Jorge Nuno Pinto da Costa - Presidente dos Presidentes (1937 - 2025)

Bitaites

Tribuna Presidencial
18 Julho 2006
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Italia
Os portistas da minha geração são todos portistas definidos por Pinto da Costa. É um marco irreparável nas nossas vidas o desaparecimento do nosso Presidente. Sinceramente não sei se saberei viver o portismo orfão do nosso modelo nesta ultima metade da vida.
Só espero que os meus filhos possam ter tantas ou mais alegrias com o nosso clube como eu tive... Duvido, mas desejo
 
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Astolfo

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27 Maio 2024
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  • Jorge Costa
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Esta é a primeira e será provavelmente a última publicação que farei neste fórum. Nada contra; é só que sempre gostei mais de acompanhar que propriamente de comentar.

Tive o azar cósmico de nascer em Lisboa. O que me corre nas veias é sangue minhoto, provindo do lado materno da família, que cedo se mudou para a cidade do Porto e, cedo também, para a capital em busca de uma vida melhor. De lá trouxeram a paixão pelo Futebol Clube do Porto, que teve o seu baptismo definitivo com os dois golos do Jardel em Milão.

Chamo-lhe "azar cósmico" porque não escolhemos onde nascemos nem tem que ser isso que nos define. E chamo-lhe "azar cósmico" porque, como qualquer Portista de Lisboa sabe, nós crescemos rodeados de vitórias, mas também do desdém alheio. Certa vez levei um cachecol do Azul e Branco para a escola e houve um contínuo que se assoou ao Brasão Abençoado com cara de nojo. Outra vez, fui a Alvalade para ver o meu clube jogar, e fui alvo de ameaças físicas e verbais por parte de gente com o dobro do tamanho e idade. Agora adulto, já ninguém me mostra essa coragem dos bullies. Não raras vezes, ouço ainda "és fixe, pena é seres do Porto"; ou, pior ainda, "como é que és de Lisboa e és do Porto?". Mas já não lhes viro a cara com vergonha infantil.

Felizmente, o contrário também se aplica. Por motivos profissionais venho-me deslocando muitas vezes ao Porto, e ao Minho. Fiz muitos amigos nessas viagens, amigos Portistas; conheci várias pessoas que se espantam, depois de dois ou três dedos de animada e alcoólica conversa, quando lhes digo que nasci em Lisboa e sempre morei perto de Lisboa. "Tu pareces um gajo do Norte" é provavelmente a coisa mais bonita que alguém já me disse. Já sofri muito pelo clube a seu lado, vibrei pelo clube outras tantas vezes; descobri, só muito mais tarde na vida, os meus semelhantes. Acontece; mais vale tarde que nunca.

Outro dia, um conhecido lampião disse-me que não considerava o Futebol Clube do Porto um "clube a sério". Disse-o para me picar, mas na minha óptica tem razão: o Futebol Clube do Porto não é um clube, é uma ideologia. O Futebol Clube do Porto é a crença em algo maior que a racionalidade humana: para uns pode ser "trabalho", para outros pode ser "raça", para outros ainda algo completamente diferente. Sempre que grito "Porto!", seja em casa ou num estádio, essa palavra guarda dentro de si algo mais que o imediatamente perceptível. "Porto!" é ao mesmo tempo a humildade e o termos confiança em nós mesmos; "Porto!" é o sermos fiéis e o sermos justos; "Porto!" é antagonismo e luta contra a capital instituída, contra o centralismo que menospreza quem quer que se encontre fora das suas fronteiras. Um grito de "Porto!" nunca é sobre o clube ou a cidade em que este se ergueu, tampouco sobre uma só região. É o grito de todos os ingovernáveis. Não é por mero acaso que há tantos Portistas na Madeira ou nas antigas colónias.

O Futebol Clube do Porto é ideologia e o seu educador foi Jorge Nuno Pinto da Costa. Mais que "Presidente dos Presidentes", mais que "Rei", mais que qualquer rótulo que lhe colem por causa de um qualquer culto da personalidade (se esse culto é compreensível ou deixa de o ser, são discussões completamente diferentes), Pinto da Costa foi um professor: apontou o dedo e, através da sua paixão pelo Porto e de tudo o que veio atrás ela - o trabalho, a ironia, a belicosidade -, mostrou-nos que um outro mundo era possível. Um mundo em que um clube orgulhosamente bairrista (e ainda bem!) podia aspirar a conquistá-lo, como o fez. Um mundo em que não mais teríamos que baixar a cabeça perante o poder instituído: iríamos olhá-lo nos olhos e desafiá-lo. Traduzido por gunês, Pinto da Costa foi quem se virou pela primeira vez a Lisboa e disse, de faca nos dentes: "e quê, caralho?".

Será esse, até mais que qualquer dos mais de 2500 troféus conquistados, o seu maior legado: o nunca nos rebaixarmos perante quem nos quer colonizar o coração. É por isso que lhe estou eternamente grato. As vitrines recheadas vieram por arrasto. É nisso que tenho um orgulho indizível e é isso que me leva a dizer que aquilo que hoje morreu não foi um Presidente, não foi um Clube, não foi uma Ideia: foi um homem, de carne e osso, falível como qualquer outro. O que hoje morreu não foi o Verbo, para recorrer a um termo bíblico. É também isso que me leva a não chorar uma morte anunciada; sinto o pesar obrigatório pela sua passagem, claro, misturado com alguma - não há que o negar, não há que ser hipócrita - raiva por estes últimos anos, em que Pinto da Costa rejeitou a sua própria palavra. Resumindo, não sinto a dor de saber que morreu, mas a felicidade de ter acompanhado a sua vida.

Há meses que ouço gente a dizer-me que quando Pinto da Costa morresse iria para a rua, de cocktail na mão, lançar fogo de artifício. Já se passaram horas e a minha cidade continua incrivelmente silenciosa. Até na morte, conseguiu calar toda a gente que o odiava, nos odiava, odiava a nossa palavra.

Independentemente das críticas que se possam vir a fazer, independentemente de amanhã não ganharmos ao Farense (quer dizer, ai daqueles coiros que não ganhem), independentemente dos tempos difíceis que temos atravessado e, se calhar, continuaremos ainda a atravessar antes de chegar a bonança:

Somos Porto e seremos Porto. Hoje mais que antes. E, no antes, já o éramos no infinito.
Apesar de mais novo, como nascido em Lisboa, mas todas as costelas entranhas veias arterias cérebro e familia do Norte, partilho um pouco das dores e sentimentos daqui companheiro. Um abraço.
 
9 Março 2012
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Esta é a primeira e será provavelmente a última publicação que farei neste fórum. Nada contra; é só que sempre gostei mais de acompanhar que propriamente de comentar.

Tive o azar cósmico de nascer em Lisboa. O que me corre nas veias é sangue minhoto, provindo do lado materno da família, que cedo se mudou para a cidade do Porto e, cedo também, para a capital em busca de uma vida melhor. De lá trouxeram a paixão pelo Futebol Clube do Porto, que teve o seu baptismo definitivo com os dois golos do Jardel em Milão.

Chamo-lhe "azar cósmico" porque não escolhemos onde nascemos nem tem que ser isso que nos define. E chamo-lhe "azar cósmico" porque, como qualquer Portista de Lisboa sabe, nós crescemos rodeados de vitórias, mas também do desdém alheio. Certa vez levei um cachecol do Azul e Branco para a escola e houve um contínuo que se assoou ao Brasão Abençoado com cara de nojo. Outra vez, fui a Alvalade para ver o meu clube jogar, e fui alvo de ameaças físicas e verbais por parte de gente com o dobro do tamanho e idade. Agora adulto, já ninguém me mostra essa coragem dos bullies. Não raras vezes, ouço ainda "és fixe, pena é seres do Porto"; ou, pior ainda, "como é que és de Lisboa e és do Porto?". Mas já não lhes viro a cara com vergonha infantil.

Felizmente, o contrário também se aplica. Por motivos profissionais venho-me deslocando muitas vezes ao Porto, e ao Minho. Fiz muitos amigos nessas viagens, amigos Portistas; conheci várias pessoas que se espantam, depois de dois ou três dedos de animada e alcoólica conversa, quando lhes digo que nasci em Lisboa e sempre morei perto de Lisboa. "Tu pareces um gajo do Norte" é provavelmente a coisa mais bonita que alguém já me disse. Já sofri muito pelo clube a seu lado, vibrei pelo clube outras tantas vezes; descobri, só muito mais tarde na vida, os meus semelhantes. Acontece; mais vale tarde que nunca.

Outro dia, um conhecido lampião disse-me que não considerava o Futebol Clube do Porto um "clube a sério". Disse-o para me picar, mas na minha óptica tem razão: o Futebol Clube do Porto não é um clube, é uma ideologia. O Futebol Clube do Porto é a crença em algo maior que a racionalidade humana: para uns pode ser "trabalho", para outros pode ser "raça", para outros ainda algo completamente diferente. Sempre que grito "Porto!", seja em casa ou num estádio, essa palavra guarda dentro de si algo mais que o imediatamente perceptível. "Porto!" é ao mesmo tempo a humildade e o termos confiança em nós mesmos; "Porto!" é o sermos fiéis e o sermos justos; "Porto!" é antagonismo e luta contra a capital instituída, contra o centralismo que menospreza quem quer que se encontre fora das suas fronteiras. Um grito de "Porto!" nunca é sobre o clube ou a cidade em que este se ergueu, tampouco sobre uma só região. É o grito de todos os ingovernáveis. Não é por mero acaso que há tantos Portistas na Madeira ou nas antigas colónias.

O Futebol Clube do Porto é ideologia e o seu educador foi Jorge Nuno Pinto da Costa. Mais que "Presidente dos Presidentes", mais que "Rei", mais que qualquer rótulo que lhe colem por causa de um qualquer culto da personalidade (se esse culto é compreensível ou deixa de o ser, são discussões completamente diferentes), Pinto da Costa foi um professor: apontou o dedo e, através da sua paixão pelo Porto e de tudo o que veio atrás ela - o trabalho, a ironia, a belicosidade -, mostrou-nos que um outro mundo era possível. Um mundo em que um clube orgulhosamente bairrista (e ainda bem!) podia aspirar a conquistá-lo, como o fez. Um mundo em que não mais teríamos que baixar a cabeça perante o poder instituído: iríamos olhá-lo nos olhos e desafiá-lo. Traduzido por gunês, Pinto da Costa foi quem se virou pela primeira vez a Lisboa e disse, de faca nos dentes: "e quê, caralho?".

Será esse, até mais que qualquer dos mais de 2500 troféus conquistados, o seu maior legado: o nunca nos rebaixarmos perante quem nos quer colonizar o coração. É por isso que lhe estou eternamente grato. As vitrines recheadas vieram por arrasto. É nisso que tenho um orgulho indizível e é isso que me leva a dizer que aquilo que hoje morreu não foi um Presidente, não foi um Clube, não foi uma Ideia: foi um homem, de carne e osso, falível como qualquer outro. O que hoje morreu não foi o Verbo, para recorrer a um termo bíblico. É também isso que me leva a não chorar uma morte anunciada; sinto o pesar obrigatório pela sua passagem, claro, misturado com alguma - não há que o negar, não há que ser hipócrita - raiva por estes últimos anos, em que Pinto da Costa rejeitou a sua própria palavra. Resumindo, não sinto a dor de saber que morreu, mas a felicidade de ter acompanhado a sua vida.

Há meses que ouço gente a dizer-me que quando Pinto da Costa morresse iria para a rua, de cocktail na mão, lançar fogo de artifício. Já se passaram horas e a minha cidade continua incrivelmente silenciosa. Até na morte, conseguiu calar toda a gente que o odiava, nos odiava, odiava a nossa palavra.

Independentemente das críticas que se possam vir a fazer, independentemente de amanhã não ganharmos ao Farense (quer dizer, ai daqueles coiros que não ganhem), independentemente dos tempos difíceis que temos atravessado e, se calhar, continuaremos ainda a atravessar antes de chegar a bonança:

Somos Porto e seremos Porto. Hoje mais que antes. E, no antes, já o éramos no infinito.
Obrigado por este texto, também nascido em Lisboa , meu pai é minhoto , revejo me completamente nas palavras . Muito obrigado!

Enviado do meu Pixel 7a através do Tapatalk
 

Eclipsisboy

UM PASSADO ÍMPAR E UM FUTURO RISONHO! 💙🤍
25 Maio 2014
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Porto
  • Pinto da Costa
  • Campeão Nacional 19/20
  • Taça de Portugal 19/20
Estará com toda a certeza neste momento sentado na cabeceira de uma mesa enorme junto a Reinaldo Teles, Pôncio Monteiro, Fernando Gomes e outros nomes enormes da nossa história. À espera de verem e vibrarem com uma vitória nossa amanhã. 😥💙🤍😓

Uma vez no relvado do dragão no final de um jogo em mais um festejo de um título nosso : obrigado presidente por me dar uma vez mais esta alegria. E ele disse-me : não há nada que agradecer, este título não é meu, não fui eu que o dei, foi esta gente toda que aqui está dentro a festejar. Eles é que dão os títulos ao clube.

ENORME! 💙🤍
 
31 Julho 2024
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Não consigo dormir.

As memórias de infância é das melhores coisas que um adulto traz consigo para o resto da vida.

De lágrima no olho, essas memórias estão constantemente a passar-me na cabeça, porque a maior parte delas, tiveram o dedo de serem proporcionadas por este senhor.

Obrigado pelas alegrias de infância que me deu.

Obrigado por aquele golo do Costinha nos ultimos minutos em Manchester.

Obrigado pela aquela final da Champions contra o monaco.

Obrigado por aquela final mítica da taca uefa contra o celtic.

Obrigado pela aquela época fenomenal 2010/2011, com os festejos no escuro da luz.

Obrigado por aquele golo do kelvin.

Obrigado por aquele penalty do pedro Emanuel que fez de nós campeões do mundo.

Obrigado por ter feito valer a pena viver, e me ter proporcionado belos momentos, quando muitas vezes existiam momentos dificeis, porque esta vida é muito difícil.

Obrigado por esta ideologia que cada um de nos portistas tem dentro de si, que serve de inspiração nas nossas vidas, de lutar sempre até há ultima, de preferir quebrar que torcer, que suar sangue do que simplesmente transpirar, de ir buscar forças inimagináveis onde se pensa que mais nao existem para ultrapassar os dificeis obstáculos desta vida.

Obrigado por tudo. E um até sempre. Guardo apenas o de bom. O de mau fica para trás.
 

MeteOMarega

E, azul e branca, essa bandeira avança...
15 Maio 2018
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  • Pinto da Costa
  • José Maria Pedroto
  • André Villas-Boas
  • Lucho González
Dia negro na nossa história. Quase 3 da manhã e ainda aqui sem conseguir dormir.

Hoje partiu o maior da história do Futebol Clube do Porto e um dos maiores da história do futebol mundial.
Homem incontornável da história do clube, da cidade e do país.

Nos últimos anos critiquei a gestão e algumas atitudes mas não apaga as memórias do bom que nos deu.

O ídolo do meu falecido avô e do meu pai.

Deixou-nos fisicamente mas viverá sempre nos corações Portistas.

Descanse em Paz. Até sempre, Presidente!
 
Soares

Soares

Tribuna
5 Janeiro 2015
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Voltarmos a ter o clube unido é o maior tributo que podemos fazer a este grande homem, esqueçam as guerras das viúvas e dos traidores, temos de que dar tudo para levantar a merda do caneco no final da temporada, mesmo que as probabilidades estejam todas contra nós neste momento. Pelo FC Porto, por o nosso eterno presidente, ele certamente se poder, vai fazer tudo o que poder esteja lá ele onde estiver para nos ajudar nesta caminhada.
 

Eclipsisboy

UM PASSADO ÍMPAR E UM FUTURO RISONHO! 💙🤍
25 Maio 2014
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Porto
  • Pinto da Costa
  • Campeão Nacional 19/20
  • Taça de Portugal 19/20
Três horas da manhã e sem conseguir dormir.. dói, dói muito mesmo. É como se uma parte de nós ficasse vazia.. um vazio dificil de preencher! 😓💙🤍

Que nunca nos esqueçamos que aqueles filhos de uma grande puta da capital nem uma nota de pesar nos endereçaram. Não que precisemos deles para alguma coisa, que cagamos de alto a baixo para eles, mas que fique essa nota bem
Gravada em nós. Em todos nós. Desde o presidente ao adepto! 💙🤍
 

Teófilo Cubillas

Tribuna Presidencial
25 Maio 2013
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Como alguém já aqui disse, de vergonha devem corar aqueles que empurraram um homem doente para uma batalha com derrota anunciada, principalmente após o que se viu na famigerada AG. Chuparam o homem até ao tutano.

Na minha opinião, o final do PdC fica marcado por esta influência nefasta, de quem o venerava apenas para sacar mais uns cobres, sem se preocupar minimamente com ele.
 
Última edição:

Dagerman

Tribuna Presidencial
1 Abril 2015
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As únicas duas vezes que comprei o jornal A Bola foi nas duas vezes que o FC Porto goleou as galinhas por 5-0 no Dragão. Amanhã vou comprar outra vez.
Diga-se a verdade, os cabrões da Bola nestes momentos têm uma postura institucional que temos de louvar: se morre um grande do futebol nacional, eles dão-lhe honra de capa inteira, independentemente de ter sido ou não do clube deles. Pena não serem tão imparciais assim nos outros 364 dias do ano.
 

lexx4point0

Arquibancada
17 Março 2013
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Apesar do que aconteceu durante os últimos anos, o seu legado é inegável. Vivi o FC Porto e o JNPC foi praticamente o único presidente que conheci, e apesar de criticar e muito a sua gestão nos últimos anos e acreditar que deveria ter saído por volta de 2010 a 2012, o que conquistou para o nosso clube é algo só o Bernabeu e o Florentino Pérez conseguem replicar.
 
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netkill

Arquibancada
2 Dezembro 2017
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Agora com os olhos mais secos mas ainda vermelhos de chorar a morte de uma figura enorme do nosso Clube, consigo escrever algumas palavras.
Recordações, diga-se.
A primeira recordação foi da derrota na Taça das Taças de 84. Com 6 anos iniciava o meu grande amor por este maravilhoso Clube. Que você, presidente, elevou a um outro nível. Daqui foi sempre a subir.
Não acompanhava no estádio porque o meu pai sempre foi de ficar em casa com o ouvido colado no rádio a ouvir os relatos.
Aquela final de 87... depois de estar a perder por 1-0 e virar o resultado. Lembro do meu pai a bater no sofá no golo do Juary, a minha mãe a pôr água na fervura porque "o Porto ainda não ganhou; o jogo não acabou". O dia seguinte era dia de passeio da escola. Que alegria, estavamos todos elétricos. Um passeio logo depois de uma grande vitória do NGC! Eu não parava de gritar para os meus colegas de turma "Na segunda parte o Porto é que mostrou a sua raça!". Grande vitória presidente!
Depois veio a supertaça europeia contra o Ajax, com a taça intercotinental pelo meio. Jogo de madrugada, o que me fez ficar com raiva de ainda não ser adulto. Só o meu pai teve direito de ficar a assistir. Mas lá arranjei uma vontade de ir à casa de banho a meio da noite para dar uma espiada. "Como é que está?", "Estão empatados; volta para a cama".
No dia seguinte a alegria de saber a vitória. Mais uma presidente!
Ganhamos a supertaça ao Ajax e o NGC seguia firme, enquanto uma grande parte do país espumava...
Lembro-me do retorno do Futre a Portugal porque os vermelhos foram comprá-lo. No dia da apresentação do jogador no estádio da 2a circular, eu andava para lá e para cá no meu quarto, esbravejando contra si, presidente... "não entendo como o Porto não tem 500 ou 600 mil contos para dar pelo Futre; como deixamos o gajo ir para lá" reclamava eu. Mas eu era jovem, o presidente já tinha experiência e no fim das contas nós continuamos a ganhar e os vermelhos foram-se afundando no campo de jogo e nas finanças.
Lembro-me de o ver reclamar por termos de ir jogar á capital do império como você dizia, porque aparentemente não havia mais estádios no país para se jogar uma taça ou supertaça.
A única vez que me cruzei consigo foi quando fui comprar o bilhete para o meu primeiro jogo ao vivo. Foi um jogo da taça contra os vermelhos. Era pré adolescente e aproveitei que estava nas Antas para dar uma caminhada por ali e para minha surpresa, vejo o presidente a sair do estádio, a pé, a vestir um casaco, provavelmente para a sua hora de almoço. Eu fiquei mudo olhando para si. Não acreditava que estava a vê-lo pessoalmente. Alguns que por lá andavam falavam palavras de apoio "muito bem presidente", "vamos!".
Lembro-me de o ver tantas e tantas vezes no banco a acompanhar os jogos, e pensava orgulhoso "nenhum presidente de outro clube faz o mesmo; o nosso é diferente". Ás vezes o presidente não resistia e demonstrava alguma emoção e lá vinham umas moedas da bancada. E lembro-me de uma vez as câmaras mostrarem o presidente a apanhar, e bem, uma dessas moedas do chão.
Aqueles 5-0 na luz para a supertaça, que loucura presidente!
A penhora da retrete das Antas. Como esquecer o "se estiver aqui uma bomba, eu espero que ela exploda"? Impagável.
Adorava a sua ironia. Os rivais espumavam-se, familiares e amigos de outras cores clubísticas vinham falar comigo e criticavam. Eu adorava. O presidente ia contra o sistema. Afrontava os poderes instalados. E com piadas pelo meio!! Espetacular! E muita gente nunca lhe perdoou por isso.
E muitas outras vitórias fantásticas que o presidente nos proporcionou.
Lembro-me de já adulto e com idade para ter juízo, a atirar-me para o chão do café no golo do Derlei na taça uefa. Mais um título internacional presidente! E no ano seguinte mais um, carago! E depois tomar um calmante com as mãos a tremer antes dos penatis contra o Once Caldas. Mas valeu a pena presidente. Trouxemos mais um título internacional.
Depois a época do treinador Villas Boas. Que espetacular foi esse ano!!
Enfim, são muitas boas lembranças.
O presidente partiu mas espero que do meio desta tristeza saia uma nova união de todos os Portistas.
Porque o sistema está aí para nos f... se andarmos ás cabeçadas uns aos outros, não temos como fazer frente.
Muito obrigado pelos momentos que frequentemente recordo e me deixaram feliz.
Agora descanse e assista de camarote ao ressurgir do NGC que tanta amava. Porque tenho a certeza que vamos voltar a ser o Porto a que nos habituou durante tantos anos.
Viva o F.C. Porto!
:logo💙💙💙
 

chenguanFCP

Arquibancada
26 Maio 2014
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Cântico Negro
Vem por aqui" — dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...

A minha glória é esta:
Criar desumanidades!
Não acompanhar ninguém.
— Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre à minha mãe

Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...
Se ao que busco saber nenhum de vós responde
Por que me repetis: "vem por aqui!"?
Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...

Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.

Como, pois, sereis vós
Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...

Ide! Tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátria, tendes tetos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios...
Eu tenho a minha Loucura !
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...

Deus e o Diabo é que guiam, mais ninguém!
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.

Ah, que ninguém me dê piedosas intenções,
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou,
É uma onda que se alevantou,
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
Sei que não vou por aí!