27 de Maio de 1987.
Esta data tenho-a escrita a ouro nas minhas memórias. Custa entender como é que já foi há 32 anos!
Parece que ainda foi ontem. Mesmo!!
Tinha 10 anos e vivi esse dia com uma electricidade que não me deixava parar quieto.
De manhã fui para a escola, com um fato de treino azul, com o brasão abençoado cosido no peito, pela senhora minha Mãe.
Ah, vivia (e vivo ainda) em Lisboa, por isso era natural ouvir algumas bocas na rua enquanto ia para a escola. Curiosamente de pessoal mais velho, provavelmente pais de colegas meus, pessoas com idade para ter juízo e não provocar uma criança que estava à beira de viver um sonho.
Na escola, os miúdos estavam todos pelo Porto e desejavam-me sorte. Nos intervalos os jogos eram todos Porto Vs
alemões e todos queriam ser do Porto.
À tarde fui ao dentista que ficava perto da Av. da República (não me lembro se já lá estava a casa do FC Porto) e havia uma varanda com uma bandeira do Porto:
- "Olha mamã, aqueles ali são do Porto!!!"
- "Ah ah, logo é que eles vão ver. Vão levar poucas do Bayern, vêm de lá com o rabo entre as pernas" - responde-me um filho da puta que passava por nós nessa altura.
A minha mãe, que sempre foi discreta e não se mete em confusões perguntou-lhe se era idiota ou só mesmo parvo, por dizer isso a uma criança. Eh eh, quem foi com o rabo entre as pernas foi ele, lampião de merda.
Começa o jogo e além dos meus pais e irmãos, estão lá amigos dos meus irmãos, nossos vizinhos.
1 lampião e 2 lagartos.
Aquilo começa mal, o Koegl marca e ficamos um bocado desmoralizados. Chega o intervalo e vou-me fechar no meu quarto a comer um Corneto de Morango, que a minha Mãe me tinha comprado para festejarmos a vitória. Mas os nervos não me deixaram aguentar. O lampião foi para casa, provavelmente para festeja a nossa eventual derrota.
Recomeça a final e caímos em cima dos alemães. O Futre finta meia duzia de germânicos e em vez de passar, tenta o golo à Maradona. A casa quase que vem abaixo.
Continua o jogo. Ouve-se na televisão:
"água mole em pedra dura, tanto bate até que fura. Mas desta vez não fura..." O Frasco mete a bola no Juary, o Pfaff sai-se ao brasileiro que cruza para a pequena área, a bola aproxima-se e o Deus da bola marca o golo mais mítico da nossa história. "Madjer, de calcanhar imaginem!!!", grita o António Pedro na Antena 1.
Foda-se, todos saltamos, o meu pai manda o candeeiro do tecto com o caralho, ao saltar de braços no ar.
Calma, ainda Só estamos empatados.
"Mlynarzick dá para Celso. Celso, levanta à esquerda, minha gente, Está sozinho!!, vai para grande área Madjer, vai simular, outra finta.... GOOLLLOOO!!!!GOOLLLOOO!!!!GOOLLLOOO!!!!" Foi assim o relato do 2º golo na Antena 1,
"Reviravolta feita, espectáculo no Prater".
Mandámos a casa abaixo. Todos no ar, todos a abraçar-nos. O Vizinho lampião devia estar com a mesma cachola dos alemães.
Passei o resto do jogo à janela, a agitar uma bandeira azul e branca com 2 metros de pano (eu devia ter 1,20 Mts, na altura).
À janela, os meus amigos da rua gritavam todos pelo Porto.
Chorei esse tempo todo, sem perceber porquê. Aprendi nesse dia que também se chora de felicidade.
Quando o jogo acabou, vi a entrega da Taça ao João Pinto e disse ao meu pai que ia para a rua ter com os meus amigos.
começou-se a juntar mais gente (tudo lamps e lagartos) e andamos a correr o bairro todo a gritar PORTO!! Cheguei a casa à meia noite, porque o meu pai achou que já era demais para uma criança de 10 anos e que no dia a seguir ia ter aulas. Em casa, abrimos a essa hora uma garrafa de champanhe para festejar. Na televisão o João Pinto ainda andava agarrado à taça
No dia a seguir levei um cachecol ao pescoço e toda a gente dava-me os parabéns. Na escola era só eu e uma outra colega, que conheci nesse dia.
Da parte da tarde, tive que voltar para casa, porque tinha 39º de febre e a garganta feita num oito.
Ainda hoje me arrepio ao ver as imagens e ao ouvir o relato do jogo (nos meses seguintes devo ter visto o jogo e ouvido o relato da Antena 1 mais de 100 vezes).
Foi sem dúvida dos dias mais felizes e marcantes que tive. Escrevi este texto com lágrimas no olhos, tal é a emoção que guardo deste dia.
Sim, ser Portista também é doença, mas das boas!!!