Here we go
Depois de quatro décadas de presidência de Pinto da Costa, a sua candidatura é baseada na necessidade de mudança ou no facto de crer que fará melhor? Acima de tudo, representa o meu amor pelo FC Porto e uma altura de mudança. O FC Porto vem de uma liderança com mais de 40 anos de Jorge Nuno Pinto da Costa, encontra-se agora numa altura de se reformatar relativamente ao futuro. O paradigma do futebol moderno está a mudar, as exigências são outras e é preciso transportar o FC Porto para a modernidade. O objectivo é rodear-me dos melhores e conseguir imprimir esta mudança.
Em 2020, nas últimas eleições, Pinto da Costa nomeou-o como um potencial sucessor na presidência do FC Porto. Alguma vez pensou que ia concorrer contra o presidente mais titulado da história do futebol?
Dificilmente pensaria que o presidente se pudesse recandidatar em 2024. Naturalmente é livre de o fazer e eleva este desafio e o sentido de responsabilidade e exigência. A verdade é que os últimos anos têm levado o FC Porto à ruína financeira e a uma perda de competitividade desportiva. Sempre pensei que não se recandidatasse. Decidi avançar com esta candidatura mesmo que ele fosse meu adversário. O legado que me deixa contará como peso premente para fazer mais e melhor. Penso estar à altura do
Pinto da Costa disse que a vossa relação mudou porque o André mudou. Concorda?
A única coisa que mudei foi a opinião de [que] enquanto o presidente for vivo deveria continuar no FC Porto. O meu amor pelo clube é o mesmo e sinto-me capacitado para devolver a glória aos sócios e ao FC Porto. A única coisa que mudou foi essa opinião face a 2024, fruto do momento urgente que o FC Porto vive: cada vez mais dá a entender que o clube está refém dos interesses de outras pessoas. As decisões financeiras e desportivas são cada vez mais postas em causa, por interesses alheios, mas também por falta de planeamento e visão. Acho que o momento de mudança é agora.
Foi treinador numa época de sonho para o clube, somou quatro títulos, mas considera que Pinto da Costa quer apagar essa época da memória. Porquê? Compreendo que esta candidatura se tornou de tal forma forte que traz desconforto. Tenho registado, nos últimos dois anos, uma série de ataques pessoais e profissionais contra mim por parte do presidente Pinto da Costa. Acho que ele nunca teve noção que esta candidatura se pudesse tornar tão forte: não só pelo portismo que represento, pelas pessoas de que me quero rodear e por vir para o FC Porto desprendido de qualquer interesse. Ponho em pausa uma carreira que considero muito boa, por amor ao FC Porto e por sentir que é altura de mudança. Tenho registado muitos eventos curiosos, relativamente ao
apagar” dessa história de 2011, ou a uma tentativa de denegrir a pessoa que liderava essa equipa. Sente-se cada vez mais nas palavras do senhor presidente, o incómodo é evidente.
Os resultados eleitorais de Pinto da Costa estão em trajectória descendente: em 2016, foi eleito com 79% dos votos, em 2020, desceu para 68. Esta “queda” deu-lhe mais força para se candidatar agora?
Não posso negar que analisámos esses números, mas não estão na base da decisão de avançar com a candidatura. Tenho 15 anos de treinador profissional, naveguei neste mundo [do futebol] em vários países e culturas. Tenho visão de futuro para o futebol, ideias muito vincadas relativamente à parte desportiva, de performance e scouting. É mais pela capacidade que tenho em imprimir essa mudança no futuro do FC Porto que me candidato. Esses números, acima de tudo, revelam um crescente descontentamento. É presente, evidente e vem em linha com uma frustração acumulada dos sócios face à gestão do presidente.
O FC Porto, nos últimos 24 anos, ganhou por duas vezes a Liga Europa, uma Liga dos Campeões, uma Taça Intercontinental, fez mais de 2,9 mil milhões de euros em receitas. Desde 2015, foram 1,3 mil milhões. Tem, neste momento, 500 milhões de euros de passivo e 310 milhões de dívida financeira. Parece surreal que, enquanto podíamos ter crescido para nos tornarmos no melhor clube nacional e uma potência do futebol europeu, acabámos por nos enterrar em dívidas fruto de más decisões desportivas e financeiras. Parece-me que se passa um enriquecimento absoluto de pessoas paralelas ao seu universo, um enriquecimento também de pessoas vinculadas à administração. Se não me engano, nos últimos 15 anos, há quase 27 milhões de euros pagos à administração em remunerações.
Caso não vença as eleições, que cenário traça para o FC Porto nos próximos quatro anos?
No outro dia disse que é muito fácil desmentir Jorge Nuno Pinto da Costa. O presidente já disse que não avançaria, que jamais apontaria uma linha de sucessão directa, jamais consideraria o FC Porto uma monarquia e jamais passaria o testemunho. Tenho muito respeito pelo senhor presidente, mas penso que não está em condições neste momento de presidir a mais quatro anos. O que se avizinha no FC Porto pós-2024 é uma linha de sucessão directa para um dos seus vice-presidentes, pessoas essas que vão ser apresentadas a dez dias das eleições. O que me parece evidente é que, dentro das pessoas que já o rodeiam, João Rafael Koehler está ligado a um fundo chamado Quadrantis que, neste momento, está intimamente relacionado com a
antecipação de receitas do FC Porto e com o factoring, com condições e juros que ninguém sabe quais é que são. É muito provável que nas colaterais [garantias] dadas a esse fundo estejam direitos comerciais e passes de jogadores. Não é impossível que, se incumprir em determinadas coisas, a Quadrantis se torne dona do FC Porto.
Mas continuará no papel da oposição se perder as eleições? Vai ter uma voz activa?
Penso que não. O FC Porto encontra-se numa situação-limite, não queria estar a fugir às minhas responsabilidades, mas, em 2028, já não é para mim. Apresento-me agora com esta visão de futuro, rodeei-me das pessoas certas e que podem já não estar [disponíveis] para mim em 2028. O FC Porto, como o conhecemos, já não será o mesmo. Dentro do associativismo, os clubes têm um grande desafio pela frente. Têm uma vantagem competitiva, pela cultura, valores e história, mas estão muitovinculados a determinadas receitas específicas: direitos televisivos, receitas da UEFA e receitas comerciais. O futebol está em premente mudança e é necessário para o FC Porto arranjar novas parcerias comerciais, crescer enquanto marca, como clube de associados igual ao legado desportivo que tem. Isso não está a acontecer. O FC Porto, caso não sejamos eleitos, de 2024 a 2028, será totalmente refém das decisões de pessoas relacionadas com o entorno de Pinto da Costa.
O contrato de Sérgio Conceição termina no final da temporada, é um treinador com sucesso conhecido. O plano é tentar a renovação?
Esse é o campo mais sensível. Não me quero alargar muito, estamos em plena época desportiva e estou muito confiante, fruto dos resultados que a equipa tem tido após a mudança de estrutura táctica. O rendimento e a qualidade de futebol evoluíram bastante.Acredito] Que o FC Porto ainda possa ambicionar ao título, mas também a qualificação para a Liga dos Campeões através [pelo menos] do segundo lugar. Acredito que possamos levantar também a Taça de Portugal. Para mim é muito sensível mexer com a época desportiva e estender-me em declarações relativamente ao treinador ainda mais sensível é.
Acha que a detenção de Fernando Madureira e outros adeptos associados à violência na assembleia geral traz serenidade às eleições do FC Porto, ou serviu para aumentar a instabilidade e contestação?
É uma pergunta um pouco injusta porque os actos têm que ser provados. Prefiro voltar à assembleia geral em si e ao que aconteceu a 13 de Novembro. O que aconteceu foi muito grave. Grave em todos os sentidos, na sua organização, ou na falta dela, na indiferença de todos os órgãos sociais relativamente ao que seestava a passar, na falta de explicações aos sócios, na inacção por parte do conselho fiscal e disciplinar após os acontecimentos eoquemeparecequeestáa acontecer agora é uma corrida atrás do tempo, tendo em conta o acto eleitoral. Vemos um conselho fiscal e disciplinar a chamar pessoas que prestaram testemunho na Operação Pretoriano, quando todas as imagens que nós observamos foram claras e evidentes relativamente a alguns indivíduos e à acção que estavam a tomar. Causa-me algum desconforto que pessoas ligadas ao vice-presidente da mesa da assembleia geral estejam a defender pessoas que agrediram sócios de dia 13. Legalmente, é possível, são os seus advogados, mas custa.
O André disse ser necessário repensar o protocolo que o clube tem com as claques. No seu entendimento, as claques passariam a ter acesso aos bilhetes nas mesmas condições do que um sócio normal?
Desde que sejam sócios, não vejo razão nenhuma para que não o seja. A questão aqui prende-se mais com os grupos organizados de adeptos, com os não-sócios. Algumas das pessoas que frequentam os grupos organizados de adeptos, tanto o Colectivo 95 como os Super Dragões, não são sócios [do clube] e encontram-se às vezes em posições privilegiadas de acesso a bilhetes. Tudo isso é para reformatar, reorganizar. Os grupos organizados de adeptos não podem ter mais privilégios do que os sócios do FC Porto. E os não-sócios dos grupos organizados de adeptos não podem ter mais privilégios que as pessoas do público em geral que querem ter acesso a bilhetes. Todos estes protocolos são para reformatar.
O André criticou recentemente a falta de segurança no museu. Teme que esta insegurança se alargue às eleições de 27 de Abril. Acredita que existirá uma tentativa de condicionar votos ou adulterar os resultados?
Está a falar de um crime. Chamei a atenção para a segurança porque a operacionalização do acto eleitoral é muito importante e, no dia 28 [de Abril], há um FC Porto-Sporting. Se estivermos a prever um acto eleitoral que possa ir entre as 20 mil e as 30 mil pessoas de movimento antes de um jogo, isto é quase como se houvesse um FC Porto-Vizela antes de um FC Porto-Sporting. É muita gente a operar. Confio que o FC Porto tenha criado um grupo interno e confio na integridade, na ética e na transparência das pessoas para organizar o acto eleitoral.
A partir do momento da oficialização da candidatura, a partir de 27 de Março, já entraremos num campo ondeprecisamos de resposta a muitas perguntas. Precisamos de estar em contacto directo com as equipas do FC Porto, porque queremos também estar com as pessoas que vamos levar como delegados das mesas, fiscalizadores, escrutinadores do acto eleitoral. Precisamos de saber como é que se processam a selagem das portas, a credenciação, a operacionalização, a contagem das urnas e todas as questões relacionadas com as quotas, as bases de dados e a protecção da base de dados também. É muito importante que haja protecção total da base de dados.
A construção da academia do FC Porto é um dos temas que dividem as listas. Tem acordo para a compra de um terreno no Olival, mas Pinto da Costa diz que o complexo será na Maia e que não há abertura para discussões. Admite estar de mãos atadas neste dossier? Admito, sim. Potencialmente, poderemos estar de frente com contratos que desconhecemos nesta fase se irão permitir rescisões ou não. Temos de avaliar os dois cenários. Há dois anos, quando comecei a pensar no que seria o futuro do FC Porto, e enquanto não se discutia a Maia, o nosso primeiro propósito foi saber onde. Enquanto se especulava que o FC Porto podia ir para a Maia, após a saída de Matosinhos e dos problemas em 2016 que isso trouxe, para nós fazia sentido o sentido de unidade. Ou seja, a formação não pode estar distante da equipa profissional. Agora, com que situação é que nos poderemos deparar contratualmente? A hasta pública terá lugar antes das eleições. O FC Porto comunicou ontem [segunda-feira], desmentindo o seu administrador financeiro, que afinal é o comprador dos terrenos na hasta pública, que se estimam num valor de 3,3 milhões de euros. Tanto quanto entendo, 20% têm de ser debitados à cabeça. Quero saudar a capacidade financeira repentina do FC Porto para se comprometer dessa forma.
O André partilha das dúvidas levantadas pelo vereador da oposição da Câmara Municipal da Maia?
Não entro nesse campo. O que sei é que o detentor da parte privada é uma empresa ligada à construtora Barbosa Borges, porque os documentos públicos assim o indicam. O que me parece evidente é que, quando ouvimos falar em negócios, estão sempre metidos Pedro Pinho e João Rafael Koehler. É precisamente disto que os sócios do FC Porto se fartaram. O FC Porto continua a ser um quintal com uma galinha dos ovos de ouro, que cada vez produz menos, mas que para os próprios produz bastante.