Para mim, é da mais elementar decência darem ao homem as condições mínimas que não teve até agora. Plantel como deve ser (1 médio centro de jeito, 2 extremos de jeito, 1 PL experiente e com golo, 1 libero, pelo menos), pré-época, e depois logo se vê: se mostrar que tem unhas fica, senão, vai embora.
Manda-lo embora agora, tendo ele vindo a meio da época, sem conhecer o plantel nem o futebol português, tirando do plantel os 2 melhores jogadores mal ele chegou, sem pré-época, depois de fazer um punhado de jogos que serviu essencialmente para tirar apontamentos para a próxima época, é uma insanidade para com o clube e uma indecência para com o treinador.
O Porto não acaba se se der uma oportunidade ao homem e ele falhar. Isso de "se se falhar a Champions mais uma vez é dramático para o FCP"... é uma treta. Na gestão anterior práticamente nunca falhámos uma Champions e estávamos cada vez mais à beira do abismo. Uma gestão séria e competente, onde não haja milhões e mais milhões que vão parar sem justificação nenhuma aos bolsos de empresários, onde não haja elevadas receitas de bilhetica que vão parar aos bolsos de parasitas do Porto, onde não haja salários de jogadores/treinadores incomportáveis para o clube e que nem sequer se justificam tendo em conta o mérito desportivo desses profissionais, onde não haja antecipação de todas as receitas futuras e mais algumas porque não se faz nada para diminuir as despesas e aumentar as receitas, onde não haja venda de craques de nível mundial ao preço da uva mijona... é muito mais importante que qualquer receita da Champions.
Continuar com a gestão financeira que está a ser feita, melhorar (muito) o plantel, é esse o caminho a seguir, com este treinador ou com outro se este não tiver unhas depois de lhe serem dadas verdadeiras condições.
O que está aqui em causa não é uma questão de moralidade, é de competência.
O que dizes parte de um ponto que, à superfície, parece razoável: dar tempo, dar pré-época, dar reforços.
Mas a pergunta que tem de ser feita é: dar tempo a quê? A que modelo? Com que base?
Tu próprio disseste que o Anselmi precisa de vários reforços.
Mas vamos por partes, porque o problema aqui nem é só dizer que são precisos reforços — é que nem os perfis que apontas encaixam no modelo de jogo que o próprio Anselmi tenta impor.
"1 médio centro de jeito"
O quê é um médio centro de jeito, será um médio de construção? Um box-to-box?
Porque no modelo do Anselmi, o meio-campo joga com dois interiores muito altos e um “líbéro” disfarçado a sair de trás.
Se metes um médio criativo a jogar de frente para o jogo, vais deixá-lo pendurado — sem apoios curtos, sem linhas de passe, sem espaço entrelinhas porque a ocupação do meio-campo no desdobramento para 3-4-3 dele é desorganizada.
"2 extremos de jeito"
E onde é que vão jogar, exatamente?
O Anselmi não usa extremos abertos clássicos.
Usa dois avançados interiores (falsos extremos, se quiseres), que jogam por dentro — e que precisam de entender-se com o avançado-centro e os médios que vêm de trás.
Ou seja, queres investir em extremos quando o modelo nem os acomoda — a não ser que mudes completamente o sistema.
"1 ponta-de-lança experiente com golo"
Claro, todos os clubes do mundo querem esse. Até no Distrital.
Mas se o tens, vais pedir-lhe que jogue isolado, sem apoio interior real, com cruzamentos que não chegam e num sistema onde não há ocupação de área consistente.
Basta ver o que (não) acontece com o Samu.
Podes ir buscar o Harry Kane — se for para estar sozinho entre centrais sem chegada, não serve de nada.
"1 líbero"
Aqui então é poesia total.
Sabes que tipo de jogador é que esse papel exige?
Alguém com leitura defensiva apurada para fechar transições.
Capacidade de subir ao meio-campo para participar na construção.
Velocidade para cobrir profundidade.
Tomada de decisão sob pressão.
E ainda liderança para orientar a linha defensiva.
O líbero no modelo do Anselmi tem de ser central com saída, médio com critério, velocista com timing e líder com voz.
Tens ideia de quantos jogadores no mercado sabem fazer isso tudo… e estão ao alcance financeiro do FC Porto?
É que nós estamos a falar do mercado como se houvesse vários Beckenbauers com cláusula de 3 milhões prontos a assinar. Isto numa posição para o qual nenhum jogador é formado porque é uma "posição morta".
E se arranjares um — quem vai proteger os centrais quando esse líbero sobe e deixa o espaço livre nas costas?
Que estrutura defensiva vai segurar esse risco?
Com os mesmos centrais lentos e ou sem leitura? Com laterais que não conseguem fechar por dentro?
Vamos ter de contratar laterais e centrais.
Ou seja, estás a dizer que ele precisa praticamente de uma equipa nova.
Então a pergunta é: se o modelo dele só pode funcionar com jogadores novos para todas as posições… será que o modelo é adequado ao que o clube pode oferecer?
E mesmo que todos cheguem — o que garante que os comportamentos coletivos, que hoje são descoordenados, vão magicamente encaixar?
Não estamos a falar de dar tempo a um treinador que está a mostrar caminho, mas precisa de afinar detalhes.
Estamos a falar de alguém que chegou há meses, e desde então a equipa piora em todos os indicadores — posicionais e comportamentais.
Quanto à Champions, dizes que falhar não é dramático.
Mas neste momento, falhar a entrada direta na Champions representa mais do que perder receitas.
É adiar a recuperação financeira, comprometer reforços, e manter o clube fora da montra que atrai talento.
E atenção: não se está a dizer que o treinador tem de sair “só porque perdeu.”
Tem de sair porque não melhorou nada — e insiste num modelo que não se adequa ao plantel, nem ao campeonato, nem ao momento do clube.
Portanto, sim, podemos dar pré-época, reforços e crédito.
Mas só se houver sinais de que há base para isso.
E neste momento, tudo o que vemos é um modelo que exige muito — mas dá pouco.
E esse tipo de aposta, para um clube como o FC Porto, não é ambição. É roleta.