Não se pode negar que na prática, houve regimes autointitulados comunistas que frequentemente suprimiram liberdades individuais em nome do coletivo e da unidade do Estado, o que contribuiu para essa perceção do “apagamento do eu”, como referes. Mas por outro lado, tens diversas correntes de pensamento dentro do comunismo que criticam a forma como a ideologia foi aplicada, até porque para Marx o comunismo não eliminaria a individualidade, mas ia realizá-la na sua plenitude. Marx desenvolveu toda a sua análise crítica ao capitalismo e teoria económica na segunda metade do séc.XIX. É completamente estúpido pensar-se que o próprio Marx, se fosse vivo nos dias de hoje, não adaptaria o seu trabalho ao contexto atual. Seria o primeiro a dizer que abolir o capitalismo de um dia para o outro seria um ato criminoso que condenaria à morte milhões de pessoas, por exemplo. Marx, tem mau marketing, mas era alguém bem à frente do seu tempo e que fez uma crítica absolutamente brilhante ao capitalismo
Eu desde muito cedo que comecei a questionar tudo à minha volta e todas as normas que me impunham e que me rodeavam. Sempre fui um aluno exímio, mas detestava quase tudo no sistema escolar. Trinta crianças ou adolescentes, todos diferentes, com capacidades de aprendizagem diferentes, com infâncias diferentes, de meios diferentes, contextos diferentes, todos a aprender da mesma forma, com horários rígidos, cargas horárias desadequadas, fechadas numa sala, todos a serem formatados para se tornarem alunos do mesmo tipo num sistema de ensino que suprime a individualidade e destrói a curiosidade. Um ensino que não fomenta o pensamento crítico e que cria pessoas obedientes para se tornarem trabalhadores obedientes.
Não há sistema que promova tanto a instrumentalização da pessoa e elimina a individualidade como o atual. Acordamos de manhã, as crianças vão para a escola, os pais vão para o trabalho, saem ao final da tarde, vão levar as crianças a atividades extraescolares como o desporto ou a música, chegam à noite, passam ali 1h juntos e termina o dia, num rotina interminável. Se isto não é exploração do indivíduo...
Tenho dificuldade em entender e aceitar sociedades que são construídas de cima para baixo. Vivemos em sociedades democráticas, mas até um certo ponto, sob o jugo de normas que não questionámos e máquinas de propaganda sofisticadas que nos fazem acreditar que aquilo que pensamos sobre algo partiu da nossa mente, mas na realidade nos foi implantado sem percebermos.
Por isso acho que nunca nos devemos contentar com um determinado tipo de sociedade e procurar sempre progredir e melhorar o que podemos melhorar para tornar a experiência neste planeta o melhor possível para todos e não apenas para uma pequena percentagem de sortudos. Acredito mais em sociedades geradas de baixo para cima, a partir do nível local onde as pequenas comunidades têm perfeita noção do seu contexto e do que precisam e que o estado deve servir apenas para garantir que ninguém fica para trás, que todos jogam 'o jogo' de forma justa e garantir segurança contra ameaças externas. Infelizmente, acho que caminhamos para sociedades mais autoritárias e que vão acabar por criar desigualdades muito maiores e sociedades altamente tecnológicas, mas menos justas. Espero estar errado.