O filho secreto de Salgueiro Maia
1.
Andrew tem 39 anos, mas só há doze é que teve um pai.
Cresceu na certeza de que o pai morrera, que fora uma aventura sem consequência da sua mãe Filomena com um homem que pouco ou nada se distinguira.
O miúdo nascera nos Estados Unidos, em abril de 1985. A mãe era portuguesa e ele sabia vagamente o que fora a revolução em Portugal e quem tinha fora Salgueiro Maia de quem a mãe lhe falava em dias de festa.
2.
Já no final da faculdade, numa conversa com uma amiga, confessou te curiosidade para conhecer mais de Portugal, contou-lhe da amizade da mãe com o Capitão Maia.
Viram fotografias do 25 de Abril e a amiga exclamou que Andrew era igual ao herói português.
Nunca lhe ocorrera tal enormidade.
Chegou a casa e perguntou à mãe se Salgueiro Maia era o seu pai. Filomena não lhe conseguiu mentir, contou-lhe do dia em que se conheceram nos Açores e de umas férias em que se encontraram em Lisboa, um ano antes do seu nascimento.
3.
Andrew exigiu ser reconhecido pelo Estado português como filho, exigiu ter o nome do pai, do seu pai.
Preencheu dezenas de papéis, requerimentos, burocracias.
Visitou a campa do pai em Castelo de Vide.
Apareceu de surpresa na Associação 25 de Abril para conhecer Vasco Lourenço que o abraçou de lágrimas nos olhos.
Arranjou um advogado e levou tudo a uma juíza de Santarém que aceitou fazer a exumação do cadáver para ser poder realizar uma prova de ADN que tudo confirmou.
Ao fim de doze anos finalmente provara-se o que não tinha discussão.
Só que a juíza pediu muitas desculpas por ter de anular o pedido.
Não por ter dúvidas na prova irrefutável, mas porque os prazos tinham sido ultrapassados pelo requerente.
4.
O tempo continua a passar.
O filho de Salgueiro Mais tem 40 anos, o seu advogado morreu e Andrew contratou outro que dá agora voltas à cabeça para perceber como pode ultrapassar este novelo sem sentido.
Provou-se que é filho do seu pai, mas a burocracia impede-o de ser reconhecido.
Fernando Salgueiro Maia gostaria decerto de saber que o seu filho André não desiste de si.
Ao contrário do Estado português que deixou Salgueiro Maia morrer quase na miséria, o seu filho não o esquece…
… apesar de ter sido esquecido.
Texto de Luís Osório.