"...se uma piada for feita por muçulmanos q goze como os ocidentais se vestem qual o mal? Qual? Uma piada q brinque com as nossas idiossincrasias e maneirismos, qual o problema?"
Caríssimo, para quê criar um caso hipotético quando temos este concreto. Sendo uma pessoa inteligente, depreendo que consiga colocar-se na posição de alguém que envergue a sua indumentária por motivações culturais, religiosas, identitárias, ... as que forem, e que seja capaz de admitir a possibilidade de o visado não ficar particularmente satisfeito com a pirraça. Uso estas roupas por esta ocasião importante ou por ser a norma (porque não, sê-la-á em muitas comunidades... ), tal como milhões de outras pessoas, e sou caricaturalmente visto como um bruxo. Deve colocar a possibilidade de poder haver algum mal. Não para os que acham piada, claro.
Porque se apresenta Zaidu como "Professor Zaidu, Grande médium vidente blá blá blá... "? É pela roupa? Por ser africano? Pela cor da pele? Pelo nome? Por tudo, pelo "boneco"? A piada não tem que ver com idiossincrasias e maneirismos (nada se apura quanto isso pela imagem), mas sim com os atributos pessoais, de natureza biológica e cultural, que são identificáveis na fotografia. É mesmo pelo "boneco". ... Não é o meu tipo de humor, confesso.
Depende da piada, depende do que estiver em causa, depende de qual for o gozo. Uma coisa é vestir mal e gozar alguém por ser ou pretensamente ser um maltrapilho, outra, por exemplo, é pegar em roupas com significados relevantes e reduzi-las às imagens mais primárias que vêm à cabeça. Se um muçulmano, um judeu, um hindu... resolver arriscar uma piada digamos... "pouco sofisticada"... sobre os valores religiosos de um cristão, não é legitimo que este se sinta ofendido? E que alguém diga... pois, isto pode ter graça para uns, mas outros poderão interpretar a coisa de outro modo... ?
Mas repare que apenas expressei as minhas reservas quanto ao bom gosto da associação e ao mérito da piada, achando-a algo insensível. E, pior ainda, desprovida de piada, acrescento. Não ando a pedir para que seja censurada. Longe de mim. Por outro lado, também não virá mal ao mundo por abordar esta perspectiva. Julgo que me é legítimo fazê-lo.
Até o humor se adapta aos valores do tempo. Por incorporá-los e ser deles expressão. Há certos temas e piadas que se ouvem menos, embora a natureza do humor permita ampla liberdade de expressão. Por recorrer a estereótipos, caricaturas, preconceitos, reduções ou generalizações... umas mais inofensivas, outras mais negativas... acaba por suscitar polémicas. O humor tem enorme potencial ofensivo e ofenderá sempre alguma sensibilidade. Por vezes a ponto de cair em desuso, sendo efectivamente alvo de censura social (o que revela que nem tudo é aceitável mesmo sob o chapéu do humor). Noutras é tolerado. Em todo o caso, é natural que tudo seja discutido. Também não nos podemos alhear por completo, encolher os ombros perante tudo e limitarmo-nos a dizer... é apenas uma piada, independentemente do conteúdo.
Sobre o entorno politiqueiro... não me alistei na polícia da língua e dos costumes nem faço planos de tal. Existem actual e efectivamente, entre certos sectores ligados a temas e activismos sociais, tendências extremadas e de fechamento social. Que, a meu ver, hostilizam e afastam ao invés de aproximar. Não simpatizo. Tão pouco simpatizo com quem rasga as vestes contra o "politicamente correcto" ou enche a boca com os "marxismos culturais" e outra bobeiras do género. As palavras que usamos, as imagens a que recorremos... não são inócuas, veiculam valores, ideias, concepções do mundo... e nada se perde em ponderá-las. Não seria a primeira vez que concluiríamos que esta palavra... que aquela graçola... que isto realmente talvez não seja o mais adequado. Acontece.
... mas pode estar descansado que não pretendo moldar o mundo às minhas percepções nem impor os meus pontos de vista.