O Século XX do Desporto

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Didrikson pôs atletismo feminino (e não só) no mapa das paixões avassaladoras
Babe no grito dos rufias

Tinha no corpo sempre a arder o prazer do desafio, língua de fogo da alma ainda mais gigante que todos os desejos, todos os sonhos. Mildred Ella Didrikson era nome de baptismo. Nascera no seio de uma família de emigrantes da Noruega a 26 de Junho de 1914, em Port Arthur, no Texas. Uma das mais incríveis e fabulosas desportistas do século, sem qualquer ponta de dúvida. Durante a adolescência, escabreada e fogosa, apenas se sentia feliz na companhia dos rapazes mais rufias das ruas de Beaumont, vilarejo esconso onde quase toda a gente (sobre)vivia no limiar da pobreza, em bairros de lata e desgraça. Foi nesse cenário que descobriu o talento para o basebol, que aprendeu os truques do jogo, as tácticas para desconcentrar e arreliar adversários, assim como arrastar multidões. E foi lá também que ganhou o epíteto que haveria de fazer história, em voo largo de eternidade: Babe. Babe como Ruth, porque uma vez, ao somar 13 home runs numa partida contra rapazes — as raparigas não lhe davam luta... —, o garotio se pôs aos gritos: «parece Babe, parece Babe.» Assim ficou.

«Soutien?» «pensam que sou mariquinhas?!»
Aos 15 anos Didrikson era já considerada a melhor jogadora de basquetebol da Escola Maior de Beaumont, não que fosse mais alta que as outras mas porque as suas velocidade e impulsão lhe permitiam contra-ataques fulgurantes, cestos espectaculares — até afundanços! Assim, sem surpresa, a Employers Casualty Company of Dallas, a mais prestigiada seguradora do Texas, lançou-lhe convite para a sua equipa de basquetebol a troco de um ordenado mensal de 75 dólares. Para manter incólume o estatuto de amadora o contrato foi assinado como... mecanógrafa mas o que lhe exigiam era simplesmente que jogasse. Uma vez falhou três lançamentos livres, a equipa perdeu o campeonato por um ponto. Atirou um fio de lágrimas para fora do corpo que fraquejara nas mãos que lhe roubaram o sonho — e na torrente só não veio o coração de lutadora perfeccionista. Em vez de ir dormir, regressou, sorrateira, ao pavilhão e lá ficou várias horas a treinar arremessos. No dia seguinte montou uma tabela no jardim da sua casa e antes do pequeno-almoço repetia o ritual: lançamentos, lançamentos, lançamentos... Acertou a mão de tal forma que um mês depois, na pior das hipóteses, convertia 490 em 500 tentativas! Em torno de si foram-se criando outras lendas, como essa de ter marcado 100 pontos numa partida só. Nenhum registo oficial o confirmaria, ela nunca o desmentiu. Aliás, os seus biógrafos foram escrevendo que adorava alimentar esses mitos, assim sempre havia mais gente nos pavilhões para a ver jogar, os bilhetes poderiam ser mais caros. E eram. Entre 1930 e 1932 foi considerada, sem oposição, a melhor jogadora americana. Atirava-se à luta num espírito diletante, buliçosa, provocante. Sabia que tinha os olhos todos postos em si. No seu fulgor. E desconcertava. Quando, já depois de se ter sagrado campeã olímpica, em Los Angeles, os dirigentes da equipa de basquetebol lhe pediram que usasse soutien em todas as suas partidas, porque «em algumas fotografias se insinuava alguma falta de pudor» (!), Babe, muito galhofeira, replicou: «Estão loucos?! Pensam que sou mariquinhas?!»

Vitórias nos 80 metros barreiras e dardo.
Na altura anulação polémica
Rainha apesar de medalha espoliada
Foi durante o defeso do basquetebol que descobriu o atletismo. Começou por ser complemento de treino. Num fósforo se tornou suplemento de glória. Com 16 anos ainda, aceitou desafio de um técnico e foi ao campeonato dos Estados Unidos lançar o dardo. Deitou o engenho a 40,625 metros. Bruá de espanto, record do Mundo. Babe, espantadíssima, murmurou para as outras: «Foi fácil, foi só pôr o dardo a fugir-me das mãos!» Assim, sem surpresa, em edulcorada súplica, os dirigentes da American Athletic Union (AAU) disseram-lhe que não poderia deixar de alinhar nos Jogos Olímpicos de Los Angeles, os americanos precisavam de mostrá-la ao Mundo como a sua maior preciosidade. Sorriu e aceitou. No trajecto sagrou-se campeã dos Estados Unidos dos 80 metros barreiras, do salto em altura, do lançamento do peso e do lançamento do dardo. Nesse mesmo ano outro record mundial, atirando uma bola de basebol a 90,22 metros! No dia 1 de Agosto de 1932 entrou pela primeira vez em acção nos Jogos Olímpicos. Olhos incandescentes, pose altiva no corredor de lançamento. E nem uma palavra às adversárias. Nervosismo? Chegara, enfim, a hora de ter medo? A essa questão responderia: «Não, nervosa porquê?! Medrosa?! Nem dos rapazes com quem eu me habituei a competir tinha medo quanto mais de rapariguinhas como aquelas, algumas com ar de quem acabara de sair do colégio.» Venceu o dardo com 43,68 metros — mais um record do Mundo. Três dias depois vitória nos 80 metros barreiras, após luta faiscante com a compatriota Evelyne Hall. O cronómetro parou aos 11,7 segundos — outro record do Mundo. Nesse mesmo dia saltou em altura 1,65 metros — também record do Mundo Jean Shiley igualou-lhe a marca, bateu-a no desempate, teve pois de contentar-se com a medalha de prata depois de polémica aberta na pista. É que saltara 1,68 metros mas um juiz decidiu anular o salto por... «deficiência técnica no acto do rolamento ventral». Ninguém percebeu muito bem porquê, ela também não se importou com a escatima: «Ainda se isso me desse mais dinheiro!» — parece que foi o seu único desabafo. Duas medalhas de ouro e uma de prata foram o bastante para que se consagrasse rainha incontestável de Los Angeles.

Anúncios, milhões e excomunhão
A torrente da fama que se abriu com as suas vitórias olímpicas arrastou-a, meses seguidos, pelos Estados Unidos em espectáculos de vaudeville, empolgando multidões que a incensavam — ofertas de chorudos contratos publicitários, de milhares de dólares para se dedicar mais ao basquetebol. E ela calada, expectante — era o receio do crocitar dos abutres que se aproveitassem da mais pequenina falha para lhe escarvoar o futuro. Estava ainda a viver as emoções olímpicas e por toda a América espalhou-se publicidade a automóvel com a imagem de Didrikson. A AAU não esteve com meias-medidas e irradiou-a sem sequer lhe instaurar inquérito, apesar de Babe jurar que não dera ordem para o anúncio, que nada recebera por ele. E nunca mais pôde voltar às pistas, era profissional.

Babe Didrikson só deixou competição quando já estava condenada à morte
Golfe popular e o cancro fatal
Não podendo voltar a competir no atletismo, Didrikson escolheu o ténis. Fecharam-lhe as portas. Apostou no golfe e em 1935 ganhou o campeonato do estado do Texas. O seu nome arrastava uma horda de fãs como nunca se vira em competições femininas. Nesse dia claques estridentes inundaram o campo, destroçaram o aristocrático ambiente dos torneios, houve assobios às adversárias, gritos ululantes à heroína, cânticos e até esboço de distúrbios. Com receio de que os «excessos popularuchos» se espalhassem Babe foi proibida de jogar golfe nos anos que se seguiram. Voltou a pegar nos tacos para uma tournée exibicional com Gene Sarazen, que lhe rendeu 1000 dólares por semana. Nunca o escondeu: «Tudo o que faço é pelo prazer de pôr o corpo em desafio, ganhando dinheiro com isso.» Nesse sentido, participou em exibições de bilhar, de pingue-pongue e até num combate de boxe com Babe Ruth! Em 1943 reabriram-lhe as portas dos campos de golfe, por um dirigente visionário ter percebido que Didrikson poderia ser o balão de oxigénio — ou, mais que isso, a rota para a modernidade do profissionalismo no feminino. Estava certo, três anos depois sagrou-se vencedora do Open dos Estados Unidos. Nunca a modalidade vivera com tanta popularidade, tanto mediatismo. Em 1947 ganhou os 17 torneios em que participou, coroando a série com vitória no Open de Inglaterra. «Foi no golfe que percebi melhor o meu espírito. Não tolerava perder com nenhuma mulher. Quem me batesse duas vezes passava a ser tratada por mim como... inimiga, não descansava enquanto não a humilhasse.» Apoderou-se dos milhões e dos troféus do U. S. Open de 1948, 1950 e 1954. Havia largo tempo que já sabia que também lutava contra uma neoplasia num seio. Doente, não sentia ainda os sonhos cansados. Em 1955, depois de três delicadas operações cirúrgicas, os médicos já não lhe permitiram que voltasse a jogar. O cancro acabou de matá-la no dia 27 de Setembro de 1956. Tinha 42 anos. E os americanos, que por ela choraram algumas vezes de felicidade, nesse dia perceberam que afinal Babe também podia fazê-los chorar de saudade. Partia dramaticamente mas deixava, sublime, a chama quente de um nome eterno — a maior atleta dos primeiros 50 anos do século XX em todos os inquéritos que se foram fazendo na América e não só.

Mulher de lutador
Quando decidiu abandonar o atletismo, após a excomunhão de 1933, vários jornalistas americanos consideraram-na mercenária e... estúpida, «por não aproveitar o seu filão nas pistas». A um deles justificou-se, pragmática: «Fui pobre, sei o que custa ser pobre. Gosto tanto de desporto que quero fazer disso a minha profissão. Se há quem o considere crime a culpa não é minha. Estúpida seria se deitasse fora todos os milhares de dólares que me querem dar em troca do espectáculo que dou...» Em 1938 casou com o lutador profissional George Zaharias e foi como Mildred Zaharias que se lançou no golfe. Por essa altura havia quem, à boca pequenina, insinuasse que talvez fosse um... homem. Também se escarrinharam suspeitas de homossexualidade. Tudo falso.
 
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1932 – F. C. Porto campeão de Portugal
Depois de portistas de Szabo estarem a ganhar por 4-1, belenenses impôs finalíssima

Augusto, o Silva
Eliminado o Benfica da edição de 1932 do Campeonato de Portugal, surgiria no caminho do F. C. Porto o Belenenses, que com dificuldade afastara o Barreirense. Não se notavam, quer nos jogadores, quer nos técnicos, quer nos dirigentes, quer nos simpatizantes portistas, sentimentos escurentados por fumos de desconfiança. Antes pelo contrário. O Campo do Arnado, em Coimbra, voltou a ser terreiro da luta. A 3 de Julho se jogou a final, arbitrada pelo espanhol Ramon Melcón, a quem a Federação Portuguesa de Futebol recorreu por não ter sido possível obter acordo entre os dois clubes relativamente a qualquer juiz português. Os pupilos de Joseph Szabo chegaram com surpreendente facilidade a uma vantagem de 4-1, com dois golos de Pinga, um de Valdemar e outro de Acácio Mesquita. Parecia que nada poderia pôr empeços aos seus desejos. Mas por vezes o destino desconcerta: à última hora o Belenenses teve de substituir o habitual avançado-centro, Rodolfo Faroleiro, pelo reserva José Ramos — e, como o substituto não estivesse em dia de inspiração, Artur José Pereira decidiu, perto do fim, quase em solução de desespero, colocar nessa função o médio-centro Augusto Silva, que destroçou a defesa do F. C. Porto apontando... três golos, o último dos quais, o do empate a quatro, aos 88 minutos. Com o prolongamento nada se resolveu, o regulamento determinava que a finalíssima se disputasse no domingo seguinte, não pôde respeitar-se a praxe porque a Associação de Futebol de Lisboa combinara um Lisboa-Astúrias para o dia 10 de Julho. Por isso se jogaria a 17, outra vez sob arbitragem de Ramon Melcón, cuja direcção do primeiro encontro se considerara modelar.

No jogo do tira-teimas, FC Porto venceu por 2-1
Cerveja no quarto
Os ferrenhos supporters do F. C. Porto chegaram a Coimbra em toda a espécie de viaturas: automóveis — do Rolls-Royce ao Ford Modelo T —, camionetas, comboios especiais e bicicletas. Os bilhetes custavam cinco escudos e quem mais cedo chegasse ao Arnado melhor se instalava. A primeira parte terminou com empate a uma bola. O FC Porto abriu o activo graças a uma grande penalidade apontada por Pinga, imposta por mão claríssima de César. Empatou o Belenenses por intermédio de Bernardo Soares. Para Ribeiro dos Reis esse golo da igualdade chegou um tanto contra a corrente do jogo. O FC Porto, obtido o primeiro tento, passou a instalar toada de ataque não muito pronunciado mas mesmo assim predominante e o Belenenses só de vez em quando aliviava para surtidas, as mais adequadas das quais eram neutralizadas pela tarde infeliz do seu extremo-direito, Heitor Nogueira. «O título de campeão de Portugal decidiu-se aos 17 minutos da segunda parte, com um goal dos mais brilhantes que se verificaram em partidas de futebol, pois começou num pontapé de alívio de um defesa, Avelino Martins, e de então até a bola entrar na baliza do finalista lisboeta só jogadores portuenses lhe tocaram: Álvaro Pereira, Valdemar, Pinga, Carlos Mesquita, que centrou, e o seu irmão Acácio, que lhe deu o caminho da rede com um pequeno toque, aliás, perante o assombro da defesa belenense. A ovação a este golo durou minutos! — feita, como é bem de calcular, pela massa de adeptos dos portuenses. A vitória do FC Porto ficou bem justificada pelo jogo desenvolvido na segunda parte e a nota a dar-se é a de que a sua equipa esteve mais vezes perto do terceiro tento que a lisboeta de ir buscar igualdade que fizesse discutir a posse do título.» Indescritível o que se seguiu ao fim do encontro! O campo transformou-se num mar vibrante de cabeças. Os jogadores do FC Porto foram arrastados em triunfo pela multidão ululante. Nenhum pôde resistir. A mole era gigantesca e o entusiasmo colossal. Sorrisos, foguetes, bandeiras em tremulina. Só muito tempo depois, recolhidos os aplausos frenéticos, os campeões tomaram quatro automóveis e, ainda com bagas de suor — ou seriam já de felicidade e festa? — perolando-lhes as faces, mantendo os equipamentos sujos e ensopados, correram para o Hotel Astória, onde se banharam, enfim. No quarto de Avelino, grades de cerveja que se abriram para a festa. E, emborcando uma, Acácio Mesquita disparou: «Os homens de Belém, com a bola nos pés, não sabem jogar! Sabem, sim, ser duros. Mas não é com dureza que se pratica foot-ball.»

Campeões de Portugal
Miguel Siska, Avelino Martins, Pedro Temudo, Álvaro Sequeira, Álvaro Pereira, Castro, Lopes Carneiro, Valdemar Mota, Acácio Mesquita, Pinga e Carlos Mesquita
 
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1935 – FC Porto ganhou primeiro Campeonato da Liga
Tudo se decidiu contra Sporting, com Pinga de cama

Caça em covil de leão
Cumpriu-se a tradição. O F. C. Porto, que ganhara a primeira edição do Campeonato de Portugal, venceu, igualmente, a edição de arranque do Campeonato da I Liga. O caso? Contra o Belenenses, a 10 de Março de 1935, vitória portista por 5-4 num desafio que teve de tudo: a auréola romântica do imprevisto, a energia dos heróis, a emoção e o dramatismo dos grandes espectáculos. Ao intervalo estava o Belenenses a vencer por 3-1, no segundo tempo os portistas marcaram três golos de rajada, os lisboetas empataram a um quarto de hora do final e aos 83 minutos o tento que manteve o sonho aceso; no último minuto penalty assinalado contra o F. C. Porto, o árbitro depois de consultar o fiscal de linha deu o dito por não dito, reatando o jogo com bola ao ar. Brados e gritos, blasfémias praguejadas pelos adeptos do Belenenses que tinham viajado em comboio especial para o Porto, pagando 40 escudos pela viagem, intervenção policial, com a guarda a cavalo amainando a tempestade à força de bastão. Protesto dos dirigentes do Belenenses que a FPF aceitou... E, como antes o F. C. Porto perdera nas Amoreiras, se não voltasse a ganhar poderia hipotecar todas as esperanças. Ganhou e por isso a decisão ficou centrada no Lumiar. A emoção ao rubro? Naturalmente, o duelo de gigantes na última jornada. Aos portistas bastava empate com os sportinguistas. Pinga adoeceu e não pôde jogar: 2-2 foi o resultado. E a festa — 22 pontos para os portistas, 20 para o Sporting, 19 para o Benfica, 18 para o Belenenses, 16 para o Vitória de Setúbal, 8 para o União de Lisboa, 6 para o Académico do Porto, 3 para a Académica. Por iniciativa de Bento Correia e Sebastião Ferreira Mendes foi iniciada subscrição pública entre os associados do F. C. Porto destinada a oferecer medalhas de ouro a todos os jogadores que conquistaram o Campeonato da I Liga — e que tiveram de percorrer 3597 quilómetros quase sempre em carruagens da CP, de... segunda classe, segundo nótula publicada pela Stadium. Vitória também na tesouraria, já que os portistas arrecadaram 124 contos de receitas de bilheteira, mais 14 que Sporting e 27 que Benfica. Outra curiosidade: as despesas de organização de todo o campeonato andaram pelos 365 contos, financiados naturalmente pelos oito clubes que nele participaram.

Campeões de Portugal
Acácio Mesquita, Álvaro Pereira, António Santos, Artur Alves, Augusto Assis, Avelino Martins, Carlos Mesquita, Carlos Nunes, Carlos Pereira, Francisco Castro, Jerónimo Faria, João Nova, Lopes Carneiro, Pinga, Raul Castro, Soares dos Reis e Valdemar Mota

Szabo no Arsenal e pavor de sexo e multas
Joseph Szabo, treinador do F. C. Porto, assistia a todos os jogos da equipa sentado numa cadeirinha talismã (e não no banco, se já o houvesse...), junto das linhas laterais. E sempre com um chapéu de coco encafuado na cabeça. Por essa altura era considerado por todos os pupilos, mais que um mago, um amigo. Quando decidiu fazer estágio no Arsenal, estando as finanças do clube mirradas, subscrição pública que rendeu pouco mais de 20 contos e empréstimo de seis contos de Jerónimo Faria, seu pupilo, permitiram-lhe o desejo. Regressou diferente. Irascível. Com aguçado espírito de polícia de costumes, passou a viver obcecado com o «sexo dos jogadores», multando-os em «10 per cente» do ordenado nos atrasos mesmo de um minuto nos treinos quase pela madrugada e até instaurou coima de um por cento a quem, nas peladinhas, chutasse isolado e falhasse o golo! Outra das inovações eram os footings de sete quilómetros da Constituição à Circunvalação. A contestação subiu de tom e em Fevereiro de 1936 o chicote estoirou. Szabo foi substituído interinamente por Miguel Siska... Por essa altura, quase com o campeonato perdido, uma consolação: vitória histórica de 10-1 (!) ao Sporting. Só que os leões jogaram quase uma hora sem guarda-redes porque Artur Dyson foi atingido na cabeça por António Santos, desmaiou, foi retirado em braços do campo, recobrou os sentidos, mas «tão groggy se sentia» que já não reentrou. O treinador era, então, já outro húngaro. Magyar de seu nome. Mas como a roda continuava a desandar, apesar de se falar da hipótese de Szabo regressar como herói, a aposta foi em Janos Biri, que fora guarda-redes do Benfica, a troco de ordenado mensal de 1500 escudos... Szabo foi contratado pelo Sporting, que lhe ofereceu condições nunca vistas em Portugal: dois contos por mês, 50 escudos por cada empate, 100 escudos por cada vitória, 1000 escudos pela conquista do Campeonato de Lisboa, 2000 pelo Campeonato de Portugal e 3000 pelo Campeonato da Liga. Só que os Campeonatos da Liga de 1935/36, 1936/37 e 1937/38 seriam todos ganhos pelo Benfica, o último dos quais de forma épica, em sprint emocionante com F. C. Porto. O empate a dois golos bastou para a festa benfiquista — e Gustavo Teixeira, Francisco Costa, Raul Baptista, Francisco Albino, Gaspar Pinto, Domingos Lopes, Rogério Sousa, Luís Xavier e Alfredo Valadas foram os únicos homens do tri. Por essa altura despontou outra estrela nas Amoreiras: Guilherme Espírito Santo, recordista nacional de salto em altura, que no mesmo dia era capaz de deslumbrar no atletismo e nos campos de futebol, com os seus golos de cabeça, os famosos e estonteantes driblings.
Mulher-espectáculo na patinagem no gelo e chuva de dólares
Lago «sexy» de Sonja
Quando se lançaram os Jogos Olímpicos de Inverno, em 1924, Sonja Henie tinha apenas 12 anos. Esteve lá na patinagem e mostrou logo que o futuro passava pelo seu génio para rodopiar no gelo em deslumbrante bailado. Quatro anos depois, em Saint-Moritz, arrecadou naturalmente a medalha de ouro. Revalidou o título em Lake Placid. Conquistou o tri em Garmisch-Partenkirchen — na primeira parte dos trágicos Jogos de Hitler. Com brilho técnico e notável senso para os negócios, a norueguesa, que depois haveria de se naturalizar americana, revolucionou a patinagem e criou o encanto e a fortuna das tournées de gelo, dos seus bailados saltava, enleante, fascínio igual ao Shirley Temple no sapateado — levando milhões de criancinhas à sua prática, sonhando ser um dia como ela. Henie ganhou os primeiros patins aos seis anos, postos pelo pai no sapatinho de Natal. Aos 10 já era campeã da Noruega! Estudou ballet em Londres, isso foi decisivo para criar a sua mais notável obra-prima, A Morte do Cisne, de O Lago dos Cisnes. O modo sexy de trajar, sempre de saias curtas e às vezes longos e provocantes decotes, mudou completamente o estilo das competições sobre o gelo, deu-lhe o fogo da sedução e do charme. Para além das três medalhas olímpicas de ouro, sagrou-se campeã europeia de 1927 a 1936, nesse mesmo ano profissionalizou-se, invadiu Hollywood, alugou um rinque e montou um show. Deslumbrou. Darryl Zanuck, impressionado, contratou-a para a Fox. Em 1937 gravou o primeiro de 11 filmes: One in a Million. Casou-se com o magnata da indústria naval Niels Onstad e em 1941, quando se tornou americana, em jeito de compensação sentimental, ofereceu à Noruega fabuloso museu em Oslo, todo pago do seu bolso. Morreu em 1969, com 57 anos e uma fortuna pessoal estimada em 50 milhões de dólares.
Ainda houve quem quisesse retirar jogos olímpicos a Hitler, mas...
O que Coubertin sonhou
Após o triunfo eleitoral, nomeação de Adolf Hitler para chanceler do Reich, em 1933. Os opositores foram sendo, entretanto, enviados para campos de concentração, os partidos dissolvidos, os judeus apontados como causa de todos os males pelo simples crime de serem «capitalistas ou comunistas». Apoiado por poderosa e maquiavélica máquina de propaganda, graças à euforia das grandes obras públicas e à militarização da economia, que absorvera os quase seis milhões de desempregados causados pelo crash de Wall Street, tinha a Alemanha aos pés das suas botas cardadas. Estava já lançado para maior criminoso do século. E o COI atribuíra a Berlim a organização dos Jogos Olímpicos de 1936. O Partido Nazi viu nisso a ferramenta ideal para mostrar ao mundo a superioridade do arianismo e Hitler deu ordens para que aqueles fossem os mais espectaculares de todos os Jogos Olímpicos. Coubertin ficou encantado e, apesar de todos os fantasmas que os alemães pudessem despertar-lhe na memória da guerra franco-prussiana, até exclamou: «Este é o tipo de organização com que sempre sonhei!» Por essa altura andavam já em turbilhão as dúvidas no seio de outros membros do COI. Seria de manter os Jogos de 36 na Alemanha? O argumento da não politização do movimento venceu, o führer tratou mesmo de enviar mensagem de descanso aos dirigentes do comité recordando que o director da Aldeia Olímpica até era judeu! Apesar da tristemente célebre noite das facas longas, em Junho de 1934, naquela que foi a primeira «limpeza cirúrgica» (!) de centenas de «adversários da ressurreição alemã», a que nem sequer escaparam alguns incómodos membros da hierarquia nazi, o COI manteve Berlim no mapa olímpico e naquele primeiro dia de Agosto de 1936 Hitler estava radiante da vida, nas nuvens. Preparado para abrir os Jogos, de Espanha chegavam-lhe notícias de que a sublevação de Franco em Ceuta seguia no «rumo certo», arrastando matança ignóbil de civis a caminho do norte. Como era, pois, falsa, cínica, estúpida, aquela paz olímpica que pairava sobre o estádio quando Adolf Hitler, acompanhado por Goebbels e Göring, perante representantes de 49 países, entrou no estádio que custara 70 milhões de marcos, olhou, num arremedo de brilhante emoção, para a chama já a crepitar na pira — e declarou abertos os Jogos!
 
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1932 – Primeira Volta a Portugal de Alfredo Trindade
«Tão pequeno e capaz de vencer o grande Nicolau»

Minorca do Rio de Janeiro
Ainda antes de vestir de verde, e fazer com José Maria Nicolau a dupla mais famosa do seu tempo nas corridas de bicicleta, Alfredo Trindade foi carpinteiro e era assim descrito por jornal da época: «Cabelo castanho aloirado, em pé, ou melhor, em ondas verticais e aparado baixo; olhos castanhos grandes, sempre gaiatos e brilhantes. Testa baixa e comprida, de cantos em ângulo recto; feições pequenas — sendo o crânio relativamente volumoso, o maciço facial, a partir dos ossos molares salientes, vai adelgaçando até à ponta do queixo. Minorca, não tem peito alto mas possui energia indomável...» Com a camisola da União Ciclista Rio de Janeiro ficou em segundo lugar na II Volta a Portugal, atrás de Nicolau. Era o arranque fulgurante para carreira fabulosa. Aprovado sócio do Sporting a 28 de Maio de 1930, nos dois anos seguintes ainda representou o Rio de Janeiro, popularíssima colectividade do Bairro Alto — e ao seu serviço ganhou a terceira edição da Volta a Portugal, envergando a camisola amarela durante 10 etapas e ficando em segundo nas outras sete. Vingava assim, em 1932, a derrota de 31, que lhe estava atravessada: consultando jornais e revistas desse tempo verifica-se que as corridas e os campeonatos alternam o nome do vencedor quase sempre. Seja no Porto-Lisboa, seja no Campeonato de fundo, seja no Lisboa-Benavente, seja nos 100 Km da União Velocipédica Portuguesa, quando ganha Nicolau é Trindade o segundo; quando ganha Trindade é Nicolau o segundo. Era habitual também descobrir comentários assim: «Coitado do Nicolau, sempre ele a puxar por todos e mesmo assim a triunfar.» Ou então: «Tão pequeno o Trindade e capaz de vencer o grande Nicolau...»

Trindade voltou a ganhar em 1933, Nicolau vingou-se em 34
Acidentes e golpes de teatro
O Sporting decidiu apostar fortíssimo no ciclismo. Em 1932 o clube gastara 1595 escudos com a secção, verba que no ano seguinte subiria para 10.457$20. E Trindade passou, naturalmente, a ser a figura cimeira. Não deixou os créditos por mãos alheias, ganhando a Volta a Portugal de 1933 com um avanço de 43 minutos sobre o segundo classificado, o colega de equipa Ezequiel Lino! Contudo, o golpe de teatro surgiria a caminho de Silves. Nicolau desistia, sentando-se num valado, queixando-se de dores nos rins, havendo, contudo, quem, nos sussurros da caravana, considerasse que a desistência se devera a «falta de pernas». No ano seguinte foi o contrário: venceu Nicolau porque Trindade sofrera acidente com um motociclista da prova — Rodrigues Pinto. A caminho de Évora o acidente estúpido, obrigando o sportinguista a recolher ao hospital, muito ferido. Ciclista e motociclista haveriam, depois, de tirar uma foto abraçados na redacção da Stadium, para evitar especulações. Foi mesmo acidente! Mas a grande rivalidade Nicolau-Trindade, que era como dizer Benfica-Sporting, despoletara, aquecera, dividindo o País, apaixonadamente. Mas essa seria a última Volta a Portugal com Trindade ao serviço do Sporting. Em 1935 trocaria o Campo Grande pela equipa de... «Os Leões» de Ferreira do Alentejo — clube de duração efémera — mas operação de urgência em vésperas de partida impedi-lo-ia de alinhar.

Pastilha elástica da máfia
Primo Carnera
Descobriram-no para o boxe num circo de Itália. No seu número autoproclamava-se «o homem mais forte do Mundo». Tinha, sem dúvida, um gabarito impressionante: 122 quilos de peso e 137 centímetros de diâmetro na caixa torácica, 2,17 metros de envergadura desde a ponta do dedo de uma mão à ponta do da outra. Num ápice Primo Carnera profissionalizou-se. Dois anos depois já estava na América, passou a ser um instrumento das máfias de Nova Iorque e de Chicago, que para ganhar dinheiro à custa da sua ingenuidade controlavam nos bastidores os resultados de todas as lutas. Apesar disso, teve oportunidade de disputar o título mundial em 1933, contra Jack Sharley. E ganhou! Na sua defesa, um ano depois, surgiu-lhe ao caminho Max Baer, o playboy dos ringues, talvez o mais divertido pugilista da história. Ao 11.º assalto, estavam ambos no tapete por entre emaranhado de pernas, suspense em redor do ringue — e de súbito uma voz estridente, um grito louco: «O último a levantar-se é maricas!» O brado era de Baer e o último a levantar-se foi Carnera. Em 1935 Max Baer perderia o título mundial para Joe Louis e as suas palavras após a derrota foram simplesmente desconcertantes: «Quando for executado as pessoas terão de pagar mais de 25 dólares por um bom lugar para assistir.» Morreria com 50 anos, em 1959, num hotel em Hollywood, vítima de insuficiência cardíaca. Quando Carnera descobriu, enfim, que fora ludibriado pela máfia durante toda a sua aventura americana, sentindo-se na ruína, com pouco mais que o dinheiro para a passagem de regresso a casa, não esmoreceu e transformou-se em praticante profissional de luta livre, juntando assim à fama que já tinha a fortuna que lhe foram negando através de golpes baixos e manivérsias.
 

fcporto56

Tribuna Presidencial
26 Julho 2006
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Sacramento
So uma pequena nota caro hast.O Max Baer perdeu o titulo de campeao contra o James Braddock,conhecido pelo \"cindarella man\".


On June 13, 1935, one of the greatest upsets in boxing history transpired in Long Island City, New York, as Baer fought down-and-out boxer James J. Braddock. Baer hardly trained for the bout. Braddock, on the other hand, was training hard. \"I\'m training for a fight. Not a boxing contest or a clownin\' contest or a dance.\" he said. \"Whether it goes one round or three rounds or 10 rounds, it will be a fight and a fight all the way.\" \"When you\'ve been through what I\'ve had to face in the last two years, a Max Baer or a Bengal tiger looks like a house pet.\" \"He might come at me with a cannon and a blackjack and he would still be a picnic compared to what I\'ve had to face.\"

Baer, ever the showman \"brought gales of laughter from the crowd with his antics\" the night he stepped between the ropes to meet Braddock. As Braddock \"slipped the blue bathrobe from his pink back, he was the sentimental favorite of a Bowl crowd of 30,000, most of whom had bet their money 8-to-1 against him.\" Max \"undoubtedly paid the penalty for underestimating his challenger beforehand and wasting too much time clowning.\" At the end of 15 \"dull, uninspired\" rounds during which \"Baer didn\'t throw 10 genuine punches of any sort\" and Braddock was described as \"a plodder\" the most \"colorless bout in a decade\" ended with Braddock emerging the victor, outpointing Baer 8 rounds to 6 in the \"most astounding upset since John L. Sullivan went down before the thrusts of Gentleman Jim Corbett back in the gay nineties.\" Braddock took heavy hits from Baer, but kept coming at Baer until he wore Max down. At the end of the bout, Max hugged and congratulated Jim, then the judges gave Braddock the title in a unanimous decision. When asked why he threw away the title, Max\'s response was matter of fact. \"\'No alibi,\'\" he said cheerfully. \"Jim fought a good fight and I hope he\'s more appreciative of the title than I was.\" The fight has since become a boxing legend.
 
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hast

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Obrigado pela correcção, fcporto56.
Penso, no entanto, que o Baer chegou a perder um combate por nocaut contra o Joe Louis, também em 1935. Li isto algures, não sei se está correcto.
Cumprimentos.
 

fcporto56

Tribuna Presidencial
26 Julho 2006
7,173
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Sacramento
Sim,sim,o Max Baer perdeu por KO um combate contra o Joe Louis, e o irmao dele o Buddy Baer foi derrotado por duas vezes pelo Joe Louis em combates para o titulo.
 
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1936 – Jogos Olímpicos de Berlim
Helen Stephens ganhou 100 metros e o Fuher ficou encantado

Hitler convidou americana para «ninho da águia»
A história criada em torno do abandono apressado de Hitler do Estádio Olímpico para não se sujeitar à «humilhação» de cumprimentar Jesse Owens, herói negro que nascia no berço do arianismo, não passa de lenda. Isso aconteceu com outro negro americano, Cornelius Johnson, vencedor do salto em altura, cuja final se realizou após os 10 mil metros e o lançamento do peso. O führer recebera no seu camarote os respectivos vencedores, o finlandês Ilmari Salminen e o alemão Hans Wolke, e ao aperceber-se de que teria de apertar a mão a Cornelius escapuliu-se, estrategicamente, da tribuna. No dia seguinte o New York Times anunciava em parangonas que o tirano se negara a felicitar americanos. O que também não é verdade. Hitler fez questão de chamar à tribuna a campeã dos 100 metros, Helen Stephens. Quando ela lá chegou, o führer, afivelando ar embevecido, depois da saudação nazi, levou carinhosamente a mão à zona jugular da americana, fixou nela os olhos em trejeito de sedução e, simulando um beijo no ouvido, murmurou-lhe: «É uma verdadeira ariana, aqui está o exemplo da beleza da raça.» Ela corou e desfez-se num sorriso incómodo. E o torcionário convidou-a a passar um fim-de-semana no seu ninho de águia — mansão no alto de um rochedo sobranceiro a Berchtesgaden. Os jornais polacos nos dias seguintes inundaram-se de artigos insinuando que Hitler se apaixonara por um... homem efeminado que corria muito! Parece que, por ordem do irritado ditador, os médicos alemães anunciaram sem demoras que não, Helen Stephens sujeitara-se por sua própria vontade a um teste de sexo para dissipar quaisquer dúvidas. Ironia cruel do destino: muitos anos depois a polaca Stanislawa Walasiewicz, que perdera em Berlim o título conquistado em Los Angeles, morreu, na sequência de um tiroteio — e durante a autópsia descobriu-se que era hermafrodita!

Jack Beresford – Ratinho de perna manca
Tinha um corpo de ratinho. Na I Guerra Mundial foi ferido por um estilhaço numa perna e por isso mancava ao de leve. Filho de Julius Beresford, vice-campeão olímpico de remo em 1912, Jack ganhou a medalha de prata em Antuérpia, batido por John Kelly, o pai de Grace do Mónaco, num dos duelos mais empolgantes da história do remo. Quatro anos depois, em Paris, conquistou o primeiro título olímpico de scull. Em 1928, nos Jogos de Amesterdão, arrecadou mais uma medalha de ouro na prova de quatro sem timoneiro. Mas o momento mágico foi em Berlim. Tinha 37 anos, conquistou a terceira medalha de ouro em scull de dois, remando com Dick Southwood — arrasando a favoritíssima equipa alemã, que levara, inclusivamente, Hitler à beira da água para «assistir de perto a mais uma vitória ariana». Não assistiu e saiu de lá furibundo. Para além das quatro medalhas olímpicas, Jack Jumbo Beresford tem marcadas na sua folha de serviço dez vitórias no Henly, cinco delas no Diamonds Sculls, que por esses tempos, no remo, tinham o valor e o prestígio das medalhas olímpicas.
Neozelandês Lovelock, o poeta das tácticas ousadas, teve morte trágica
Campeão dos 1500 metros caiu à linha do metro
Jack Lovelock, estudante de medicina de Rhodes, em Oxford, surgiu em Berlim já com estatuto de favorito para os 1500 metros. Apesar de Luigi Becalli estar lá para defender o ouro de Los Angeles. O neozelandês optou pela «táctica da fuga para a frente». Que explicava assim: «Um rival nunca conseguirá correr com outro às suas costas respirando sobre ele.» Tinha uma linguagem sempre poética no contacto com os jornalistas. Por vezes labiríntica, sibilina. Ao tiro lançou-se, de prego a fundo, para a frente, ninguém quis acompanhá-lo de perto, quando o americano Cunningham (3.48,4) e Becalli (3.49,2) estugaram o passo já era tarde — e Lovelock entrou fulgurante pelo fio de meta, o cronómetro parou em 3.47,8 minutos, record mundial. Precisou apenas de dez palavras para definir a proeza: «Foi a corrida mais perfeitamente executada de toda a minha carreira.» Só cinco anos depois o sueco Gunder Hagg o riscou da lista, por dois décimos, andava ele pelos campos massacrados da guerra. Salvou-se mas em 1949, com 39 anos de idade, a morte ceifou-o de forma cruel, estúpida. Era médico em Nova Iorque, estava de cama com um fortíssimo ataque de gripe, chamaram-no ao hospital, ele foi e tonto pela febre que lhe pusera o corpo todo a arder caiu à linha precisamente quando o metro passava.

Herói em tempo errado
Gunder Hagg
Foi um herói fora de tempo. Aproveitando o facto de a Suécia não ter entrado no conflito, os duelos entre Gunder Hagg e Arne Anderson fizeram história, encantaram milhares e milhares de espectadores que quase todos os fins-de-semana enchiam os estádios de Estocolmo e Gotemburgo. No Verão de 1942 o sueco venceu todas as 32 provas entre os 800 e os 5000 em que participou, batendo nove records mundiais em 82 dias apenas, façanha inigualada. A esses juntaria mais sete, nos 1500 metros, na milha, nos 2000 metros, nos 3000 metros, nas 2 milhas, nas 3 milhas e nos 5000 metros. Foi o primeiro homem a baixar dos 14 minutos na légua, com 13.58,2 minutos em 1942, máximo só lhe seria retirado por... Emil Zatopek, 12 anos depois, com 13.57,2. Quando os Jogos Olímpicos se retomaram, em Londres, já tinha 30 anos, preparava-se para o adeus às pistas. Sem uma medalha olímpica que funcionasse como cereja para a pontinha do bolo.

Suicídio de judeu na aldeia
O capitão Wolfgang Fuerstner, director da Aldeia Olímpica, era judeu. Em várias entrevistas afirmou que a sua carreira militar terminaria logo após os Jogos Olímpicos. Foi à cerimónia de encerramento, teve sempre os olhos orvalhados de lágrimas e quando o espectáculo terminou procurou lugar ermo e disparou um tiro à cabeça.

38 salas de jantar
O Estádio Olímpico era o que se destinara aos abortados Jogos de 1916, alargado e melhorado, rodeado por uma piscina que acomodava 18 mil espectadores, deslumbrantes ginásios. Aplicou-se a mais sofisticada tecnologia para cronometragem electrónica, 14 línguas foram usadas nos boletins, para facilitar a vida aos 3000 jornalistas em cobertura, a televisão entrou em cena com transmissões diárias de circuito fechado para as principais salas de espectáculos de Berlim e seus arrabaldes. A Aldeia Olímpica foi ainda mais magnificente que a de Los Angeles, só salas de jantar eram 38. As mulheres foram acomodadas numa área em volta do complexo do estádio.

Ramo de Oliveira de Spiridon para Hitler
Toda a cidade de Berlim aperaltada com centenas de bandeiras suásticas a drapejar. Nas ruas principais altifalantes com música bélica. Na cerimónia de abertura, a 1 de Agosto, 20 mil balões largados, polvilhando os céus de negro e vermelho. Um sino de 14 toneladas tocava Deutschland Über Alles. Pouco depois Hitler recebia das mãos de Spiridon Louis, vencedor da maratona olímpica de Atenas 40 anos antes, envergando o traje nacional da Grécia, um ramo de oliveira do Bosque Sagrado de Olímpia. A pira olímpica fora incendiada como na Antiguidade, através de raios solares, chegara numa emocionante estafeta de 3000 atletas.
 
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hast

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Vingança por ouro perdido ou por abraço a Jesse Owens?

Hitler mandou Lutz Long para frente da morte
As vitórias de Jesse Owens nos 100 e 200 metros dos Jogos Olímpicos de Berlim foram incontestáveis. Fulgurantes. Nos 4x100 metros a mesma história. Épico foi o duelo no salto em comprimento com o alemão (alto e loiro) Lutz Long. Uma multidão densa de paixão, contagiada pelas publícolas hitlerianas da raça superior, sonhava já com os minutos de loucura do braço estendido, no canto cavo do Deutschland Über Alles, a suástica em tremulina — Jesse Owens vergado pelo ariano. Até aos dois últimos ensaios a euforia esteve ao rubro. Mas, de súbito, o americano pulou e o painel marcou 7,94 metros, mais sete centímetros que o rival. O estádio emudeceu. E mais ainda quando, na última tentativa, Jesse se creditou de 8,06 metros, ultrapassando, pela segunda vez na vida, barreira considerada histórica. Era o fecho em glória. A ouro. Hitler e toda a sua entourage em profunda irritação. Insensíveis ao ambiente de exaltação racista que se criara, Owens e Long unem-se num comovido abraço e assim abandonam a pista! Anos mais tarde Jesse escreveria: «Poderia derreter todas as medalhas e troféus que ganhei e mesmo assim não seria capaz de cobrir a amizade de 24 quilates que senti por Lutz naquele momento.» Não teve tempo para a desenvolver e desfrutar. Porque Hitler (há quem jure que para se vingar da afronta por que o fizera passar...) decidiu enviar Long para uma das mais complicadas e mortíferas frentes de batalha da II Guerra Mundial, morrendo em combate, na Sicília, a 14 de Junho de 1943. Seis anos depois Owens foi de visita a Berlim e mal aterrou pediu que o levassem ao filho de Long. Encontraram-se e Jesse escreveu-lhe dedicatória numa fotografia em que apareciam os dois em galhofa, desatando ambos a chorar.

Judeus americanos afastados para quê?
A estafeta de 4x100 metros dos Estados Unidos incendiou controvérsia e deu mais pábulo a especulações. Inicialmente integrava dois judeus, Marty Glickman e Sam Stoller, mas à última hora os técnicos decidiram lançar à pista Jesse Owens e Ralph Metcalfe, os dois primeiros do hectómetro. Houve quem garantisse que o fizeram para dar um sinal de simpatia a Hitler mas parece que não — ao aperceberem-se do poderio da Alemanha jogaram no seguro. E assim Owens conquistou a quarta medalha de ouro. Nos 4x400 metros surpresa foi a derrota dos Estados Unidos ante a Grã-Bretanha.

Fulgor espalhado e perpetuado pelo mundo inteiro
Avenida de Berlim
Após a chegada de Berlim Jesse Owens tornou-se director de um clube de Cleveland, primeira de uma série de acções com crianças desfavorecidas de todas as raças. Mudou-se para Chicago e continuou a fazer o mesmo, a organização movimentava mais de 1500 jovens, dando-lhes desporto e cultura. Em 1955 o Departamento de Estado nomeou-o embaixador do desporto, andou dois anos pela Índia, Singapura, Malásia e Filipinas pregando a união dos povos através da cultura desportiva. No ano seguinte foi o representante pessoal do presidente Eisenhower nos Jogos Olímpicos da Austrália, trabalhando ainda como relações públicas e consultor de várias empresas. O governo da Costa do Marfim deu o seu nome à rua da embaixada dos Estados Unidos, em 1971 esteve lá na cerimónia de inauguração. Gerald Ford outorgar-lhe-ia a mais alta condecoração civil americana, a Medalha da Liberdade. Em 1982, já depois da sua morte, Berlim transformou o principal caminho de acesso ao Estádio Olímpico em Avenida Jesse Owens. E George Bush concedeu-lhe a título póstumo a Medalha de Ouro do Congresso.

Encanto do filme de leni
Magnífico o filme olímpico que Leni Riefenstahl fez dos Jogos de 1936. Empolgantes as imagens de Jesse Owens. As suas impressões captadas para a posteridade. Encolhido como uma pantera antes dos 8,06 metros do salto em comprimento. Sorrindo como uma criança depois do abraço de Lutz Long. Eléctrico, como se quisesse engolir nervosamente os lábios, antes da partida para as finais dos 100 e 200 metros, a cavalgada para os records olímpicos: 10,3 e 20,7 segundos. E o bulício indistinto das suas pernas parecendo asas quando passava pelo italiano Orazio Mariani a caminho da quarta medalha de ouro na estafeta — era velocidade, era beleza, era deslumbramento.

Atrasou-se na aldeia e foi buscar ouro às nuvens
Naoto Tajima evitou o pleno americano nos saltos. Ganhou o triplo com 16,00 metros, batendo o record mundial e quebrando barreira até então mítica, o compatriota Masao Harata foi segundo, com 15,66. E assim o ouro continuava no Japão. Desde 1928. Na altura Cornelius Johnson e Dave Albritton, que pouco antes da partida para a Alemanha tinham posto o record mundial em 2,07 metros, em Nova Iorque, acabaram em primeiro e segundo, Delos Thurber, igualmente dos Estados Unidos, conquistou o bronze. Cornelius atrasou-se a sair da Aldeia Olímpica, quando chegou ao estádio a fasquia já estava a 1,97 metros, record olímpico, não se atemorizou, passou bem acima e ainda se deu ao luxo de chegar a 2,03 metros e não saltar mais. A vara demorou 10 horas, foi preciso colocar-se projectores na zona de salto, a vitória sorriu, noite dentro já, ao americano Earle Meadows, que, com 4,35 metros, bateu os japoneses Nishida e Oe. Um ano depois o campeão olímpico colocaria o record mundial a 4,54 metros!

Fim do império britânico
Nos 400 metros mais um campeão olímpico negro: Archie Williams, que, com 46,5 segundos, bateu claramente o britânico Arthur Brown. Ponto final na série de vitórias britânicas nos 800 metros, através de John Woodruff. O canadiano Phil Edwards, igualmente negro, conquistou a terceira medalha de bronze ao classificar-se em terceiro lugar nos 1500 metros. Quatro anos antes fizera o mesmo nos 800 e 1500 metros.
 
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Calos, enjoos no barco e acidente de equídeo à partida

Cavalos de bronze
A viagem dos portugueses para Berlim foi de barco. Nos primeiros dias os esgrimistas Mascarenhas de Meneses e Veiga Ventura não descansaram com os enjoos no mar alto mas a grande preocupação era um cavalo. O Silvain, de Mena e Silva, sofrera «uma congestão nos rins e quebra de um osso das ancas por trambolhão na altura do embarque». Não pôde saltar, a sorte foi José Beltrão levar dois equídeos, competiria com o lendário Faussette e cederia o Biscuit a Mena e Silva. Manuel Dias ficou, entretanto, com os «pés doentes», caiu-lhe uma unha, tinha «um calo doloroso entre o dedo mínimo e o anelar». E Jaime Mendes, o outro maratonista, «levava um joelho amachucado». Tudo isto se poderia ler na revista Stadium. Não, afinal o horizonte não estava tão escurentado como poderia parecer. E, mesmo com o Silvain de baixa, Portugal conquistou medalha de bronze no Grande Prémio das Nações, atrás de Alemanha e Holanda. Individualmente José Beltrão foi sexto, o marquês do Funchal 16.º e Mena e Silva 21.º O capitão Beltrão haveria de dizer depois: «Apesar do caprichoso percurso a prova foi brilhantemente ganha pelos oficiais alemães, que tiveram imedia-tamente como prémio ser promovidos. Não vale a pena falar dos problemas do Silvain, o sport é isto mesmo, faz-se de contingências... Por exemplo, na competição de alta escola vi trabalhos de perfeição, bem feitos, mas com pouco brilho, graça e arte. Eu, que estava habituado a ver o Imaculado do coronel Jara ou o Baudelaire de D. José Manuel da Cunha Meneses, não tenho dúvidas de que se estivessem em Berlim teriam trazido para Portugal as primeiras classificações. Manuel Dias se tivesse corrido a maratona bem calçado teria feito o mesmo... »

Manuel Dias acabou maratona com botas da tropa
Manuel Dias foi intérprete de episódio rocambolesco. E assim deu a Portugal mais uma das fadistas vitórias morais... Até aos 20 quilómetros Manuel Dias — vendedor de jornais que algum tempo depois ganharia a sorte grande na lotaria por se ter esquecido de entregar bilhete não vendido na Misericórdia e com esse dinheiro ajudaria a fundar o jornal Record — manteve-se largo tempo na segunda posição. Resolvera correr com sapatos de pelica, como os de boxe, para se sentir mais leve, mas o alcatrão das estradas depressa lhe desfez a sola e aos 26 quilómetros, já com os pés em sangue, deitou-se à berma a chorar, um membro da Juventude Hitleriana descalçou as suas botas cardadas, deu-lhas para que continuasse e mesmo assim chegou ao fim em 17.º lugar, com 2.49 horas.

Desconcertantes segredos de Manuel Dias na aventura olímpica
Mala de pedras e bailarinas
Mal chegou à aldeia, Manuel Dias foi tratar do calo. Jaime Mendes, o outro maratonista, continuava ensarilhado em dores num joelho. Mesmo machucado alinhou à partida. E desistiu. Dias não. Lançou-se, ousado, na perseguição do argentino Zabala, que defendia o título de Los Angeles, assim andaria mais de metade da prova, só cedeu quando as sapatilhas o traíram. Desconcertante foi o modo como se treinou durante toda a estada na Alemanha e que à chegada contaria na revista Stadium: «Levantava-me às seis da manhã e fazia treino de hora e meia. Depois tomava banho e era massajado. Seguidamente agarrava numa mala de tamanho médio, cheia de pedras, punha-a às costas e andava assim de um lado para o outro. Compensava a ausência da mala de jornais, que todos os dias carrego em Lisboa e é o melhor treino para ganhar endurance. Pesava 30 quilos e só a largava à noite. Como calcula, espantava os outros habitantes da aldeia, que ao verem-me de mala às costas todos os dias julgavam que dera em louco. À noite deitava-me, nunca passei pelos divertimentos, havia lá na aldeia de tudo, cinema, variedades, com bailarinas até... Mas tinha muito medo do fumo. E tinha o nome de Portugal para defender...»

Saga de Jesse Owens
Quatro bombas de ouro
Há heróis assim. Os anos foram passando e a estória ganhando os contornos do mito na vertigem com que ele se criou: que quando Adolf Hitler se apercebeu de que teria de apertar a mão a Jesse Owens, descendente de escravos, mascavou um urro, desviou, descabelado, a cabeça — e zarpou da tribuna de honra do Estádio Olímpico. Não é verdade, o torcionário fugiu de Cornelius Johnson, vencedor do salto em altura, e teve o cuidado de não estar no estádio sempre que Owens se lançasse na caça ao ouro. Mas, apesar da pequenina perversão da história, de um facto não há contestação: aquele negro de Alabama espezinhava no seu próprio berço a teoria da superioridade da raça ariana com quatro supremas medalhas nos Jogos Olímpicos de Berlim. Tornava-se o seu herói. E um dos desportistas do século. Apesar de, aos 23 anos, a hipocrisia do amador puro lhe ter cortado a hipótese de continuar a encantar o Mundo com o fulgor das suas pernas — que eram asas porque ele encarava a pista como um campo de carvão a arder.

Quatro «records» mundiais numa hora!
Antes de Berlim Jesse Owens entrara já para a história por façanha fantástica, inigualável. Num único dia estebeleceu seis records mundiais de atletismo. Era o dia 25 de Maio de 1935. Em Ann Arbor. Nos campeonatos da Big Ten, competição universitária. Acordara com dores nas costas, estivera mesmo para não ir à pista, foi — e nunca mais se haveria de ver fulgor assim. Às 15.15 correu as 100 jardas em 9,4 segundos, dez minutos volvidos saltou 8,13 metros no salto em comprimento. Às 15.45 correu as 220 jardas em 20,3 segundos — e na passagem pelos 200 metros estoirou mais um máximo mundial. Minutos adiante, 22,6 segundos nas 220 jardas com barreiras e, igualmente à passagem pelos 200 metros, o último dos records do Mundo no espaço de uma hora só. Nesse dia, com 8,13 metros quebrou a barreira psicológica do salto em comprimento, só em 1960 alguém iria para além de si: Raplh Bosto voou e aterrou nos 8,21 metros.
 
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hast

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Owens considerado profissional por recusar ficar mais tempo na Europa

Lenda de Hitler para ganhar dinheiro
Depois dos Jogos de Berlim Jesse Owens ainda participou numa série de meetings europeus mas, logo depois, a AAU retirou-lhe o estatuto de amador como vingança por se ter recusado a continuar na Europa, em tournée exibicional — sentia-se cansado, queria regressar a casa, repousar da glória que o transformara no mais badalado desportista daqueles quentes anos. Incontornável o seu efeito magnético. O homem já para além da lenda. E sempre o mesmo jeito modesto quando moles frementes, gritando-lhe o nome, lhe pediam autógrafos, lhe falavam da humilhação de Hitler. Depois de um sorriso tímido, a confidência saltava: «Não, não foi por minha causa que o Führer deixou o estádio olímpico envergonhadamente, foi para não cumprimentar Cornelius Johnson. Eu ainda não tinha ganho medalha alguma.» Ninguém acreditava, retorquiam-lhe que se deixasse de tão larga modéstia. Desconcertava-se. «Não valia a pena negar, era já o mito, por isso decidi dar-lhe ainda mais fogo, aproveitar-me disso para ganhar dinheiro.» O primeiro que juntou foi para oferecer uma «casa decente» aos pais, descendentes de escravos dos brancos campos de algodão do Sul.

Roosevelt também nâo quis apertar-lhe a mão!
Apesar de ter sido a figura emblemática de Berlim, de ter conquistado quatro medalhas de ouro no atletismo, proeza que só Carl Lewis repetiria em 1982, em Los Angeles, nesse ano de 1936 Owens não teve (estranhamente) direito ao Troféu Sullivan, que nos Estados Unidos distingue, anualmente, o melhor atleta amador. O prémio coube a Glenn Morris, decatlonista branco que batera o record mundial e ganhara a medalha de ouro nos Jogos Olímpicos. Mais escandaloso foi o facto de Owens nem sequer ser convidado para cerimónia de homenagem à selecção olímpica que o presidente Roosevelt prestou na Casa Branca, com pompa e circunstância, no regresso da Alemanha. Foi mágoa que se lhe coalhou no peito vida fora. Até que desabafou: «Hitler pode ter arranjado uma artimanha qualquer para não me apertar a mão mas nunca me esquecerei de que o presidente dos Estados Unidos nem sequer me chamou ao seu palácio, apesar de o mundo inteiro falar de mim como o homem de 36.» Não foi só. Por essa altura Jesse Owens foi barrado à porta do luxuoso hotel Waldorf-Astoria por ser negro. Só lá fora porque nessa noite um grupo de jornalistas fizera jantar em sua honra.

Apesar de não se envolver em política não deixou de ser vítima do sistema
Corridas para cães e cavalos para pagar impostos
O seu lema era: «Se praticares o bem ele despontará também para ti.» Viveu sempre assim. Era isso que lhe dava forma de ânimo para enfrentar algumas injustiças mais torpes. Jesse Owens nunca procurou confrontos de ordem política, como mais tarde aconteceria com Muhammad Ali, Jackie Robinson ou Tommie Smith, o líder martirizado do Black Power. Depois de se ter afastado das competições oficiais de atletismo, quando o seu fulgor estava ainda a incendiar-se apenas, teve de procurar outras formas de ganhar dinheiro, correndo contra cavalos ou galgos de raça — e ganhando sempre, era a sua sina. Seria acusado duas vezes de evasão fiscal, montara um clube nocturno e um ginásio de luxo em Chicago, perante a iminência da carga do fisco decretou a bancarrota, salvou-se assim de parte da dívida. «A outra parte foi financiada com mais meia dúzia de corridas contra animais, havia alguns cínicos, alguns hipócritas, que insinuavam que era indigno um campeão olímpico andar metido em duelos assim com cães ou com cavalos mas dava dinheiro, não queria voltar a andar de mão estendida ou bolsos vazios. Tinha alguns prazeres para pagar, como por exemplo comprar um automóvel novo todos os anos.»

Vício mortal do cigarro
Jesse Owens afirmou sempre que aquelas medalhas de ouro Berlim o foram mantendo vivo pelo tempo fora — sobretudo quando as horas eram de angústia, quando a doença já o minara, o cancro de pulmão o arrastava, fulminante, para a morte. «Os tempos continuam tranquilos para mim, aqueles momentos dourados são difíceis de morrer, mesmo depois de eu morrer, mesmo depois de muitos e muitos anos de eu morrer. Aquela semana deu-me a imortalidade que qualquer homem gostaria de ter», clamou um dia. Fumava mais de um maço de cigarros por dia, era vício a que não conseguia resistir, faleceu a 31 de Março de 1980 na pequena cidade de Tucson (Arizona).

Descoberto num «sprint» em rua de bairro pobre
Venda de gasolina e elevador à noite
Nascido a 12 de Setembro de 1923 em Oakville, estado do Alabama, tomou o nome de James Cleveland Owens. Passou a infância infernizado por ataques de bronquite crónica, esteve, inclusivamente, algumas semanas internado num hospital, com pneumonia. Nos primeiros anos da década de 20 a família partiu para Cleveland, no Ohio, o pai levava a ânsia de encontrar trabalho mais bem remunerado numa das fábricas que se fundaram a seguir ao boom do pós-guerra. Tinha oito irmãos, foi estudar para o liceu de Fairmount. A professora perguntou-lhe o nome e ele, na pronúncia arrevesada do Sul, disse «JC», iniciais de James Cleveland. Ela percebeu Jesse. Registou-o como tal. E Jesse ficou. Para a eternidade. Foi então que conheceu Charles Riley, ex-atleta olímpico, que era treinador de um boy club lançado em torno dos bairros pobres da cidade. Riley andava por lá, dissimulado, farejando talentos. Apercebeu-se de Jesse correndo na rua como um foguete. Cronometrou, escondido, um sprint — e ficou embasbacado a olhar para o cronómetro. Abeirou-se dele, pediu-lhe que o acompanhasse à pista de atletismo, era a confirmação. Estava ali um filho do vento. Logo nesse ano de 1928 bateu todos os records colegiais dos Estados Unidos, na velocidade, no comprimento e até no salto em altura. Não perdeu uma única competição ao longo de três anos de campeonatos escolares. Cobiçado por diversas universidades, escolheu a Ohio State University; os directores não lhe deram bolsa de estudo como a outros campeões, por isso, para se sustentar e à mulher durante o curso de relações públicas, trabalhou como ascensorista nocturno de hotel, empregado de bomba de gasolina e catalogador de biblioteca.

Pista como fogão!
Uma vez, quando lhe perguntaram porque utilizava aquele estilo a correr, como se flutuasse na pista, voasse nas asas do vento, os pés na aparência vertiginosa de quase nem tocarem no chão, Jesse Owens respondeu com uma piada que entraria para a história como o seu cliché dourado: «Para mim a pista era como um fogão quente e corria de forma a não me queimar!»
 

fcporto56

Tribuna Presidencial
26 Julho 2006
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Sacramento
> hast Comentou:


Roosevelt também nâo quis apertar-lhe a mão!
Apesar de ter sido a figura emblemática de Berlim, de ter conquistado quatro medalhas de ouro no atletismo, proeza que só Carl Lewis repetiria em 1982, em Los Angeles, nesse ano de 1936 Owens não teve (estranhamente) direito ao Troféu Sullivan, que nos Estados Unidos distingue, anualmente, o melhor atleta amador. O prémio coube a Glenn Morris, decatlonista branco que batera o record mundial e ganhara a medalha de ouro nos Jogos Olímpicos. Mais escandaloso foi o facto de Owens nem sequer ser convidado para cerimónia de homenagem à selecção olímpica que o presidente Roosevelt prestou na Casa Branca, com pompa e circunstância, no regresso da Alemanha. Foi mágoa que se lhe coalhou no peito vida fora. Até que desabafou: «Hitler pode ter arranjado uma artimanha qualquer para não me apertar a mão mas nunca me esquecerei de que o presidente dos Estados Unidos nem sequer me chamou ao seu palácio, apesar de o mundo inteiro falar de mim como o homem de 36.» Não foi só. Por essa altura Jesse Owens foi barrado à porta do luxuoso hotel Waldorf-Astoria por ser negro. Só lá fora porque nessa noite um grupo de jornalistas fizera jantar em sua honra.

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Infelizmente este tipo de historias sao escondidas por estes lados.Alias a varias historias bastante graves sobre o Franklin Roosevelt que sao so faladas em tom de segredo.Seja la como for o Jesse Owens nunca sera esquecido.
 
H

hast

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Na final dos 110 metros barreiras mais uma impressionante manifestação de racismo

Queda de negro, urros e chacota
As duas corridas de barreiras foram ganhas por americanos. Os 110 metros por Forrest Towns, em 14,2 segundos, adiante de Don Finlay, medalha de bronze em Los Angeles e que continuaria suficientemente bom para em 1949 ainda se sagrar campeão britânico. O negro Fritz Pollard liderou até à última barreira, desequilibrou-se e foi parar ao terceiro lugar — e os nazis das bancadas abriram-se em estúpida risota, levantaram-se em urros em mais uma impressionante manifestação de racismo. Glenn Hardin, medalha de bronze nos Jogos anteriores, conquistou, enfim, o ouro nos 400 metros barreiras, com 52,4 segundos, claramente à frente do canadiano John Loaning (52,7) e do filipino Miguel White (52,8).

Valla sem barreiras
Nas provas femininas do atletismo Helen Stephens, americana de 18 anos que encantou Hitler, juntou à medalha de ouro dos 100 metros a dos 4x100. Na estafeta favoritas eram as alemães mas, deixando cair o testemunho, ficaram fora do pódio, até. A Itália ganhou a primeira medalha de ouro através de Trebisonda Valla nos 80 metros barreiras, que com 11,6 segundos igualou o record do Mundo. A húngara Ibolya Csak ganhou o salto em altura, com 1,60 metros, mesma marca que a colegial inglesa de 16 anos Dorothy Odam alcançou. Doze anos depois, já casada, competindo como Odam-Tyler, voltaria a ganhar a medalha de prata — e pelo caminho ainda bateu o record mundial de Babe Didrikson, pulando 1,69 metros. Foi sempre no desempate que Dorothy perdeu o ouro, que ganharia em ambos os casos se as regras fossem as actuais. Tornou-se assim a campeã do infortúnio...

Mais Finlândia e coreano tiranizado
No fundo voltou a notar-se o poderio da Finlândia. Gunnar Hoeckert ganhou a légua a Lauri Lehtinen, o campeão de Los Angeles, em 14.22,2 minutos. Nos 10 mil metros o pódio foi todo finlandês, Ilmari Salminen (30.15,4) bateu Arvo Askola (30.15,6) e Volmari Iso-Hollo (30.20,2). Iso-Hollo repetiu a vitória de 32 nos 3000 metros obstáculos (9.03,8), o segundo, Karlo Tuominen, também era finlandês. Na maratona medalha de ouro para Kitei Son, que aparece nos anais como japonês mas era coreano, a Coreia estava já sob domínio tirânico de Tóquio.

Domínio alemão nos lançamentos
Força nazi
Os alemães conquistaram três das quatro medalhas nas provas de lançamento. Gerhard Stoeck, com 71,48 metros, bateu os finlandeses Nikkanen e Toivonen e tornou-se o primeiro não escandinavo a vencer o dardo em Jogos Olímpicos. Hans Woellke, que foi o primeiro alemão medalhado com ouro olímpico, venceu o peso com 16,20 metros. O americano John Jack Torrance, que dois anos antes colocara o máximo mundial em inimagináveis 17,40 metros — record que duraria até 1948 —, nem sequer chegou ao pódio.

Cavalo chamado «Nurmi»
Burburinho nas provas de hipismo os estrangeiros quase em bloco consideraram demasiado severo o percurso e os três dias de competição, houve cavalos que desfaleceram de cansaço, quedas aparatosas — e a consagração de um herói, Ludwig Stubbendorf, capitão do exército nazi, que se sagrou vencedor do concurso completo com um cavalo chamado... Nurmi, como o Paavo finlandês, em sua honra, num tributo premonitório à sua glória.

Outro Tarzan mais atleta que Jesse
Glenn Morris, um dos campeões olímpicos que haveriam de se afamar no cinema como... Tarzan, ganhou o decatlo, com 7900 pontos, record mundial durante 14 anos, estilhaçado apenas por Bob Mathias, em Agosto de 1950, com 8042 pontos! Uma façanha fantástica que lhe valeu o título de Atleta do Ano nos Estados Unidos apesar das quatro medalhas de ouro de Jesse Owens.

Alemã com três medalhas de ouro na natação
Hendrika quase Owens
Na natação os japoneses ganharam 10 das 17 medalhas em disputa mas a surpresa maior foi o húngaro Ferenc Czic, que venceu os 100 metros livres em 57,6 minutos. Jack Medica, casado com a figura maior de Los Angeles, Helene Madinson, tatuou-se de ouro nos 400 metros livres. Adolf Kiefer evitou a festa nipónica nos 100 metros costas, pelo que apenas Noboru Terada, nos 1500 metros, e Tetsuo Hamuro, nos 200 metros bruços, regressaram dourados ao Japão. A estrela das piscinas foi uma adolescente alemã, Hendrika Mastenbrock, que ganhou três medalhas de ouro, nos 100, 400 e 4x100 metros — e ainda uma de prata nos 100 metros costas, atrás da compatriota Dina Senff.

89 medalhas para a Alemanha
A Alemanha arrecadou o maior número de medalhas, 33 de ouro, 26 de prata, 30 de bronze — adiante dos Estados Unidos (24+20+12). A Hungria conseguiu surpreendente terceiro lugar no medalheiro, com 10 medalhas de ouro, uma de prata e cinco de bronze, à frente da Itália (8+9+5) e da Finlândia (7+6+6).

Bolsos cheios de ouro
Dois alemães, Alfred Schwarzmann e Konrad Frey, dominaram a ginástica, cada um ganhando três medalhas de ouro. Frey arrecadou também uma de prata e duas de bronze — foi o mais medalhado de Berlim. Schwarzmann, vencedor do concurso individual, creditou-se de mais duas medalhas de bronze. Nas senhoras continuou sem se fazer competições individuais, a medalha de ouro no concurso completo coube às alemãs.

Peru à italiana
Nos jogos colectivos a Índia humilhou a Alemanha na final do hóquei em campo, ganhando por 39-1! No futebol medalha de ouro para a Itália, bronze para a Áustria. O Peru, que se apurara surpreendentemente para a final, foi desqualificado por os seus dirigentes se recusarem a repetir o jogo que tinham vencido contra os austríacos quando se descobriu que tinham usado ilegalmente um suplente. O andebol estreou-se nos Jogos e a vitória coube à Alemanha. O basquetebol consagrou os Estados Unidos. E o pólo a Argentina.
 
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hast

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1936 – Sporting campeão de Portugal
«Leões» andaram à caça pelo Brasil mas bicho-do-mato estava no Barreiro
Saudação fascista, Azevedo e actriz brasileira
Na época de 1935/36 o Belenenses voltou a ser finalista do Campeonato de Portugal depois de eliminar, sucessivamente Leixões (7-0 e 0-1); F. C. Porto (1-1, 0-0 e 1-0) e Benfica (2-2 e 2-1). O Sporting, batendo, pela mesma ordem na marcha da prova, Salgueiros (2-1 e 4-0), Carcavelinhos (1-0 e 2-1) e Marítimo (4-2 e 5-1), chegou à final só com triunfos e com o score de 18-6. Mas apesar de voltar a contar com o marechal Carmona nas bancadas do estádio do Lumiar — que não deixaria sequer de confidenciar que gostou imenso de ver os jogadores de braço estendido a fazer-lhe saudação fascista — o ambiente esteve longe de ser apaixonante. O Sporting somou a terceira vitória na competição, batendo o almirantado da cruz de Cristo por 3-1. Faustino marcou o primeiro ponto, aos 12 minutos; no último quarto de hora, o Belenenses empatou, com um golo de Rafael; à meia hora do segundo tempo surgiu o desempate, com um tento de Pedro Pireza que despertou uma onda desvairada de protestos, tudo se arranjaria de novo e, aos 41 minutos, outra vez Pireza a fechar a contagem. Nessa época o Sporting tentara o reforço por via do Brasil, contratando o avançado Fernando, o defesa Vianinha e o guarda-redes Jaguaré. Os três foram apresentados em desafio com o Vitória, sendo o pontapé de saída dado simbolicamente pela actriz brasileira Lídia Silva. Apenas Vianinha se imporia. Jaguaré foi até ultrapassado na luta pela baliza por um jovem de 20 anos que aparecera no Lumiar, chamado... João Azevedo. E assim foi ele quem jogou contra o Belenenses. Como se tornaria seu jeito, entrou em campo a arrastar os pés, dando a ideia de uma insolência que chegava a irritar. Mas depois, na baliza, quase sempre de boné na cabeça, crescia, voava, defendia o... indefensável. Antes de ingressar no Sporting, vindo dos infantis do Barreirense, fora fazer um treino ao Benfica, nas Amoreiras, Vítor Gonçalves, o treinador, gostou dele mas não percebeu o feitio do génio que despontava: «Pedi-lhe dinheiro para as passagens, ele disse-me para ir receber à sede, não gostei do modo das palavras e nunca mais lá voltei.» Tinha fama de rezingão, de bicho-do-mato — e esse foi apenas o ponto de partida para uma carreira verdadeiramente fantástica de leão ao peito. Campeão de Portugal voltaria a ser em 1937/38, somando ao palmarès mais sete títulos de campeão nacional da I Divisão (entre 1941 e 1952) e quatro Taças de Portugal (entre 1941 e 1948).
Campeões de Portugal
João Azevedo, João Jurado, Vianinha, Correia, Rui Araújo, Faustino, Abrantes Mendes, Pedro Pireza, Manuel Soeiro, Adolfo Mourão e Francisco Lopes

FC Porto campeão de Portugal de 1937 depois de vários massacres
Mão malvada de Jurado
O treinador do Sporting era já Joseph Szabo. Os leões estavam pela quinta vez consecutiva na final, depois de eliminarem o Olhanense (7-2 e 6-2), o Carcavelinhos (3-0 e 3-1) e o Benfica (2-3 e 4-2). Do outro lado o F. C. Porto, que afastara o Leixões (5-2 e 5-0), o Boavista (5-2 e 6-1) e o Belenenses (0-1 e 4-0). Para os portistas esse era jogo que valia sobretudo para restaurar o prestígio seriamente abalado pelo Campeonato da Liga e havia uma outra conta a ajustar: os leões tinham-lhes ganho, pouco antes, por 9-1, com o Benfica a derrota não fora tão copiosa mas mesmo assim humilhava: 6-0. Treinador do F. C. Porto era o húngaro Gutskas, médico de formação, função que em campo juntava, orgulhosamente, à de técnico. A vitória no Campeonato de Portugal salvou-lhe a cabeça. A sua sorte foi a mão de Jurado. Uma vez mais o jogo foi no desaparecido e acanhado Campo do Arnado, em Coimbra. A FPF gastou 25 contos em melhoramentos e acrescento de bancadas (que os finalistas comparticipariam com 1500 escudos cada), mas seria quase debalde — já que os milhares de espectadores mais pareciam estar colocados em boleto, apinhados uns nos outros. Pelos portistas jogou o brasileiro Vianinha, que um ano antes se sagrara campeão pelo Sporting, pela «carta de desobriga» se pagara 21 contos. E Valdemar Mota andara, dias antes, em filmagens para O Trevo das Quatro Folhas, contracenando com Beatriz Costa, que daí em diante se viu várias vezes em jogos do F. C. Porto, de braço dado com Valdemar, que no filme fizera papel (secundário) de galã e adorara. Ao intervalo as duas equipas estavam empatadas, com um ponto de Lopes Carneiro e outro de Heitor — o do F. C. Porto quase no princípio do encontro, o outro depois da meia hora. Os portistas passaram, no segundo tempo, a 2-1 e 3-1, com tentos de Carlos Nunes e Vianinha — este na marcação de grande penalidade verdadeiramente caricata. Francisco Reboredo manobrou a bola com a mão, num ápice João Jurado segurou-a fazendo menção de cobrar castigo mas o árbitro, solícito, impôs o penalty — porque não vira falta antes! O Sporting forçou depois o ataque, não foi, no entanto, além de uma bola obtida por Pedro Pireza. Os dirigentes leoninos protestaram o jogo, quiseram imolar o árbitro Santos Palma como bode expiatório mas não passou disso. Os portistas foram recebidos na cidade em apoteose como nunca se vira! Da Estação de São Bento à sede do clube, em carros ornamentados com bandeiras azuis tremulando ao vento e coroas de flores, os portistas foram apoteoticamente aclamados — como nunca se vira! E já ninguém se lembrava das cruciantes goleadas do Sporting e do Benfica e da mascarra em que se transformou o Campeonato da Liga. Para o F. C. Porto era o quarto título de campeão de Portugal. Só o Sporting chegaria a tanto.

Campeões de Portugal
Soares dos Reis, Ernesto dos Santos, Vianinha, Anjos, Carlos Pereira, Francisco Ferreira, Lopes Carneiro, António Santos, Francisco Reboredo, Pinga e Carlos Nunes
 
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hast

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> ...Valdemar Mota andara, dias antes, em filmagens para O Trevo das Quatro Folhas, contracenando com Beatriz Costa, que daí em diante se viu várias vezes em jogos do F. C. Porto, de braço dado com Valdemar, que no filme fizera papel (secundário) de galã e adorara.

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E esta hein? Com que então galã de cinema!
 
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1933 – Belenenses campeão de Portugal

Filipe Santos agrediu dirigente e FC porto bateu Benfica por 8-0
Goleadas arrepiantes
Terrível foi o ano de 1932 para o Sporting. Depois de já ter vencido no Campo Grande por 2-0, o Belenenses bateu os sportinguistas por 9-0! Nervos em franja, impaciências aguçadas e Filipe dos Santos, o treinador, após longa altercação, agrediu um director, foi despedido e até se convocou Assembleia Geral para riscá-lo de sócio. Era técnico leonino desde 1927, o afastamento acabou por ter efeito histórico: foi contratado pelo Saragoça a conselho do famoso árbitro Pedro Escartin, correspondente de A BOLA em Madrid — e por via disso Joaquim Filipe dos Santos, que como jogador fora campeão de Portugal em 1923, tornou-se o primeiro português a treinar clube estrangeiro. Para o seu lugar o Sporting contratou o louro Arthur John, que já lançara o Vitória de Setúbal para a ribalta. Os treinos começavam às sete da manhã (!), se preciso fosse John também fazia papel de massagista e enfermeiro. E assim galgou o Sporting para a final do Campeonato de Portugal de 1933. Épico seria, no entanto, o jogo das meias com o F. C. Porto, em Coimbra, depois de dois empates. O F. C. Porto abriu o activo por intermédio de Pinga, na segunda parte os sportinguistas deram a volta ao jogo, vencendo por 3-1. O desafio descambou para a violência, baseados nisso e em «vários erros do árbitro» os nortenhos protestaram, os jornais de Lisboa consideraram no mínimo o «protesto extravagante», a FPF lançou-o discretamente para o cesto dos papéis. No turno anterior os portistas tinham ganho ao Benfica, no Ameal, por 8-0 (!), os lisboetas redimiram-se nas Amoreiras, vencendo por 4-2, esses dois desafios já se tinham esmaltado de incidentes, de que resultaram rios de tinta em inquéritos, diatribes, lutas jornalísticas, suspensões de jogadores (em alguns casos pagando os justos pelos pecadores) e no consequente esfriar de entendimento entre os centros mais importantes e mais influentes do desporto nacional.

Belenenses bateu Sporting por 3-1 e nas bilheteiras houve fartura de notas
Marechal Carmona e muito dinheiro
Grandiosa a final de 1933. A 2 de Julho, no Estádio do Lumiar. Vinte e cinco mil pessoas, transbordando a lotação do recinto, marechal Carmona na tribuna. Como Ribeiro dos Reis sublinhou: «Um espectáculo até então só semelhante em dias de jogos internacionais mas nunca registado em partidas nacionais, coisa nunca vista.» O Belenenses estagiara em Sintra, o Sporting na Malveira. Era novidade imposta por Rodolf Jeny, jogador-treinador húngaro, que logo avisou a Direcção de que não jogaria por considerar indigno que um estrangeiro actuasse na final de um Campeonato de Portugal! Artur Dyson, guarda-redes que já fora campeão pelo Benfica em 1930, lamentava-se nos jornais da véspera da «prisão em que tinham sido postos». Para além de «longos passeios pelos pinhais», a maior parte do tempo era gasto em jogos de cartas, sobretudo o burro americano. O que para Dyson era «vício que só servia para enfraquecer o cérebro e as algibeiras». O espectáculo dado pelos avançados do Sporting no primeiro tempo tornou aceitável (quiçá acanhada) a vantagem cifrada num golo marcado a 12 minutos do intervalo por Abrantes Mendes. Este tento foi lembrado durante algum tempo, entre tertúlias de gente da bola, porque o marcador muito gritou para que lhe passassem e os colegas sem lhe ligarem nenhuma, até os defesas se esqueceram de si, a bola foi lá parar num balão e deu no que deu. A segunda parte começou com o Belenenses a jogar com mais rapidez, sete minutos volvidos igualdade por uma passagem de José Luís a Rodolfo. Os homens da cruz de Cristo empolgaram-se, à meia hora o desempate. Foi também Rodolfo o autor do tento. Replicaram os sportinguistas, o empate por um fio, mas foi o Belensenses que marcou, por José Luís, quando faltavam três minutos para o termo dos 90 minutos. O sucesso de bilheteira foi tal que, depois de fechadas as contas, Sporting e Belenenses tiveram, cada qual, direito a 25.848$65 de benefícios. Durante toda a época o futebol leonino gastara 135 contos. O Belenenses um pouco menos.

Campeões de Portugal
Morais, José Simões, João Belo, Joaquim Almeida, Rodrigues Alves, César de Matos, Alfredo Ramos, Heitor Nogueira, Rodolfo Faroleiro, Bernardo Soares e José Luís
 
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hast

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1938 – Sporting campeão de Portugal

Treinador mágico lançou palavras de medo por causa das meninas
Peyroteo, Szabo e palestra da «tornera»
Fernando Peyroteo estivera um ano antes na final do Campeonato de Portugal. Acabara de assinar contrato, fora como convidado assistir ao jogo. Chorou com a derrota, no Arnado. Um ano depois o Sporting, já contando consigo, rubricava a sexta presença consecutiva, um espantoso record. O Benfica, que treinado por Ribeiro dos Reis se sagrara tricampeão da Liga, afastara o F. C. Porto, depois de derrota por 2-4 no Ameal, 7-0 nas Amoreiras — sonhava com a dobradinha mas mesmo assim aceitou jogar no Lumiar. Poucos dias antes do duelo Szabo, que já ganhara o Campeonato de Portugal pelo F. C. Porto em 1931/32 e em 1936/37, teve uma das suas mais famosas e desconcertantes palestras: «Silêncio, sinhores, ouvirem com atenção: sexta-feira banho quente e massagem. Sábado dê tarde, na sede, têoria-táctica dê jogo sobre tabuleiro com bonecas e mais importante, sinhores, ficharem tornera dê nênomos, dê mininas, fazer mal, precisar canetas para jogo.» E quando, entre gargalhadas, Pireza, que, nos treinos de footing no Campo Grande conseguia esconder-se e fumar até um cigarrinho, lhe disse que quem tivesse mulher em casa não poderia correr riscos assim, Szabo retorquiu, imprecante: «Fazer este: chigar casa quinta-feira para jantare dizer sua mulier quê sopa estar uma sucata, arranjar-se discussão, fazer zaragata, ir deitar, voltar para o lado e só fazer pazes segunda-feira, porque Benfica é perigoso, muito perigoso.» Se os pupilos cumpriram ou não a regra sagrada da abstinência ninguém saberá. O que se sabe é que o Sporting ganhou a edição canto-de-cisne do Campeonato de Portugal, batendo o Benfica por 3-1. Ao intervalo os leões ganhavam já por 2-0, com pontos de Mourão e Manuel Soeiro. O Benfica melhorou no segundo tempo mas às suas investidas replicaram os sportinguistas em contra-ataques venenosos, Soeiro bisou em lance assim, os benfiquistas só reduziriam por intermédio de Valadas, na cobrança de uma grande penalidade provocada por Aníbal Paciência. O Sporting igualava assim o F. C. Porto em números de títulos — quatro. O Belenenses e o Benfica conquistariam três, Olhanense, Marítimo e Carcavelinhos apenas um.

Campeões de Portugal
Adolfo Mourão, João Jurado, Manuel Soeiro, Rui Araújo, João Azevedo, Joaquim Serrano, Pedro Pireza, Aníbal Paciência, Fernando Peyroteo, João Cruz e Manuel Marques

Don budge, primeiro tenista a ganhar grand slam
Hitler abriu prisão
Don Budge foi o primeiro tenista a ganhar o Grand Slam. Em 1937 ganhou os três títulos de Wimbledon: singulares, pares (com Mako) e pares mistos (com Alice Marble). No campeonato americano voltou a ganhar com Marble o título de pares mistos. O New York Times declarou que a vitória sobre o barão Von Gramm na Taça Davis, a 20 de Julho de 1937, ficaria para sempre «na memória de todos os sítios onde o ténis é jogado em campos de relva». Hitler telefonara ao jogador mesmo antes do jogo, ouvindo passo a passo as suas peripécias. Don afirmaria: «O público alemão estava tão calado que tenho a certeza de que conseguia ouvir-nos a respirar.» Os Estados Unidos não ganhavam a saladeira desde 1926 e a vitória de Budge pôs os americanos na final contra a Inglaterra, a caminho da recaptura do troféu. Mas 1938 foi o seu ano de glória. O termo Grand Slam ainda não estava instituído quando Budge ganhou os campeonatos na Austrália, França, Grã-Bretanha e Estados Unidos. O ano começou com uma indicação do seu domínio quando destruiu o campeão australiano, John Bromwich, por 6-4, 6-2, 6-1. Com Roland-Garros à vista o barão Von Gramm, seu adversário mais difícil do Mundo em terra batida, já estava numa prisão nazi, Budge lançou carta aberta a exigir a libertação, num «gesto de boa vontade» (!) Hitler abriu-lhe o cárcere, quiçá na ânsia de se aproveitar da sua vitória como propaganda, mas quem ganhou foi o California comet, como era chamado devido ao potente serviço. Budge foi também o único triplo campeão de Wimbledon pelo segundo ano consecutivo, ganhando em singulares sem perder qualquer set. E ainda conquistou os três títulos de Forest Hills. O seu domínio era inquestionável. Budge ajudou os Estados Unidos a defender o título da Taça Davis nesse Verão e repetiu os feitos de Wimbledon em Forest Hills em Setembro, derrotando o companheiro de pares de longa data, Gene Mako, na final de singulares. Em Novembro de 1938 tornou-se profissional e Fred Perry e Ellsworth Vines foram automaticamente derrotados na sua estreia. Quando a guerra recrudesceu entrou ao serviço do U. S. Army Air Corps. Sofreu lesão grave num ombro em batalha, nunca mais seria o jogador fabuloso que fora, mesmo assim continuou a competir a alto nível até 1955.

Mulher de guerra
Cecilia Colledge
Depois de ter visto ao vivo Sonja Henie ganhar o título mundial pela segunda vez, em 1928, Magdalena Cecilia Colledge colocou na cabeça um desejo apenas. Ou melhor, plantou em si uma obsessão. Ser campeã de patinagem, imitar a rainha do lago dos cisnes. Era abastada a sua família, por isso os pais até se deram ao trabalho de contribuir para a construção de uma pista de patinagem mais perto de casa. Em Fevereiro de 1932 partiu para Lake Placid. Para disputar os Jogos Olímpicos de Inverno de 1932. Tinha apenas 11 anos e 76 dias, tornou-se a mais nova participante numa Olimpíada. Algumas semanas passadas ganhou a medalha de prata nos Europeus. Em 1936, nos Jogos Olímpicos de Garmisch-Partenkirchen, só não ganhou a medalha de ouro porque na pista estava Sonja Henie num dos seus mais deslumbrantes e sexys bailados. De 1937 a 1939 Cecilia conquistou três títulos europeus. Estoirou a guerra, foi para o campo de batalha como elemento do Corpo de Transportes Mecanizados — e em 1946 tornou-se profissional, radicando-se nos Estados Unidos, rivalizando com os espectáculos de Henie, que nunca deixou de ser o seu ídolo. Devotadamente.
 
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1938 – Campeonato do Mundo de Futebol em França

Portugal afastado por «penalty»
Mundo estava perigoso
Apenas na Europa foi preciso fazer apuramentos para a fase final de 1938, em França. Face à turbulência política, à iminência da guerra a estoirar, desistências em barda. Assim, Brasil, Cuba e Índias Orientais Holandesas, como então se chamava a... Indonésia, tiveram passaporte garantido. Europeus os restantes 13: França, país anfitrião, Itália, na condição de campeã, Alemanha, Áustria, Bélgica, Checoslováquia, Holanda, Hungria, Noruega, Polónia, Roménia, Suécia e Suíça — que afastou Portugal num jogo dramático, em Milão, foi um vendaval de golos perdidos e João Cruz até um penalty falhou, a derrota por 1-2 e a porta fechada ao Mundial. Em Fevereiro de 1938 o governo de Viena, resistindo às pressões nazis, convocou um referendo para saber se o povo concordava com a incorporação na Alemanha. Na véspera da consulta popular, a 12 de Março, o exército alemão invadiu o território, espalhando à passagem metralha e mortandade. Hitler até nascera no Império Austro-Húngaro, cruel ironia do destino — filho de um alfandegário. Recrutado pelo exército alemão, combateu na I Guerra Mundial já contaminado por filósofos austríacos que defendiam a superioridade ariana em relação aos povos do império e que propugnavam que todos os males do mundo se deviam ao semitismo.

Longa vida de Piola
Silvio Piola foi uma das estrelas de Itália. Morreu em 1996 com 83 anos — o campeão mundial de maior longevidade. Alinhou 34 vezes pela azzurra, marcando 30 golos. Jogou na Lazio e no Novaro, no Torino e na Juventus, apontou 274 golos no campeonato de Itália — o terceiro maior goleador da história, depois de Giuseppe Meazza e Luigi Riva.

Avião pago por Mussolini
A França fez questão de disputar o campeonato em várias cidades, a primeira vez que tal aconteceu, obrigando a maratona de viagens. A única selecção que utilizou o avião foi a Itália. Mussolini fez questão de pagar tudo — e de tratar os homens da azzurra com as «mordomias que os senhores do mundo merecem».
Áustria proibida de disputar campeonato a pedido do Fuher
FIFA fez vontade a Hitler
França e Inglaterra condenaram a invasão nazi à Áustria mas não foram além de protestos diplomáticos. E Jules Rimet rechaçou todas as propostas para que o Mundial de 1938 fosse adiado — e a Alemanha pura e simplesmente afastada da competição. Mais grave ainda, a FIFA permitiu inclusivamente que alguns austríacos se considerassem alemães e, por via disso, a equipa de Hitler surgiu reforçadíssima em França. À Alemanha coube abrir a copa. Contra a Suíça, que se afamou pela táctica do ferrolho. Depois de empate a um golo, segundo jogo e surpresa das surpresas, os favoritos eliminados, vitória dos suíços por 4-2, depois de estarem a perder por 0-2. Nesse mesmo dia a selecção das Índias Orientais Holandesas era massacrada pela Hungria: 6-0. Inesperada igualmente a luta dada pela Polónia ao Brasil num dia de temporal agreste, campo encharcado, inclemente dilúvio — 4-4 no final do tempo regulamentar, o árbitro não aceitou as sugestões para que o prolongamento se fizesse depois, o relvado já estava completamente impraticável, era lotaria, a sorte grande acabou por bafejar os brasileiros: 6-5. E da lama nascia um herói, Leónidas da Silva, autor de quatro golos — apesar de quatro golos ter marcado também o polaco Willmowski. A França eliminou a Bélgica, a Checoslováquia a Polónia, a Itália a Noruega — espanto maior, Cuba afastou a Roménia, em segundo jogo, batendo os eslavos por 2-1. A Suécia ficou automaticamente apurada para os quartos-de-final porque Hitler proibiu a Áustria de se deslocar a França, por não ser «país independente mas parte integrante da Alemanha»!!! Como o desafio com os cubanos era na Côte d’Azur, os suecos andaram mais de uma semana em dolce farniente — mais na praia que outra coisa — e mesmo assim afastaram os caribenhos de forma incontestável: 8-0, Wetterson, só à sua conta, apontou quatro golos. A França despediu-se igualmente da copa aos pés da Itália: 3-1. Empolgante, dramático, o duelo entre brasileiros e checos. Foi jogo de faca na liga, dois eslavos tiveram de deixar o campo com fracturas graves, dois brasileiros foram expulsos — e o guardião Planicka o herói! Partiu um braço, manteve-se na baliza, só sofreu golo de penalty de Leónidas. O empate a uma bola obrigou a segundo jogo. Já sem Planicka a servir de cortina de ferro, o Brasil ganhou por 2-1, ao intervalo perdia por 0-1.

Domingos da Guia – Divino mestre de espinha na garganta
Considerado um dos melhores zagueiros de toda a história, Domingos da Guia tinha apodo que sintetizava tudo: divino mestre. Revelado nas peladinhas de Bangu, nos subúrbios pobres do Rio, cedo foi contratado pelos uruguaios do Nacional de Montevideu. Regressaria ao Rio, ao serviço do Vasco da Gama, saltaria para o Boca Juniors de Buenos Aires, passaria pelo Flamengo e pelo Corinthians. E sempre o mesmo fulgor. O Mundial de 38 não lhe correu de feição. Pela vida fora ficou-lhe atravessado o penalty que deu a passagem à Itália para a final, que jurou e tresjurou não ter feito. Mas nem isso lhe empanou o brilho e o escritor Gilberto Freyre um dia até comparou o seu futebol à literatura de Machado de Assis. Seu filho, Ademir da Guia, seria nos anos 70 estrela do Palmeiras, foi campeão do Brasil por cinco vezes e no Mundial de 1974, no desafio para atribuição do terceiro lugar, contra a Polónia, mostrou a sua massa — no dia seguinte vários jornais falavam de si como... divino, pelo estilo a meio campo, pela técnica e por ser filho de que era.

Brasil afastado da final porque seleccionador quis poupar Leónidas
Última vitória de Mussolini com mais «azzurra»
Nas meias-finais coube ao Brasil defrontar a Itália, campeã mundial em título. Ademar Pimenta, o seleccionador, decidiu poupar Leónidas, contundido na batalha com os checos, insinuando que assim estaria mais descansado na final. Não chegou lá, os italianos venceram por 2-1. A Hungria afastou facilmente a Suécia: 5-1. Três golos de Zsengeller, um de Tikos, outro de Sarosi, marcaram a magia da equipa húngara. Para o terceiro lugar, já com Leónidas, o Brasil bateu os suecos por 4-2. Era o prémio de consolação. A final foi no Estádio de Colombes. Perante 58 mil espectadores. Era um campo cheio de entusiasmo a torcer pela... Hungria. Obviamente por razões políticas, nos italianos havia, permanente, o fantasma de Mussolini. Os homens de Pozzo entraram de rompante, aos seis minutos Colaussi fez o primeiro golo, replicou a Hungria, empate por Titkis, Piola desfez a igualdade pouco depois, ainda antes do intervalo Colaussi ampliou a margem. Na segunda parte mais um golo de Piola, Sarosi apontou outro, o placard fechou com 4-2 e a Itália bicampeã mundial. Dois meses depois Hitler ocupou a Checoslováquia. Em 1939 os tanques esventraram a Polónia. A quarta edição do Mundial de futebol teria de esperar 12 anos. Pelo Brasil.

Campeões do Mundo
Olivieri, Foni, Raua, Serantoli, Andreolo, Locatelli, Biavatti, Meazza, Piola, Ferrari I, Colaussi, Pesinatti e Ferrari II

Brasileiro que inventou pontapé famoso e não só...
Leónidas de bicicleta
«Quando Leónidas faz um golo parece que é sonho, é preciso esfregar os olhos. É a magia negra.» Foi assim que o jornalista francês Raymond Thourmagem retratou a estrela da copa de 38. O Brasil não ganhou mas Leónidas da Silva foi o melhor marcador, mostrou que era o melhor avançado-centro do Mundo, com uma mobilidade que desconcertava, uma elasticidade que encantava. Apontou sete golos, um deles, contra a Polónia, sem sequer ter a chuteira calçada e quando a bola, encharcada pela lama em que a relva se transformara, já pesava tonelada! Iniciou-se no futebol no Bonsucesso e foi lá que inventou o lance que lhe marcaria toda a vida: o pontapé de bicicleta. Passou para o Vasco, jogou também no Peñarol de Montevideu, no Botafogo e no Flamengo, onde estava era campeão. Em 1942 foi contratado pelo São Paulo e recebido sebastianicamente como herói. Na sua estreia, contra o Corinthians, record de assistência no Estádio de Pacaembu e com a sua magia negra títulos paulistas de 43, 45, 46, 48 e 49. Por isso lhe chamavam também diamante negro. Ou homem de borracha. Ou simplesmente Leónidas. Após encerrar a carreira tornou-se comentador radiofónico.

Giuseppe Meazza – Meazza ou Pepino
Giuseppe Pepino Meazza. Uma das estrelas da copa. Tinha 24 anos. Nascera em Milão, despontara no Inter. O pequeno físico não era obstáculo ao seu oportunismo, quer no ar quer no chão. Campeão em 1934, repetiria o título em 38. Fez nome como avançado-centro e uma das melhores armas era a elegância, o sentido de posicionamento, o faro do golo — estava quase sempre no sítio certo, no espaço mais inimaginável, no momento oportuno. No Mundial de 1934 não actuou a avançado-centro porque Vittorio Pozzo achou que a alta estatura de Schiavo poderia ser a sua secreta bomba atómica. Não se enganou. Mas nem isso retirou brilho ao jogo de Meazza. Depois da guerra mudou-se para o AC Milan, ainda passaria pela Juventus, ao Inter regressando como treinador em 1947.
 
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1938 – Lenda a alta velocidade

Tazio Nuvolari, grande nome do automobilismo antes da guerra
Correr de moto com pernas engessadas
Tazio Nuvolari era conhecido como il montavani volante. O mantuano voador. Imagem de coragem e ousadia. Durante 30 anos deslumbrou o mundo nas corridas, quer de motos quer de automóveis. Nasceu a 18 de Novembro de 1892 em Casteldrio, perto de Mântua. O seu tio Giuseppe, vendedor da Bianchi, foi quem introduziu Novolari no desporto motorizado. Depois de servir o exército italiano como motorista, na I Guerra Mundial, Nuvolari lançou-se a sério no motociclismo, com 28 anos. Cavalgou Norton, Sarolea, Garelli, Fongri e Indian. A forma de correr foi notada pela poderosa equipa Bianchi, que o contratou. Uma vez, no Grande Prémio de Monza de motociclismo, sofreu acidente durante os treinos do qual resultaram as duas pernas partidas. Envolveram-nas em gesso e disseram que durante dois meses nem sequer pensasse em andar pelo seu pé. No dia seguinte estava na linha de partida amarrado à própria moto, pedindo apenas aos mecânicos que o agarrassem à partida e à chegada. Nesse dia começou a acastelar-se a lenda de Nuvolari.

Truque das luzes apagadas
Os automóveis surgiram na vida de Tazio Nuvolari em 1924. Aos 32 anos. Em 1927 criou a própria equipa, comprando um par de Bugatti 35B, que partilhou com Achille Varzi, seu rival no motociclismo. Nuvolari ganhava sempre. Varzi, filho de um comerciante riquérrimo, comprou então um Alfa P2 e tomou vantagem. Em 1929 a Alfa Romeo convidou Nuvolari para a sua escuderia e os duelos faiscantes voltaram. Nas Mille Miglia de 1930, noite densa, Tazio, ao aperceber-se de que Achille ganhara vantagem, jogou com arma escondida — apagou as luzes do carro, o outro julgando-se descansado na liderança levantou o pé, a três quilómetros do fim Nuvolari colocou-se, subitamente, ao lado de Varzi, sorriu ao incrédulo companheiro, acendeu as luzes e disparou para a vitória! Em 1933, apesar de mão-cheia de vitórias, as suas relações com Enzo Ferrari azedaram e juntou-se à Maserati. Dois anos volvidos regressou à Alfa Romeo e a sua maior vitória, em Nürburgring, após perseguição impiedosa à Mercedes.

Nuvolari até acabou grande prémio com volante na mão!!!
Em 1936 Nuvolari sofreria grave acidente durante os treinos para o Grande Prémio de Trípolis, fugiu do hospital, apanhou um táxi para o circuito e terminou em sétimo lugar ao volante de um carro de reserva. Com a morte de Bern Rosemeyr, em 1938, a Auto-Union procurava desesperadamente um piloto que fosse capaz de dominar o seu carro de motor central. A insistência de Ferdinand Porsche acabou por levar à contratação de Nuvolari, com o qual triunfaria no Grande Prémio de Inglaterra, em Donington. Só a II Guerra Mundial seria capaz de parar Nuvolari. Após o armistício voltou às pistas. Em 1947, com 56 anos, doente, pagando factura pelos fumos que fora inalando pelas pistas, com um carro muito menos potente que os demais, ainda foi segundo numa corrida em Pelligrino. Dizia-se que queria morrer ao volante. Mas não. A 11 de Agosto de 1953, nove meses depois de sofrer uma trombose, o coração parou. Como era sua vontade, foi enterrado com o seu equipamento, uma camisola amarela e umas calças azuis. Mais de 50 mil pessoas no funeral. Enzo Ferrari parou na loja de um canalizador quando chegou a Mântua para pedir informações quanto à direcção a seguir para o cemitério. Vendo a matrícula de Modena, e desconhecendo a identidade do condutor, o canalizador murmurou: «Obrigado por ter vindo. Não tornará a haver outro homem como ele.» Por essa altura, de boca em boca, passava a memória da frase que gostava de dizer de si: «Tenho um pacto com o Diabo.» Talvez por isso tenha até terminado um grande prémio com o volante fora do carro! E ninguém esquecia o fulgor que incendiou com as 32 corridas que ganhou pela Alfa Romeo, sobretudo as várias edições de Le Mans e das Mille Miglia.

Algodão da Índia
Jeannette Altwegg
Desde o início do século que os ingleses não contavam com uma patinadora tão bem dotada. Filha de um suíço, comerciante de algodão, e de uma inglesa, nasceu na Índia em 1930. Jeannette Eleanor Altwegg estreou-se nos grandes palcos de gelo nos Mundiais de 1947, quedando-se pela quinta posição. Igualmente apaixonada pelo ténis, nesse mesmo ano participou no Torneio de Wimbledon mas logo decidiu abandonar os courts para se dedicar em exclusivo à patinagem. Perfeccionista e persistente, no Mundial de 1948 terminou em quarto, em 1949 em terceiro e no ano seguinte levou a prata. E, dentro da lógica de progressão, em 1951 sagrou-se campeão do Mundo. Não, não parou, continuou em voo para o paraíso. Nos Jogos Olímpicos de Inverno de 1952, em Oslo, conquistou igualmente a medalha de ouro, quatro anos antes, em Saint-Moritz, já ganhara bronze. Recusando sempre aderir ao profissionalismo, retirou-se em 1952 — ano em que se sagrou campeã europeia pela segunda vez consecutiva —, indo viver para os altos cumes cobertos de neve da Suíça como professora voluntária de um orfanato. Era o prazer do gelo no coração quente.
 
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> Nas Mille Miglia de 1930, noite densa, Tazio, ao aperceber-se de que Achille ganhara vantagem, JOGOU COM ARMA ESCONDIDA — APAGOU AS LUZES DO CARRO, o outro julgando-se descansado na liderança levantou o pé, a três quilómetros do fim Nuvolari colocou-se, subitamente, ao lado de Varzi, sorriu ao incrédulo companheiro, acendeu as luzes e disparou para a vitória!

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Só mesmo nestes tempos.