Aos dois anos já sabia patinar e aos 22 já era capitão do FC Porto. Hélder Nunes está pronto para os jogos decisivos
Por Rui Cesário Sousa
A ligação entre Hélder Nunes e os patins é, como o próprio admite, uma história muito longa. Tão longa que a memória do próprio não consegue acompanhar. A família, com tradição na modalidade, foi o ponto de partida para as primeiras aventuras sobre rodas, e é por eles que hoje sabe que patina desde os dois anos. À grande habilidade com os patins foi “só” juntar igual dose com o stick, muito trabalho, dedicação, sacrifício et voilà… Aos 22 já era capitão do FC Porto e um nome de relevo do hóquei em patins português. Os amigos chamam-lhe “Batata”.
Experimentou karaté, basquetebol, natação e outros desportos individuais e coletivos, mas o destino de Hélder Nunes parecia estar escrito mesmo antes da primeira stickada. Vejamos porquê: é neto de um ex-jogador de hóquei, é filho de um ex-jogador de hóquei, é sobrinho de um outro ex-jogador de hóquei e nasceu em Barcelos, cidade onde a modalidade está fortemente enraizada. Depois há ainda a mãe, que, como barcelense, vivia também a modalidade de uma de uma forma particular. Era ela a companhia nos jogos do pai que não se lembra de ir ver. Hélder Nunes só nunca foi muito à bola com a bola, com o futebol. Faltava-lhe o jeito, admite, e por isso mesmo acabou por nunca levar muito a sério uma modalidade em que perdia mais vezes do que as que ganhava, mas pela qual nutre uma grande paixão “só como espectador”. Surpreendido? Não se admire. Este “rapaz” não foi feito para perder: “Até a jogar berlindes eu não gostava de perder. Valia tudo e, se tivesse de fazer batota para ganhar, fazia”. E com isto parece que encontrámos o ponto de partida perfeito para a nossa entrevista.
O que tem este jogo para fascinar crianças e adultos?
Para mim, o mais importante sempre foi andar de patins. Era uma coisa que nem toda a gente conseguia e para a qual eu revelava facilidade desde novo. Lembro-me dos patins da Chicco com que andava e que era como se estivesse de sapatilhas. Fui começando a rolar cada vez melhor quando via que muitos não conseguiam e foi isso que me fascinou. Agora, com esta idade e experiência, continua a fascinar-me a técnica e a tática, e tudo o que se pode fazer com a bola.
E as quedas fazem parte desse processo de fascínio?
Foram muitas. Aleijei-me algumas vezes, mas nunca foi nada sério. Levei pontos duas ou três vezes, o que até nem é muito. Mostra bem que, apesar de parecer um desporto perigoso, não o é mais nem menos do que os outros. Azares acontecem no hóquei, como em tudo que fazemos na vida, dentro ou fora do desporto. O importante é que quem o joga se saiba comportar.
A realidade do profissionalismo sempre esteve na tua cabeça?
Era um sonho de miúdo. Para ser sincero, a escola não me encantava particularmente. Nunca tive o objetivo de ter um curso em específico e fui abdicando, desde muito cedo, de várias coisas para seguir este meu sonho. Coisas que todos fazem, como festas de aniversário nas vésperas dos jogos ou viagens de finalistas. Tinha a ambição de ser alguém no hóquei e tudo fiz para a tornar realidade.
A alcunha “Batata” segue-o desde essa altura?
É verdade. Já fui “Batata”, já fui “Bola Oito” e é só assim que muitos me conhecem. Isso tem a ver com a minha fisionomia quando era mais novo. Era um bocadinho cheiinho. O “Batata” acabou por pegar mais aqui no Porto, porque sou um grande fã de batatas fritas e aí juntou-se o útil ao agradável. Acho engraçado.
Quem eram as suas referências na modalidade?
Não escondo a ninguém que o estrangeiro que mais me fascinou foi, e ainda é, o Reinaldo Mallea [García]. Via muitos jogos do FC Porto e o hóquei dele sempre me agradou. Depois claro que há o Edo Bosch, o Ricardo Barreiros ou o Reinaldo Ventura, a quem estou eternamente grato pelo que me ensinaram.
Como é jogar ao lado desses ídolos?
Estamos sempre a aprender e a ensinar. Muitas vezes faz-se julgamentos errados sobre as pessoas só pelo que se vê dentro do campo. Como colegas e como companheiros, não tenho nada a apontar-lhes. Sempre me ajudaram muito, todos eles, e sou o que sou hoje também por causa deles.
Depois do Óquei de Barcelos e do HC Braga chegou ao FC Porto com 18 anos. Surpreendeu-o até a si esta precocidade?
Tenho que admitir que sim. Tinha o sonho de cá chegar e nunca pensei que pudesse chegar tão cedo. Foi um orgulho e mostra que todo o trabalho e os sacrifícios valeram a pena. Não só como jogador, mas também como pessoa.
E esperou pouco tempo pelas primeiras conquistas. Como as recorda?
São títulos que nunca irei esquecer. Marcaram-me de uma forma especial, porque foi dos anos em que mais evoluí. Penso que saber lidar com a vitória é tão ou mais difícil do que lidar com a derrota, porque nos podemos deslumbrar facilmente. Depois de se ganhar é preciso trabalhar o dobro para se voltar a ganhar.O final da época passada marcou o regresso aos títulos com a conquista da Taça de Portugal.
Marcou dois golos, mas aquele de livre direto acabou por se tornar viral. É algo que leva pensado para os jogos?
Preparamos os jogos nos dias anteriores e essa ideia não partiu só de mim. Falamos todos e alguma ideia que haja é sempre resultado de um trabalho coletivo. Fui eu a ir lá, mas, se fosse outro companheiro de equipa, tenho a certeza de que a bola iria entrar. É 50 por cento de trabalho e outros 50 por cento de intuição.
Vencer duas taças consecutivas ao Benfica foi importante para a afirmação desta equipa?
Os títulos dizem-nos que o trabalho está a ser bem feito. Uma Taça de Portugal e uma Supertaça não são os maiores títulos, mas é sobre isso que queremos trabalhar e evoluir para ganhar o campeonato ou a Liga dos Campeões, sem nunca esquecer que jogamos sempre contra equipas de muita qualidade e que querem o mesmo que nós.
Começou o ano com uma renovação de contrato e com a braçadeira de capitão. É uma pressão extra?
Não as entendo como uma responsabilidade extra. A verdade é que sou exatamente o mesmo que era quando não era capitão. O capitão tem a obrigação de levar a equipa num bom caminho, mas sei que sozinho não posso fazer nada. Estamos todos no mesmo barco, com o mesmo objetivo, e eu não sou mais ou menos importante de que os meus colegas por ser capitão.
Aos 23 anos, já se sente um jogador “à Porto”?
Claro. Para mim, isso é relativamente fácil. Basta sentir o clube e dar tudo que temos por este símbolo. É isso que nos caracteriza. E temos cá muitos jogadores que vivem muito o clube.
Este texto é um excerto da entrevista de Hélder Nunes à edição de maio de 2017 da “Dragões”, a revista oficial do FC Porto, que pode ler na íntegra aqui.