CARO FC PORTO, MAIS VALE UMA EQUIPA À DERIVA DO QUE UM CLUBE SEM RUMO
Bem antes de se sentar no cadeirão como presidente do FC Porto, já André Villas-Boas conhecia de cor os bancos como treinador em diversas latitudes. E o mesmo vale para Jorge Costa, agora diretor para o futebol.
Só alguém menos avisado imagina que, a esta altura do campeonato, ambos não estejam cientes das virtudes e defeitos de Vítor Bruno e da sua equipa técnica.
Saberão que, quando exposta a adversários de um nível mais exigente, a primeira linha de pressão funciona mal e a organização defensiva é caótica – como se viu contra Benfica, Sporting e até Bodo Glimt. Já terão notado a intranquilidade, provavelmente resultante da ausência de um líder natural em campo, que resulta em imensas dificuldades de conservar vantagens mínimas, ficando a equipa permeável, quando não nas transições, a qualquer cruzamento ou bola parada – como se viu com Lazio, Manchester United e até Sp. Braga. Terão também presente que, apesar das debilidades defensivas, quando o nível do adversário baixa, existem ideias e talento de sobra lá na frente para abrir blocos baixos, algo que era uma raridade, por exemplo, na época passada.
Nesse sentido, Vítor Bruno – que, sublinhe-se, custa sete vezes menos – tem sido uma espécie de Conceição ao contrário: forte com os fracos, fraco com os fortes.
Noutros, também. Conceição, que esta sexta-feira completou 50 anos, era, para o bem e para o mal, bem mais do que um treinador. Tinha capacidade de intuir e compensar as deficiências de uma estrutura disfuncional, que só não desabou mais cedo por sua causa. Por outro lado, chamava a si aspetos que não lhe deviam caber, fazendo depender do seu humor a política de contratações e até condicionando a planificação estratégica da marca.
Esse FC Porto vivia sob o garrote financeiro da UEFA, em permanente risco de exclusão das provas europeias, numa deriva financeira que o levou à falência técnica e ao risco de continuação da atividade – nota que aparecia sucessivamente nos Relatórios e Contas. Esse FC Porto, recorde-se, contratava jogadores por impulso e vendia em desespero. Antes de Villas-Boas, que acaba de anunciar uma solução a longo prazo para refinanciar o passivo negociada pelo CFO José Pereira da Costa, a SAD sobrevivia de empréstimos com juros usurários, pagava comissões predatórias e distribuía benesses imorais.
Ora, essa pirâmide de interesses começou a ruir há um ano, aquando da infame Assembleia-Geral de alteração de estatutos, cuja relevância criminal viria a dar origem à Operação Pretoriano.
Foi deste ponto de partida que Villas-Boas partiu para reconstruir o clube, depois de ter vencido as eleições a 27 de abril.
Chegados aqui, o presidente portista teve agora a sua primeira prova de fogo, tendo até gerido mal o silêncio no final do jogo – faria mais sentido deixar uma mensagem curta aos adeptos a viva-voz, conferindo o peso devido ao desaire histórico.
Ainda assim, apesar da embaraçosa exibição na Luz, contrastante com a forma exímia como Conceição preparava os jogos de nível de dificuldade elevado; dado o contexto de desnorte pré-eleitoral, a continuidade de Vítor Bruno, por muito relevante que seja, soa agora a problema de primeiro mundo.
Mesmo considerando que se trata do funcionário mais importante de uma estrutura de futebol, feliz do FC Porto quando, após um muito bom mercado de transferências e num processo de sólida recuperação financeira, a preocupação mais latente da atual Direção é tentar perceber se cometeu ou não um erro de casting e ponderar um eventual timing para o corrigir.
Dores de crescimento? Ano zero? Mesmo que assim seja, a conjuntura pode mudar-se num ápice. A debilidade estrutural iria provocar danos bem mais profundos.
Colocando em perspetiva, o momento pode resumir-se isto:
Caro FC Porto, mais vale ter uma equipa pontualmente à deriva do que um clube absolutamente sem rumo.
Artigo de Sérgio Pires no MaisFutebol.
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