Este texto é um pouco longo mas vale a pena ler todo, ultrapassa de longe o que eu vivi nos tempos de Salazar e Marcelo Caetano - era mau mas não chegava a este ridículo.
Sem campos de concentração mas com tecnologia mais avançada, o regime de Putin replica a repressão russa de outros tempos. É um regresso à era de Brezhnev e de Krushchev, em números, mas com laivos do modus operandi de Estaline. Segundo os analistas, trata-se de uma prática “imprudente e perigosa, porque causa medo num grande número de pessoas” e motivará algumas delas a matar antes de serem mortas. Quase todas as redes sociais independentes e muitas páginas estão bloqueadas, mas um simples vídeo pode valer uma acusação com pena de prisão de vários anos. Apertar do cerco também tem como objetivo levar os dissidentes a sair do país
“Tem um pedaço de papel em branco na mão, mas nós entendemos o que isso significa; está a desacreditar o Exército russo.” Qualquer atividade pode levantar suspeitas e motivar a ação das forças policiais e detenções arbitrárias: estamos na Rússia de 2023, e não é preciso recuar à era soviética. Vladimir P. Buldakov, investigador do Instituto de História Russa da Academia Russa de Ciências, não vê com estranheza as histórias que agora se repetem: “Corresponde à minha ideia sobre a natureza de crise cíclica do desenvolvimento da Rússia. Para mim, não há nada de surpreendente no que está a acontecer. Mas ninguém pode dizer hoje até onde este processo irá.”
Imagine-se a passear com folhas de papel em branco e a ser detido, ou a ver as suas escolhas literárias escrutinadas eas conversas ouvidas e descontextualizadas. “Um homem foi autuado porque estava com um livro, o ‘Guerra e Paz’, de Leo Tolstoy. Em primeiro lugar, existe a palavra “guerra” no nome do livro e, em segundo lugar, a polícia escreveu nos protocolos que Leo Tolstoy era contra o regime do czar na Rússia há cem anos, por isso quem apoiava Leo Tolstoy era contra o atual regime russo - e é por isso que ele estava a desacreditar o Exército russo."
Maria Kznetsova, uma cidadã russa e porta-voz da
ONG OVDO-Info, que monitoriza e presta apoio jurídico em casos de acusações políticas no país, é quem conta ao Expresso estes novos casos, punidos pelo Código Penal russo. A ativista garante também que qualquer diálogo frugal pode ser problemático. "Publicámos há dias a história de uma senhora que estava numa espécie de instalação médica, para descansar e receber massagens: Ela disse apenas a outra senhora que Zelensky é um homem bonito e inteligente, e alguém acabou por chamar a polícia, tendo ela sido depois acusada de desacreditar o Exército russo.”