Discussão interessante.
Eu acho que na tua análise cometes dois pecados capitais.
O primeiro é desvalorizar o inflacionamento do mercado.
60 ME já não é um valor estratosférico. Na época passada tiveste 20 transferências por esse valor ou mais.
O segundo, e mais importante, é ignorar o custo e (in)disponibilidade dos jogadores de rendimento imediato, designamente os de topo, que só aqueles que os clubes de topo procuram/necessitam.
Por um lado o custo.
Kane custou 95 ME aos 30 anos. Declan Rice, ainda jovem (24 anos), mas já estabelecido, 116 ME. Kolo Muani, 95 ME. Havertz, 75 ME.
Nos jogadores mais velhos tens ainda a concorrência das Arábias. Ronaldo, Neymar, Benzema, Kante, Mané... Tudo para a Arábia por valores obscenos (principalmente a nível salarial).
Por outro, a indisponibilidade.
Há quanto tempo o Real Madrid queria o Mbappe? Só conseguiu agora chegar-lhe em final de contrato. Alguém consegue ir buscar o Haaland ao City? Vinícius ou Bellingham aí Real Madrid? Yamal ao Barcelona? Se os melhores jogadores estiverem já em clubes de topo, muito, muito dificilmente algum clube os consegue tirar de lá. O que limita muito aos possibilidades de compra e valoriza imenso o chegar a esses jogadores antes dos outros, daí serem adquiridos cada vez mais jovens.
Vê o PSG que perdeu o Mbappe e procura substituto. Yamal nem por 250 ME. Por Osimhen o Nápoles pede 130 ME. Estão a tentar comprar por menos. Mas quais seriam as alternativas??? Também tentaram o Kvara, mas o Nápoles não parece aceitar perder os dois. Nem por 200 ME!!!
Esta política dos grandes clubes comprarem os melhores talentos jovens tão cedo deriva disso. Quando um talento desses entra na esfera de controlo de um grande clube, muito dificilmente sai de lá e se sair é por um valor desproporcional.
É este o racional por detrás desta política. Basicamente, pensar no longo prazo em detrimento de pensar exclusivamente no dia de hoje...
Ambos os pontos são válidos!
A conjugação dos dois reforça a irracionalidade das opções atuais!
1. A inflação recente parece-me inquestionável, embora, sem ter dados quantitativos para a suportar!
Agora, repara, nos exemplos que usas: Harry Kane, Declan Rice, Kolo Muani e Havertz... com excepção do Harry Kane, que tem a idade contra ele, eu apostaria que os outros não entravam no top-5 das respectivas posições...
Ou seja, a inflação sente-se na classe média, o que implica: a) sobrepagar por gente que não vale aquilo que se paga por ela ou b) subpagar por gente que vale aquilo que não se paga por ela...
Tentando ser mais claro... no top-15 das maiores transferências de sempre, tens 4 nas últimas 2 épocas: Declan Rice, Enzo Fernandez, Caicedo e Bellingham... sem atacar a questão da qualidade, que é sempre subjectiva, aponto uma única variável, que, sempre que leio sobre estas modelagens de preço vem sempre entre as mais relevantes: golos! Desses 4 jogadores, 3 não têm golo! Será normal, que jogadores que marcam 1 golo em cada 1.000 ou 2.000 minutos sejam top-15 de sempre? Não me parece! É mais uma irracionalidade, que suporta, precisamente, que a inflação se dá na classe média!
2. A indisponibilidade dos melhores jogadores sempre foi um tema! Desde logo, porque os clubes com capacidade de atracção desses jogadores são em número muito, muito reduzido! Provavelmente, não são mais que 3 ou 4 e reduziu-se, nos tempos mais recentes, sobretudo, pelo FFP! A entrada de capital "infinito" em alguns clubes aumentou esse número e foi reduzido, artificialmente, via FFP!
Exhibit 1: Real Madrid
a) 2000-02: Figo e Zidane, 140m
b) 2003-04: Ronaldo e Beckham, 90m
c) 2009-10: Ronaldo e Kaká, 160m
d) 2013-15: Bale e James: 176m
e) 2019-20: Hazard: 120m
Agora repara na evolução do revenue do Real Madrid:
2003: 193m
2010: 442m
2015: 578m
2019: 757m
Colocando de lado as muitas outras variáveis, repara que, arredondadamente, entre 2000 e 2004, o Real Madrid investiu 30% do revenue anual num craque; em 2009/10, investiu 36% em 2 craques; entre 2013 e 2015, baixou para 15%, por ano, num craque e 2019/20, foi 15% para comprar o Hazard! Portanto, o valor até onde o Florentino teria ido em 2004 ou em 2010, seria algures entre os 250m e os 300m pelo Mbappé! Chegou a isso? Teria feito bem? Precisa de o fazer da mesma forma como precisava em 2004?
Exhibit 2:
O PSG é muito melhor exemplo! Referes, e muito bem, que o preço do Osimhen são 130m! Uma vez mais, vou deixar de lado a subjectividade da qualidade do jogador! Não vou repetir o exercício do Real Madrid, porque o racional do PSG é muito diferente!
Em 2016/17, o PSG contratou Draxler, Guedes e Jesé, por 90m! Em 2017/18, contratou Neymar e Mbappé por 400m! Qual foi melhor para eles?
Em 2023/24, o PSG contratou Kolo Muani e Ramos por 170m! Em 2024/25, quer contratar o Osimhen por 130m! Qual será melhor para eles?
Os jogadores existem e estão disponíveis! Os clubes têm é de estar dispostos a pagar por eles! O PSG estava disposto a pagar por um Mbappé e por um Neymar! Quando dizes que não conseguem ir buscar um Yamal por 250m, eu entendo! Mas, conseguem ir buscar um Nico Williams por 60m! Conseguem atacar um Bernardo Silva (quase Barcelona), um Bruno Fernandes (quase Bayern), um Kimmich (defesa-direito???), o Harry Kane foi por 95m...o dinheiro do PSG é para ganhar hoje, não é para garantir um meio-campo para 10 anos, se as coisas correrem bem... e, quando não correm, coloca-se o price tag do Osimhen nos 300m, porque o Kolo Muani vai continuar sentado no banco e o ramos vai acabar no wolverhampton ou no forest...
Em resumo, a indisponibilidade é um tema que só é ultrapassável de uma forma: pagando! Era assim no passado e será assim no futuro! O problema é que, no passado, o Real Madrid batia recordes pelo Zidane, pelo Figo, pelo Ronaldo... hoje, há uma equipa que tem uma dupla de meio-campo que lhe custou 237m, os dois caramelos fizeram 5.000 minutos na primeira época juntos, marcaram 4 golos e viram 19 cartões amarelos...