Vacinar alguém que já esteve infetado reforça a imunidade da pessoa. Até porque os níveis de anticorpos produzidos em resposta à infeção também diminuem ao longo do tempo (apesar da imunidade conferida pelos anticorpos não ser a única forma de imunidade).
Extremismos são abomináveis, tanto de um lado, como de outro, concordo com o que dizes. E é normal que as pessoas se questionem, e tenham dúvidas, é compreensível. E é de salutar que essas mesmas pessoas perguntem, queiram ser esclarecidas. Ao invés de debitarem verborreias que lêem nas redes sociais, de páginas muitos duvidosas.
No entanto, o texto que postaste, escrito por aquela senhora, revela desonestidade da autora. E algumas afirmações são facilmente desmontadas.
Primeiro, a necessidade de fazer a apologia de um suposto status que a profissão dela confere, acima dos restantes mortais, e, de forma demagoga, criar um cenário de vitmização e empatia.
Não entrando muito em detalhe sobre tudo o que ela escreve, vou só realçar algumas afirmações que, ou revelam uma falta de conhecimento, ou têm então outro propósito.
- "... uma estratégia de vacinação como a principal esperança e arma para debelar a pandemia por SARS-CoV-2, um vírus respiratório, mutante, como são os vírus de RNA, pertencente a uma espécie de coronavírus para qual nenhuma vacina teve anteriormente um desempenho seguro e eficaz.".
Por onde começar. Os vírus de RNA são mutantes sim, como os de DNA, por exemplo. É verdade que os vírus de RNA mutam mais que os de RNA, no entanto, dentro dos vírus de RNA, o SARS-CoV-2 (mas também o SARS ou o MERS) têm capacidade de reparar danos (mutações) que ocorram durante a sua replicação e por isso a taxa mutacional destes vírus é mais baixa que os outros vírus de RNA, como o influenza (vírus da gripe. Por isso é que a vacina da gripe é de toma anual, porque tem de ser atualizada para as várias variantes, ou mutações, do vírus influenza que são criadas de um ano para o outro).
Depois, quando diz "pertencente a uma espécie de coronavírus para qual nenhuma vacina teve anteriormente um desempenho seguro e eficaz", só mostra o quão longe ela está de saber o que diz. Espécie de coronavírus? O SARS-CoV-2 por si só é uma espécie de coronavírus, o MERS é uma espécie de coronavírus... Eu percebo o que ela quer dizer, mas SARS-CoV-2 não pertence a uma espécie de coronavírus. O SARS-CoV-2 é uma espécie, que pertence à classe dos coronavírus. O que ela queria dizer aqui era que nenhuma vacina teve um desempenho seguro e eficaz contra vírus da classe dos coronavírus. Mas nem isso é verdade. Ou melhor, é desonesto dizer-se isso. Porque existiram de facto vacinas seguras e eficazes contra o SARS (o de 2003) e contra MERS, que entraram em ensaios clínicos, mas foram abandonadas sabem porquê? Porque estas epidemias (epidemias, não pandemias) surgiram em regiões localizadas da Ásia e do Médio Oriente. E como a sua transmissão era muito mais baixa que o SARS-CoV-2, mantiveram localizadas e longe da Europa, ou dos EUA. Ou seja, não afetou as grandes economias, não parou o mundo, ficou lá longe, "não é problema nosso". Ou seja, ninguém se preocupou em financiar ainda mais o desenvolvimento de uma vacina, que, recordo, eram eficazes e seguras. Por outro lado, foi possível "irradicar" estas epidemias em relativamente pouco tempo, e por isso não adiantava mais estar a desenvolver uma vacina.
- "As vacinas criadas em tempo recorde...".
Pensei que este argumento já não era usado, mas pelos vistos é preciso recordar que as vacinas de mRNA estão a ser desenvolvidas para cancro há 20 anos!
- "As vacinas não são esterilizantes, não impedem o contágio nem a transmissão...".
Isto é do mais baixo que pode ser dito, por uma supra sumo, médica vejam lá. Dos dados que existem, pode-se dizer que as vacinas podem impedir de facto a transmissão, sim. E consequente, o contágio. Para já nem falar do cenário que se observa no mundo real, na diminuição da doença grave, dos sintomas. É fácil observar no Worldmeters, estamos a ter cada vez menos mortes diárias, há um ano que não tínhamos estes números. E, apesar de que uma morte que seja, já é uma morte a mais, e de que não se devem encarar estes números como apenas isso, números, eles são a provade que efetivamente a vacinação funciona.
Agora, uma explicação mais científica para o que esta senhora afirmou. Sabe-se que estar doente é mais contagioso que do que não estar doente, precisamente por causa da sintomatologia. Se a vacinação minimiza ou elimina a sintomatologia, ou seja a doença, a transmissão num vacinado irá ser portanto muito menor. E mesmo as pessoas vacinadas que sejam infetadas e apresentem sintomas, podem transmitir mas a uma taxa menor. Porquê? Porque a vacina é especialmente eficaz a induzir uma resposta de uma classe de anticorpos específica, os IgGs. E esta reposta de IgGs protege da infeção pulmonar, ou seja, da infeção grave e sintomática. E se protege, menos sintomas, menor capacidade de transmissão. Ou seja, uma pessoa até pode ser contagiada, mesmo vacinada, mas nem saber. E sem sintomas, apesar de estar infetada, ou seja, de ser detetado material genético viral nos testes PCR, irá transmitir menos o vírus, ou até nem transmitir.
Por outro lado, lembram-se que, na altura em que começaram a sair os primeiros resultados dos ensaios clínicos de fase II/III das vacinas, a eficácia destas situava-se na ordem dos 95% (as de RNA) para doença grave, sendo que com a variante delta possa ter baixado um pouco para os 80/90%. Ora, parece que as pessoas se esqueceram disto (aliás, no início toda a gente tinha bem presente a percentagem de eficácia das vacinas e todos queriam as de RNA e tal), e assumem que a eficácia é de 100%. Não é! Mas façamos esta estimativa: transferindo estes valores para uma escala populacional, por exemplo, o número de vacinados completos no nosso país, que atualmente são cerca de 8,8 milhões de pessoas. Se considerarmos o cenário mais otimista, pré variante delta (eficácia de 95%), existiriam ainda assim cerca de 5% de pessoas para as quais a vacina não tinha qualquer eficácia, ou seja, 440 mil pessoas que não estariam protegidas! Isto no cenário mais otimista. Se considerarmos a variante delta, atualmente dominante, este número aumenta para 1,32 milhões de pessoas. Ainda há muita gente suscetível mesmo com vacinação completa. E mesmo assim, mesmo com 80% de eficácia, estas são das vacinas mais eficazes alguma vez produzidas!! A vacina da gripe não atinge nem de perto estes valores.
Vejamos, mesmo com um aumento do número de casos para a ordem dos 2000/3000 mil/dia durante os meses de junho, julho e agosto, o número de internados em UCI manteve-se relativamente baixo, não seguiu a tendência do aumento de casos. Ora, o que poderá explicar isto senão a vacina?
E tendo em conta que não existe, e não irá existir, nenhuma forma de prevenção mais eficaz que esta, é a nossa única hipótese.
- "Apesar dos números sem precedentes de reações adversas, não tem havido interesse das autoridades do medicamento em promover uma farmacovigilância ativa, ou em tornar obrigatória a notificação de mortes ocorridas nos primeiros 15 dias após vacinação"
Número sem precedentes de reações adversas?? Que tipo de reações adversas? O mesmo tipo de reações que se observa numa vacina da gripe, ou do tétano? E porque é que talvez o número absoluto de reações adversas é maior do que para outras vacinas? Porque há muito mais gente a sser vacinada para Covid-19 do que para outras doenças. Agora, será que o número relativo de reações adversas é assim tão diferentes das outras vacinas? Gostaria de ver a D. Teresa apresentar esses números, se os tiver.
Outra afirmação que mostra que esta senhora, ou não percebe do assunto, ou está de má fé, é dizer que as autoridades não têm promovido um sistema de farmacovigilância ativa! Isso não é verdade. Aliás, estas são das vacinas mais escrutinadas em termos de farmacovigilância!
Misturando estas inverdades, com o ataque ao governo (e atenção, quero lá saber de politiquices. Quer o governo fosse PS, PSD, BE, PCP, CDS, teria exatamente o mesmo tipo de discurso), só resta concluir que o propósito desta senhora não é informar ou alertar.