A polémica em torno dos assessores é reveladora dos problemas que afectam a sociedade. Discute-se ao lado da discussão real, toca-se no acessório, remexendo-se de forma mais ou menos enviesada, mas nada se discute de verdadeiramente relevante. O caso inicia-se logo ferido pelos tribalismos que bem conhecemos, típicos das redes sociais e que ameaçam extravasá-las. Choque, o vereador Rui Tavares contratou 9 pessoas. O tema será instrumentalizado por quem é de determinada simpatia política. Seguindo a mesma lógica, poder-se-ia contrapor algo muito simples: as regras foram propostas por Carlos Moedas; e assim se daria a volta ao problema, atirando-o da esquerda para a direita. Poderíamos também continuar o raciocínio, notando que a proposta de Carlos Moedas quanto às verbas concedidas aos vereadores da CML replica as propostas de Medina e Costa. De facto podemos dar círculos argumentativos por aqui, não sendo coisa particularmente inteligente.
Note-se também como o facto de se tratar de 8 ou 9 pessoas, que na realidade ganham tanto como aufeririam 4 ou 5 em full-time, é empolado. Irrelevante, pois o que interessa é a dimensão do orçamento. Podiam ser 20 a ganhar o mesmo que 4... de nada interessaria, pois a organização do trabalho cabe ao vereador, conforme as possibilidades que lhe foram facultadas. Estupidez.
Coisas relevantes que deveriam ser conhecidas: a natureza exacta das funções de um vereador, ou dos vários tipos de vereadores. As suas funções são suficientemente complexas a ponto de justificarem apoio? A CML e outros orgãos municipais dispõem de recursos humanos que poderão, mediante outra organização do pessoal, prover as necessidades de apoio? A haver apoio, como o deveremos enquadrar?, que verbas dispensar?, que critérios ter em consideração?, será o trabalho de um vereador em Lisboa ou no Porto semelhante ao trabalho de um vereador de uma autarquia com poucos milhares de habitantes?, será importante que o vereador possa recrutar pessoas em quem confia e com quem partilha visões, pensamentos, crenças... ? O que diz a lei actual sobre estas questões?, será suficientemente clara?, poderá ser melhorada?, densificada? Que remunerações deverão ter os agentes políticos? Não fará sentido dar as melhores condições possíveis a quem dirige os destinos do país?, que condições serão essas? deverá um vereador acumular o cargo com o exercício das funções de deputado?, pode um deputado exercer, em simultâneo, a liderança de uma junta de freguesia?, e em relação a ocupações no sector privado?, que limitações?, deve alguém desempenhar funções políticas sem nelas empregar todo o seu tempo de exercício profissional?
Outras coisas que seriam interessantes aferir: a qualidade dos currículos e do trabalho desenvolvido por assessores e a qualidade do trabalho desenvolvido por vereadores.
Problema: debate-se superficialmente e ao lado do que verdadeiramente importa, e fazemo-lo no intuito de marcar pontos para a nossa equipa e não com o intuito de compreender e melhorar o funcionamento do país. É mais fácil travar a batalha tribal do que discutir os assuntos nas suas essências, pois isso requer estudo, conhecimento e uma vontade genuína de ir para além das filiações partidárias. Também é mais fácil actuar como câmara de ressonância de um twitteiro, um podcaster, um comentador... do que pegar num livro ou artigo e ler. E hoje em dia o que não é fácil parece ter poucos adeptos. A opinião tem de ser imediata e sonora, não se procura pensar além de meia-dúzia de chavões e do que nos é apresentado, o conhecimento tem de ser divertido, fácil, rápido... se possível transmitido em resumo, uma breve história da civilização humana, um mapa do pensamento político para pessoas com pressa, um top-10 das personalidades mais importantes de determinada... aceita-se acriticamente o que pessoas terceiras difundem... e a estupidez vai-se instalando. É pena. Mas é o que muitas vezes há. E possivelmente é o tipo de sociedade que nós próprios estamos a estimular.
Outro sinal curioso são os smiles que acompanham os comentários, quando não há capacidade de argumentar, maturidade, disponibilidade ou inteligência suficiente para tal. Algo infantil, além de ser uma demonstração de má-educação. Se não se gosta ou não se concorda, ou responde-se com polidez ou passa-se à frente. Compreendo que não goste ou que discorde, no entanto, se puder ou conseguir elaborar uma resposta, seria mais construtivo. Mas isso desculpa-se, e exige até uma boa dose de compreensão e solidariedade, pois nem todas as pessoas tiveram a oportunidade de receber uma boa educação, estão interessadas nisso ou sequer levam a sua própria imagem a sério.
@incrivel , não se preocupe, colega, sou compreensivo consigo.