A primeira tomada de posse de Jorge Nuno Pinto da Costa como presidente do FC Porto aconteceu há 38 anos
Por se tratar de uma data memorável e da maior figura do nosso clube desde 1893, o site do FC Porto publicou, esta manhã, um extenso trabalho biográfico sobre o presidente:
“Aos vinte e três dias do mês de abril de mil novecentos e oitenta e dois, pelas vinte e uma horas e trinta minutos, compareceram no Pavilhão de Treinos do Complexo Desportivo das Antas os membros dos Corpos Gerentes do Futebol Clube do Porto que vão subscrever este AUTO DE POSSE, a fim de serem empossados para o biénio de mil novecentos e oitenta e dois e mil novecentos e oitenta e três, eleitos em sufrágio na Assembleia Geral Eleitoral que teve lugar no passado dia 17 de abril de 1982”.
Quase uma semana depois das eleições, foi com uma assinatura num documento que abria com este texto que Jorge Nuno Pinto da Costa assumiu o cargo de presidente do FC Porto. Tinha 44 anos de vida, 28 de sócio e cerca de 15 na estrutura do clube. Ninguém podia saber, naquela noite, que a história do futebol português estava a caminho de mudar radicalmente. Mas os sinais de que algo grande poderia acontecer com este antigo bancário à frente da maior instituição desportiva do Norte já estavam lá desde a segunda metade da década de 70.
Das bancadas à sala da direção
Tudo começou pela base. No princípio, Jorge Nuno Pinto da Costa era apenas uma criança que assistia aos jogos no Campo da Constituição pela mão de um tio, um adolescente que se tornou associado por iniciativa da avó e um jovem adulto que acompanhava o FC Porto para todo o lado em caravanas de portistas que queriam ver com os próprios olhos o que só poderiam imaginar como era através dos relatos da rádio. Foi assim, enquanto crescia como homem e como adepto, que a 6 de maio de 1948 esteve no Estádio do Lima a vibrar com a vitória sobre o Arsenal, que a 28 de maio de 1952 esteve nas Antas a emocionar-se com a inauguração do novo estádio, e que a 22 de março de 1959 esteve em Torres Vedras a sofrer com os truques de Calabote e a festejar uma conquista que só viria a repetir-se 19 anos depois.
Logo nos primeiros anos de vida adulta, numa altura em que a realidade do FC Porto era fértil em crises diretivas e instabilidade, Jorge Nuno Pinto da Costa começou a colaborar, como vogal, na secção de hóquei em patins, que passaria a liderar em 1962. Mais tarde, assumiu responsabilidades no hóquei em campo e no boxe, antes de tomar posse como diretor das modalidades amadoras num dos mandatos de Afonso Pinto de Magalhães. Concluída a missão, terá chegado a pensar que estava cumprido e encerrado o objetivo de contribuir para o sucesso do clube de sempre, mas largos dias têm cem anos…
O 25 de abril no futebol português
Foi na sequência de uma tertúlia no café Orfeu em que não suportou mais a gabarolice dos participantes boavisteiros – entusiasmados com os sucessos de uma equipa que era treinada por José Maria Pedroto – que Jorge Nuno Pinto da Costa tomou uma das decisões mais importantes da sua própria vida e, sabemos agora, da história do FC Porto: aceitou o convite de Américo de Sá para assumir a direção do futebol no mandato dos órgãos sociais que arrancaria em maio de 1976. Entre as condições que impôs estavam o regresso de Pedroto ao banco azul e branco e a autonomia do departamento de futebol face às restantes secções do clube.
Durante os quatro anos seguintes, Jorge Nuno Pinto da Costa e José Maria Pedroto foram os rostos mais visíveis da principal transformação do futebol português no pós-25 de abril de 1974: a viragem a Norte. A ação desta dupla pode ser dividida em três eixos: a reorganização e modernização da estrutura do clube, que passou, por exemplo, pelo aumento da privacidade e das condições de concentração da equipa de futebol através do encerramento do bar público que existia junto à entrada do balneário das Antas; a construção de um plantel mais forte, que ao longo das quatro épocas implicou contratações como as de Duda, Fonseca, Frasco, Freitas, Jaime Pacheco, Lima Pereira e Sousa; e o desenvolvimento de um discurso de denúncia e combate ao centralismo crónico do país e aos seus efeitos no futebol.
A estratégia deu resultado. Apesar de todos os obstáculos que foi preciso contornar, em 1977 foi conquistada a Taça de Portugal, que escapava desde 1968, e em 1978 e 1979 o FC Porto foi bicampeão, quebrando um interregno de 19 anos sem vencer o principal troféu nacional. O tri não foi alcançado por circunstâncias alheias ao mérito desportivo de cada equipa, sublimadas pela Santa Aliança que uniu adeptos do Benfica e do Sporting contra o cada vez mais temível porta-estandarte do Norte na final da Taça de Portugal de 1980.
Nesse ano, o verão foi quente no FC Porto, e a falta de unidade em relação à postura combativa do clube e à sua estratégia para o futuro ditou as saídas de Jorge Nuno Pinto da Costa, de José Maria Pedroto e de uma parte dos jogadores.
O clube com que todos sonhamos
O primeiro dia do resto das nossas vidas surgiu dois anos depois. Pinto da Costa envolveu-se na preparação de um movimento que tinha como propósito apresentar uma alternativa para o futuro do clube, e acabou a liderá-lo. A 17 de abril de 1982, encabeçou a única lista candidata aos órgãos sociais do FC Porto, depois da desistência da que era protagonizada por Afonso Pinto de Magalhães. O lema era simples e claro – “Em frente por um FC Porto diferente” –, a mensagem era ambiciosa – “Se queres um FC Porto forte em Portugal e na Europa, vota na lista B”.
A mudança não seria fácil, até porque a situação financeira do clube era caótica, mas a nova direção soube dar a volta sem abdicar da fasquia desportiva que tinha sido colocada demasiado alta. Logo nesse verão, José Maria Pedroto e Gomes regressaram às Antas, conforme tinha sido prometido pelo novo presidente. E a eles juntaram-se reforços com a categoria de Eduardo Luís, Eurico, Inácio e Vermelhinho. A partir das sementes que já tinham sido lançadas entre 1976 e 1980, começava a ganhar forma o primeiro grande FC Porto de nível europeu e mundial.
O caminho não foi percorrido sem sobressaltos. O maior foi a doença de Pedroto, que obrigou o treinador a deixar o banco a meio de 1983/84. Foi precisamente nessa época, com o até então adjunto António Morais no papel de técnico interino, que o FC Porto venceu os primeiros troféus desta nova era (Supertaça e Taça de Portugal) e estreou-se numa final europeia: a 16 de maio de 1984, os Dragões foram derrotados pela Juventus no jogo decisivo da Taça das Taças, um encontro muito marcado pelos erros de arbitragem.
Foi com um discípulo do Mestre, Artur Jorge, que o FC Porto continuou a crescer, e cresceu ao ponto de atingir um patamar que alguns anos antes só poderia ter sido imaginado por sonhadores apelidados de lunáticos. A 27 de maio de 1987, os Dragões enfrentaram o Bayern de Munique, em Viena, na final da Taça dos Clubes Campeões Europeus. Na antevéspera, no aeroporto, Pinto da Costa tinha garantido: “Estar na final não chega. Não podemos garantir que a vamos vencer, mas podem ter a certeza de que nós vamos determinados para procurar vencer, e não para ficarmos muito contentes pelo facto de termos sido finalistas”. O FC Porto venceu mesmo, graças à magia de Madjer, à eficácia de Juary e à qualidade todo um grupo de topo. Foi apenas o primeiro de sete títulos internacionais.
Logo na temporada seguinte, com Tomislav Ivic, entraram nas vitrines das Antas a Supertaça Europeia e a Taça Intercontinental, que nunca tinham sido conquistadas por qualquer equipa portuguesa e que continuam a ser um exclusivo do FC Porto. Entretanto, Jorge Nuno Pinto da Costa ia sendo eleito para sucessivos mandatos, e o palmarés do clube não parava de crescer. Na década de 90, os Dragões venceram oito de dez edições campeonato, cinco delas consecutivas – outro registo inédito e jamais superado no futebol português. E quando muitos já celebravam o fim desta hegemonia, após três épocas menos felizes, o clube soube adaptar-se às exigências do século XXI. Entre maio de 2003 e dezembro de 2004, com José Mourinho e Victor Fernández, o FC Porto venceu uma Taça UEFA, uma Liga dos Campeões e uma Taça Intercontinental, tornando-se o último clube de fora das cinco principais ligas do continente a sagrar-se campeão europeu. E ainda não tinham passado dez anos quando André Villas-Boas conduziu a equipa à vitória na Liga Europa, uma competição que desde então só foi vencida por formações espanholas e inglesas.
Com Jorge Nuno Pinto da Costa como presidente, o FC Porto tornou-se o mais forte clube português – força atestada por sete títulos internacionais, que rivalizam com os dois do mais direto perseguidor – e um dos melhores do mundo. E se em 1982 isso parecia impossível, hoje em dia já é óbvio que este é o clube com que todos sonhamos.
A arte de ser sempre futuro
Se incluirmos nas contas os anos em que foi diretor do departamento de futebol, verifica-se que Jorge Nuno Pinto da Costa já ajudou o FC Porto a ser campeão nacional em cinco décadas distintas e a vencer troféus internacionais em três. E constata-se que esses sucessos aconteceram em contextos bastantes distintos: num tempo em que os plantéis eram quase exclusivamente constituídos por jogadores portugueses e noutro em que o mercado é muito mais aberto e globalizado; numa altura em que a gestão dos clubes assentava em estruturas largamente amadoras e noutra em que o profissionalismo é transversal a todos os departamentos; numa época em que ainda se jogava em campos pelados e noutra em que todos os terrenos são relvados e em que os estádios são cada vez mais confortáveis; numa era em que os jogos de futebol quase não eram transmitidos na televisão e noutra em que os clubes já têm os seus próprios canais.
Concretizar a vitória no campeonato de 2017/18 foi muito diferente de preparar as conquistas dos de 1977/78, 1987/88, 1997/98 e 2007/08. Em abstrato, não foi melhor nem pior, mais fácil ou mais difícil, mais importante ou menos importante. Foi diferente, porque as condições em que cada um destes sucessos foram alcançados evoluíram e foram substancialmente distintas. E se o FC Porto conseguiu vencer estes cinco campeonatos – além de tudo o resto que ganhou – com o mesmo homem como principal responsável pelo futebol, isso significa que existiu uma notável capacidade de adaptação a cada um dos novos desafios, como se fosse possível, a cada momento, estar à frente do próprio tempo.
Esta evolução não aconteceu exclusivamente no futebol. A revisitação dos compromissos eleitorais de Jorge Nuno Pinto da Costa em 1982 e o elenco das concretizações que se pode associar a cada um deles espelham bem como o FC Porto tem conseguido integrar a vanguarda das instituições desportivas mundiais:
1. Uma das promessas era o rebaixamento do Estádio das Antas. Essa obra, cuja viabilidade muitos colocaram em causa, concretizou-se. Mais tarde, o recinto foi modernizado com a instalação de cadeiras para todos os adeptos. Depois, foi construído o Estádio do Dragão. E a Dragão Arena. E o novo parque da Constituição. E o Museu FC Porto.
2. Pinto da Costa prometia inovar ao nível da comunicação, através da criação de uma revista com a qualidade das boas publicações estrangeiras. A Dragões surgiu em abril de 1985 e desde então já foram lançadas 400 edições, disponíveis desde 2016 em formato eletrónico. O FC Porto adaptou-se aos novos meios de informação e hoje em dia possui um portal com várias funcionalidades, perfis em redes sociais que são líderes de popularidade em Portugal e um canal televisivo generalista com uma parte da programação exclusivamente dedicada ao clube.
3. No plano das modalidades, Pinto da Costa partilhava a ambição de, pela primeira vez, o FC Porto conquistar um campeonato nacional de hóquei em patins, e esse título surgiu logo em 1983. Entretanto, os Dragões venceram mais 22 ligas – incluindo dez consecutivas entre 2002 e 2011 –, além de sete troféus internacionais. O sucesso estendeu-se a outros desportos e já são quase incontáveis os triunfos em competições de andebol, basquetebol, boxe, natação, voleibol, etc. O FC Porto desempenha ainda um importante papel social através da secção de desporto adaptado, criada durante estes mandatos.
4. Por fim, no futebol, para lá dos regressos de José Maria Pedroto e de Fernando Gomes, a principal aposta era a primeira qualificação para a final de uma prova europeia. E o FC Porto não só atingiu essa final, em 1984, como venceu sete troféus internacionais a partir de 1987. A esses títulos juntaram-se 21 campeonatos nacionais, 12 taças de Portugal e 20 supertaças. E numa altura em que parece cada vez mais difícil que clubes de ligas periféricas compitam com os tubarões europeus e em que a formação se afigura como o melhor caminho para o sucesso desportivo e financeiro, o FC Porto tornou-se a primeira equipa portuguesa a sagrar-se campeã europeia de juniores, em 2019.
Entre 23 de abril de 1982 e 23 de abril de 2020, a dimensão do FC Porto cresceu dos níveis local e regional e para as escalas europeia e mundial. O maior clube do Norte tornou-se o melhor clube português. E como nunca foram esquecidas as raízes, o clube cresceu com a cidade e com a região e a cidade e a região cresceram com o clube. O sucesso acumulou-se ao longo de todas as décadas no futebol e nas outras modalidades e teve reflexos na organização interna e nas infraestruturas. Os fracassos foram sempre muito menos do que os êxitos. E tudo só foi possível graças a uma notável capacidade de concretização, definição de metas, superação de expectativas e adaptação a novas realidades. Sonhar com o que parecia irrealizável foi, muitas vezes, o primeiro passo para andar à frente. E sonhos nunca faltaram a Jorge Nuno Pinto da Costa, o presidente que tem sido sempre futuro.