dragões\', onde era carinhosamente apelidado de \'homem do Arsenal\'. Homem de muito trabalho e poucas falas, Vaschetto protagonizou um arranque fabuloso de campeonato, em 1951/52, com os \'dragões\' a chegarem a meio da prova isolados no comando com 3 pontos de vantagem, numa equipa onde pontificavam Barrigana, Virgilio, Carvalho, Joaquim, Vieira e Hernâni. Só que nos últimos dias de Dezembro de 1951 desapareceu misteriosamente rumo ao México, onde fora futebolista. Deixou os seus fatos e mobílias no Porto, e, ao que se sabe, não mais as veio buscar. O seu substituto, o espanhol Pasarín, realizou um trabalho desastroso, perdendo não só a liderança do campeonato, como também deixou cair a equipa no 3º lugar, em igualdade com o Belenenses (4º).
 

fcporto56

Tribuna Presidencial
26 Julho 2006
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Sacramento
> hast Comentou:

> O Eládio Vaschetto já tinha orientado o FC Porto em 1947/48, época que não correra bem a nível interno, já que os portistas acabaram em 5º, em igualdade pontual com o 4º (Estoril-Praia). No entanto, o futebol praticado pelos \'azuis e brancos\' deslumbrou, dada a sua forte vocação ofensiva, que conduziu Araújo ao título de melhor marcador do campeonato com 36 golos. Para além disso, o FC Porto deixou boa imagem nos encontros internacionais: venceu o Valência, campeão de Espanha, por 1-0, com golo de Catolino, e o Arsenal de Londres, por 3-2, com golos de Correia Dias (2) e de Araújo.
Três anos depois regressou, já que dirigentes, adeptos e atletas desejavam que voltasse ao comando técnico dos \'dragões\', onde era carinhosamente apelidado de \'homem do Arsenal\'. Homem de muito trabalho e poucas falas, Vaschetto protagonizou um arranque fabuloso de campeonato, em 1951/52, com os \'dragões\' a chegarem a meio da prova isolados no comando com 3 pontos de vantagem, numa equipa onde pontificavam Barrigana, Virgilio, Carvalho, Joaquim, Vieira e Hernâni. Só que nos últimos dias de Dezembro de 1951 desapareceu misteriosamente rumo ao México, onde fora futebolista. Deixou os seus fatos e mobílias no Porto, e, ao que se sabe, não mais as veio buscar. O seu substituto, o espanhol Pasarín, realizou um trabalho desastroso, perdendo não só a liderança do campeonato, como também deixou cair a equipa no 3º lugar, em igualdade com o Belenenses (4º).

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hast

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Cortejo de materiais com pão e vinho

A 28 de Maio de 1952, o F. C. Porto inaugurou o Estádio das Antas, que custou 7500 contos. O Benfica ofereceu troféu com 18 quilos de prata e ganhou por... 8-2

O Porto ganhou tom de romaria de solidariedade, com a organização do segundo Cortejo de Materiais, no dia 8 de Maio de 1952. O primeiro fora um ano antes. Com igual sucesso. E aparato. 62 camionetas, 37 automóveis e 10 furgonetas tomaram parte no cortejo com vista à recolha de dádivas para ajuda à construção do Estádio das Antas, que desfilou pelas principais ruas da cidade, pejadas de gente, animado por Zés-Pereiras e as bandas do Asilo do Terço e dos Bombeiros de São Mamede. Para além das óbvias ofertas de cal, pedra, cimento, areia, madeira, saibro, tijolos e paralelepípedos, apareceram outras, de outro género: carne, vinho, pão. Leiloados esses produtos, renderam quase 15 contos. E porque havia também a sugestão de se concorrer com 20 escudos para a compra de um tijolo, quando os dirigentes do F. C. Porto fizeram as contas concluíram que tinham arrecadado, para além dos materiais, mais cerca de 100 mil escudos em dinheiro...
O F. C. Porto seguiu em frente na Taça de Portugal, ao esmagar o Sporting de Braga, por 10-1. O novo estádio estava quase prontinho. Um orgulho.
No dia 28 de Maio (por essas malhas que o Império tecia e outras mais, naturalmente), inaugurou-se, enfim, o Estádio das Antas. Temeu-se que o tempo confiscasse beleza e entusiasmo. Mas, pela tarde, as nuvens cinzentas que se acastelaram no horizonte acabaram por desaparecer, dando ainda maior encanto, maior magia aos minutos inolvidáveis, de vibração, em que alma do povo se confundia com a própria alma do estádio.

A milícia de baioneta calada

Antes de Craveiro Lopes, Presidente da República, descer ao campo para colocar a Medalha de Mérito Desportivo, que não tinha, até então, sido concedida a nenhum outro clube português, mas apenas entregue à Selecção de hóquei em patins que se sagrara campeã do Mundo, no estandarte de honra do F. C. Porto, aclamado pela multidão, passou revista à guarda de honra, constituída por um batalhão de milícia da Mocidade Portuguesa, de baioneta calada. À entrada no recinto, a Direcção do F. C. Porto oferecera-lhe um ramo de flores...

O drama dos jogos com o Sporting

O estádio custara 7500 contos. O ministro da Obras Públicas, Frederico Ulrich, que fora campeão nacional de 110 metros barreiras, nos anos 10, ao serviço do CIF, foi dos governantes que mais se empenharam para que o F. C. Porto tivesse, enfim, campo atlético à medida da sua grandeza. O Benfica entrou na festa, oferecendo aos portista um fabuloso troféu, com 18 quilos de prata, alusivo ao evento. E ambas as equipas de honra jogaram. Ganharam os benfiquistas por... 8-2.
Arsénio apontou o primeiro golo no novo campo e o primeiro portista a fazer o gosto ao pé, nas Antas, foi Vital, esse mesmo, o alcantarense que ao trocar o Atlético pelo F. C. Porto abriu foco de animosidade entre os dois clubes e, sobretudo, entre os adeptos de ambos, que se manteve aceso anos a fio...
No seu primeiro jogo nas Antas, o F. C. Porto alinhou com Barrigana; Virgílio e Carvalho; Pinto Ferreira, Alfredo e Romão; Hernâni, Araújo, Monteiro da Costa, José Maria e Vital.
Quatro dias passados, na primeira partida oficial nas Antas, F. C. Porto-Sporting. Para as meias-finais da Taça de Portugal. Vitória portista por 2-0. Como que em complemento da festa de 28 de Maio. Em todos eles, de adeptos a jogadores, mais transluziu aquele entusiasmo que nasce das paixões quentes e empolga. Desde 1939 que a final da Taça era para os portistas um ainda não vencido suplício de Tântalo — sonho algumas vezes mesmo à mão, mas que vicissitudes várias tudo acabavam por esvair. Seria agora?...
Mas, na segunda «mão», em Alvalade, 90 minutos de luta dramática não foram suficientes para definir o finalista. O Sporting venceu por 4-2, mas o seu quarto golo foi apontado por Albano, para além da hora, não se percebendo bem porque o árbitro dera tanto desconto, mas enfim...
Esse golo deixou vários jogadores portistas em estado de choque. Nas faces de Barrigana, Pinto Vieira, Bibelino, Monteiro da Costa borbulharam lágrimas. Como que fulminados pelo acontecimento, debandaram para as cabinas, como se fora em via sacra. Arreados, alanceados no coração e no amor próprio, vociferando maldições, mal conseguindo amordaçar insultos e injúrias ao árbitro — e aos fados, até porque aos quatro minutos de jogo já o F. C. Porto vencia, outra vez, por 2-0, o que, a juntar aos outros dois golos de vantagem que trazia das Antas...
Havia, contudo, ainda mais uma oportunidade e talvez a dor e a revolta não amolgassem. No jogo de desempate, em Coimbra, o F. C. Porto aos 15 minutos vencia já por 2-0, mas, depois, acabaria por sofrer cinco golos e ser eliminado da Taça. Dramaticamente. Era preciso preparar o futuro. E não desfalecer aos infortúnios que se sucediam. Por isso os directores do F. C. Porto decidiram, por esses momentos, reforçar a equipa com três africanos, Carlos Duarte, Perdigão e Albasini, com António Teixeira, que fulgurara no V. Guimarães, com Osvaldo Cambalacho, escolhendo para treinador Lino Taioli. Mas a conquista maior estava ainda por fazer.
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hast

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> ...Por isso os directores do F. C. Porto decidiram, por esses momentos, reforçar a equipa com três africanos, Carlos Duarte, Perdigão e Albasini, com António Teixeira, que fulgurara no V. Guimarães, com Osvaldo Cambalacho, escolhendo para treinador Lino Taioli.

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Lino Taioli

Antigo jogador, com passagens pelo futebol italiano, onde representou Génova e Mantova, já em fim de carreira, chegou a Portugal, em 1951/52, para orientar o Boavista, depois de uma passagem fraca pela Selecção da Colômbia e um trabalho positivo no Racing Santander. Conduziu os \'axadrezados\' a um 5º lugar, onde era tratado por \'Mestre\' Taioli, o que lhe abriu as portas do FC Porto. A carreira nos \'azuis e brancos\' não estava a decepcionar, e a meio da temporada, encontrava-se a apenas dois pontos do líder Sporting, com os mesmos pontos do Benfica. Só que uma derrota em Évora, frente ao Lusitano, seguida de nova derrota, em casa, diante do Atlético, viria a custar-lhe o lugar. Foi rendido por Cândido de Oliveira, que, auxiliado pelos \'históricos\' Pinga e Artur Baeta, não foi além do 4º lugar final.
 
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hast

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500 Contos por Pedroto
Pediu 150 contos para deixar o Belenenses. Julgava que, assim, os dirigentes do F. C. Porto o deixariam em paz, como escriturário da Hidro-Eléctrica. Enganou-se

José Maria Pedroto começou a jogar no Leixões, a tropa levou-o a Vila Real de Santo António. Ao abrigo da Lei Militar, representou o Lusitano, nessa altura com uma equipa muito interessante. De tal modo que ao bater o Sporting, com o Campeonato em fase decisiva, acabou por entregar, em bandeja de prata, o título ao Benfica, em 1950. Foi de Pedroto o primeiro golo, batendo Azevedo com um tiro de 30 metros, que considerou, pela vida fora, um dos seus golos mais arrebatantes. Por isso recebeu 100 escudos. Era, aliás, o que arrecadava sempre que o Lusitano ganhava. Se empatasse, embolsava 60, se perdesse, 20. E mais nada. O golo a Azevedo retocou-lhe a aura. O Belenenses lançou-lhe o canto de sereia, como o Sporting lançaria a Caldeira. Os dirigentes do clube da Cruz de Cristo ofereceram-lhe 25 contos de luvas e mais 25 deram ao Lusitano.
Já depois do acordo selado, um director do F. C. Porto colocou-lhe nas mãos um cheque de 80 contos. Bastaria apenas dar o dito por não dito ao Belenenses. Mas não quis voltar com a palavra atrás e para as Salésias partiu. Reinsistiram os portistas no final de 1952. Como se sentia bem, disse aos emissários, que correram a aliciá-lo, que só se mudaria se lhe dessem a astronómica verba de 150 contos. Estava empregado na Hidro-Eléctrica do Zêzere, muito bem pago para empregado de escritório, o Belenenses também não pagava mal, por isso...
Os dirigentes do F. C. Porto correram às Salésias, oferecendo 500 contos. Embasbacaram os outros. E assim se fez a transferência-record do futebol português. Para o Belenenses, 335 contos; para Pedroto, mais do que os 150 que ele exigira...
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Os inaladores de oxigénio

Em finais de 1952, o F. C. Porto tinha mais de 20 mil sócios. Apesar dos 100 contos gastos com a tecnologia da moda, terrível foi o Natal para os portistas

A 8 de Setembro de 1952, festa de despedida de Francisco Ferreira, filho do porteiro do velhíssimo Campo da Constituição do F. C. Porto. Portista se iniciou no futebol, chegando mesmo a campeão de Portugal. Era pobre e sabia que o F. C. Porto tinha jogadores já bem pagos, em 1938. Pediu que lhe dessem um pouquinho de dinheiro que lhe atenuasse angústias de vida à míngua de quase tudo. Atreveu-se a pedir... 300 escudos. Um dirigente nortenho, em dia de má disposição e péssima inspiração, disparou: «O senhor ou assina a ficha ou põe-se na rua, porque não queremos cá dentro malandros a pedirem dinheiro.»
Sentiu um desmoronar de ilusões semelhante a um terramoto. Foi com se um solavanco tremendo sacudisse todo o seu corpo. Retirou-se dignamente, mas com a revolta dos que, após porfiados esforços, se vêem humilhados e insultados. Tinha 18 anos e, para espanto seu, alguns dias depois apareceu-lhe um dirigente do Benfica a oferecer-lhe os tais 300 escudos. Benfiquista se fez e benfiquista ficou para o resto da vida...
E no dia da retirada, no Estádio Nacional, jogaram, naturalmente, Benfica e F. C. Porto, então unidos por relações de amizade profunda, quase parecendo sentimentalmente siameses, depois de alguns anos, não muito antes, de insultos, agressões, cizânias. Era assim o futebol. É assim. Assim será, certamente. No jogo, que era o que menos importava, o Benfica, que ganhara Chico Ferreira por aquela estúpida insensibilidade de um acéfalo dirigente portista, voltou a ganhar, desta feita por 1-0.
Poucos dias depois, quando o F. C. Porto tinha já mais de 20 mil sócios, faleceu Camilo Moniz, um dos pioneiros da Rua da Rainha e, nesse comenos, sócio n.º 2 do F. C. Porto.
Era tempo de moda de tecnologia revolucionária no futebol: o inalador de oxigénio, que a Académica introduzira, na final da Taça de Portugal do ano anterior, com o Benfica. Na tentativa de evitar cansaços prematuros aos seus jogadores. Ficou a saber-se que em caso algum os jogadores poderiam receber mais de 12 litros de oxigénio. Seria a morte do(s) artista(s). O F. C. Porto, para não fugir à regra, também encomendou um. A instalação e a aparelhagem custavam pouco mais de 100 contos.
À quarta jornada do Campeonato Nacional de 1952/53, o Lusitano de Évora seguia isolado na dianteira, com sete pontos, o segundo era o Barreirense, com seis.
Emoções fortíssimas na sexta jornada, a 3 de Novembro. Em Évora, o Lusitano, ao bater o Sporting (que já empatara no Porto) por 2-0, reassumiu a liderança. Nas Antas, o F. C. Porto quebrou o enguiço que o perseguia em jogos no seu novo estádio, com o Benfica, e bateu o antagonista por 2-1, mas o golo da vitória, apontado por Pedroto, resultou de uma situação de off-side — queixaram-se os benfiquistas. Fernandes, o porta-voz da denúncia, aventou: «Sem a sorte do jogo pelo nosso lado, ainda tivemos de sofrer injustiça de bradar aos céus.» Muitos dos portistas, tão-pouco habituados a favores de arbitragem — antes pelo contrário — espirraram guinadas de riso cínico ao saberem dos lamentos adversários, que tresandavam a desculpa de mau pagador.
Oito dias depois, nova derrota do Lusitano, pelo que, na frente, com 10 pontos, ficaram Sporting, F. C. Porto e Belenenses. Os eborenses pareciam desfalecer. Mas, antes do Natal, novo arranco de força bravia e... 3-0 ao F. C. Porto. Com isso se isolou o Sporting na dianteira, com 16 pontos, mais um que o Belenenses e mais dois que o Vitória de Setúbal, o F. C. Porto e o Benfica. Era a espada de Dâmocles sobre a cabeça de Lino Taioli. Pelo que, a 24 de Janeiro de 1953, Cândido de Oliveira assumiu o comando técnico da equipa de futebol, escolhendo para seus auxiliares Pinga e Artur Baeta. E, na sua estreia, uma goleada: 6-0 ao Guimarães.
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