A mim sinceramente o que mais me entristece nem são os roubos em si. É a inércia do clube perante os mesmos.
O silêncio de alguém que está agarrado ao poder e sabe que os resultados desportivos podem ser decisivos nas próximas eleições, é algo que me ultrapassa.
Aproveito a deixa — e desculpa o desvio.
Acho que qualquer dúvida que pudesse subsistir sobre esta questão tem de estar esclarecida.
Apenas nos últimos meses, Pinto da Costa e/ou a sua Administração:
- Promoveram uma Assembleia-Geral Extraordinária que visava alterar o processo eleitoral do Clube através de provisões que enfraqueciam a sua segurança, transparência e idoneidade; exonerar práticas de gestão equívocas e clientelizar um grupo organizado de adeptos.
- Obstaram ao funcionamento eficiente e ordeiro da Assembleia-Geral através de falhas de organização graves.
- Assistiram impassíveis a múltiplos insultos, intimidações e agressões dirigidos a adeptos que aparentemente discordavam das propostas a votação — impedindo inclusivamente a intervenção da polícia à entrada do pavilhão.
- Toleraram e desvalorizaram o comportamento dos agressores, corroborando uma radicalização das suas posições que, em última análise, terá contribuído para ameaças e agressões digiridas a André Villas-Boas.
- Recuperaram pela terceira vez a promessa eleitoral de construção de uma nova Academia, cuja viabilidade foi desde logo condicionada pela Câmara Municipal da Maia.
- Avançaram com uma operação de maquilhagem de contas que não alivia as responsabilidades de tesouraria da SAD, possivelmente agravando-as.
- Anunciaram a intenção de antecipar receitas a médio/longo-prazo através da venda de uma participação na Porto Comercial, inibindo a capacidade de futuras Administrações procederem à recuperação financeira sustentada do clube.
- Lançaram uma campanha profissional de astroturfing nas redes sociais.
- Passaram a integrar um indivíduo que há 4 anos os acusava publicamente de gerirem o clube de forma incompetente e nepotista.
- Copiaram vários pontos da campanha eleitoral de André Villas-Boas, numa tentativa de confundir e saturar o eleitorado, reduzindo a perceção de diferenciação entre as candidaturas.
- Promoveram entrevistas em prime time e um documentário numa plataforma de streaming.
- Agendaram as eleições para uma data que favorece a supressão de voto.
É óbvio que Pinto da Costa está extremamente investido em ganhar estas eleições.
Tanto que está disposto a atropelar boas condutas, engolir sapos, desdizer-se, fazer demogagia, hipotecar o futuro do clube.
Regressando à tua questão: Porque é que alguém que está disposto a tudo isto não está disposto a atacar arbitragens, ou a criticar as estruturas do futebol português em geral?
Algo que, aliás, Pinto da Costa fez de forma sistemática, implacável e corrosiva durante décadas?
Como refereres, todos os esforços que elenquei acima seriam desnecessários caso a performance desportiva do clube fosse positiva!
Mesmo o mais radical opositor de Pinto da Costa reconheceria que, apesar de todos os estigmas que pendem sobre a sua gestão, qualquer esforço de oposição seria fútil se o FCP ainda retivesse uma posição hegemónica em Portugal.
O maior trunfo que Pinto da Costa poderia usar em Maio seria uma equipa apontada ao título.
Com a época em curso, a maior arma que Pinto da Costa poderia usar para garantir esse objetivo seria mover todo o peso institucional e mediático do clube — jornada após jornada, sem olhar a repercussões futuras — para, no mínimo, garantir boas arbitragens.
Nada.
Até agora, esta omissão ainda podia ser justificada por inépcia.
De alguma forma, com muita condescendência, poderia fazer sentido preservar a imagem de um Presidente gasto e chamuscado por inúmeros escândalos, transferindo-se a defesa pública do clube para Jesualdo Ferreira, Vítor Pereira, Julen Lopetegui, Jota Marques ou Sérgio Conceição.
Teria sido uma estratégia errada: frágil, com potencial de exposição limitado e com custos desportivos elevados. Mas, presumivelmente, assentaria pelo menos na defesa dos interesses do clube.
No contexto atual, não vejo margem para dúvidas:
Pinto da Costa não ataca arbitragens porque não pode.
Na posse das suas faculdades mentais, despeitado, a lutar pela sobrevivência do seu legado, Pinto da Costa não é capaz de tomar a atitude prática que mais contribuiria para o seu objetivo.
Não o faz porque simplesmente não é uma opção viável. Como era nos anos 80, 90 e 2000. Como não foi nos últimos 15 anos.
Mais do que os motivos que nos trouxeram até este ponto, estou preocupado com as consequências geracionais desta omissão:
O FCP é um clube condenado a definhar na ausência de uma política comunicacional ativa, agressiva, autoritária.
Porque está inserido num contexto em que os principais meios de comunicação social estão distantes e adotam linhas editoriais ostensivamente hostis para com o clube, colocando-o intrinsecamente em desvantagem no tribunal da opinião pública;
Porque a revolta e a insubordinação são sentimentos viscerais no ethos do clube. Como em qualquer organização, o potencial de mobilização da massa adepta do FCP é maximizado quando são invocados os valores que permearam a sua história e alavancaram o seu êxito.
Isto não significa perpetuar um discurso disperso contra o centralismo, alienando o nosso crescimento para além do Norte.
Significa cavalgar sobre todas as oportunidades concretas de ataque aos adversários. Significa criticar, expôr, denunciar com incisividade e inteligência. Significa unir todos os adeptos em torno de uma identidade combativa.
O FCP nunca vai ser o clube querido da nação, mesmo que um dia venha a ter maioria de adeptos no país. As instituições portuguesas nunca verão no clube um expediente de política de coesão territorial, como no caso do SLB.
Por isso, o nosso caminho de consolidação, minado ao longo dos últimos anos, requer muito mais competência.
Requer, primeiro, que recuperemos a voz.