A primeira impressão que fica é positiva: há uma clara intenção de construir desde trás, com critério e presença interior. O pivot defensivo baixa para a linha dos centrais, ajudando a atrair pressão e libertar espaços noutras zonas. Ao contrário do modelo de Anselmi, que privilegiava a lateralização seguida de jogo direto, aqui nota-se a procura de linhas de passe mais curtas e verticais, com os médios interiores a abrirem jogo junto à linha lateral para depois oferecerem apoios por dentro.
No entanto, há um ponto que me preocupa: a transição defensiva após perda de bola. Quando o pivot baixa e os interiores alongam, forma-se um vazio perigoso no corredor central. Se a perda ocorre em fase adiantada e a equipa não se reagrupa rapidamente, esse “buraco” torna-se um convite ao contra-ataque.
Outro aspeto a considerar é o comportamento da equipa contra blocos baixos, como é típico no nosso campeonato. O espaço disponível para construir será naturalmente menor, e a primeira linha de pressão adversária posiciona-se mais recuada. Isso vai obrigar a equipa a circular com maior paciência e precisão. Sem criatividade entre linhas e movimentações constantes, o jogo tende a estagnar.
Claro que tudo depende dos “intérpretes” em campo — e aí reside tanto o risco como o potencial. Os princípios estão lá, a ideia agrada-me, mas será essencial garantir equilíbrio entre audácia ofensiva e solidez defensiva. A época promete, mas exige inteligência na execução.
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Do ponto de vista técnico-táctico, acrescentaria alguns pontos que podem ajudar a enriquecer ainda mais essa reflexão:
1. Pressão pós-perda e organização em transição:
Se a equipa conseguir reagir de forma coordenada logo após a perda — com os jogadores da frente a pressionarem imediatamente e as linhas a manterem-se compactas — esse vazio no corredor central pode ser, pelo menos, parcialmente compensado. Contudo, isso exige uma resposta coletiva muito bem trabalhada e um compromisso defensivo forte por parte dos jogadores ofensivos, o que nem sempre é garantido.
2. Sincronização entre interiores e laterais:
A movimentação dos médios interiores para zonas exteriores pode ser útil para criar superioridade nas alas, mas exige uma grande coordenação com os laterais e, sobretudo, uma noção clara de tempo e espaço para voltarem a oferecer apoios por dentro. Caso contrário, pode haver ruturas no equilíbrio posicional e perda de presença nas zonas de finalização.
3. Profundidade vs largura:
A largura funcional dada pelos interiores ou laterais é útil, mas não pode acontecer em detrimento da profundidade. Sem movimentos de rutura — vindos do ponta-de-lança, dos extremos ou dos laterais em progressão — o adversário acomoda-se e mantém o bloco compacto. A profundidade obriga o adversário a alongar-se, e isso abre espaço entre linhas, essencial para quem quer jogar com critério.
4. Variabilidade na construção:
A descida do médio defensivo para a linha dos centrais é válida e pode ser eficaz contra certas pressões, mas a equipa deve ter alternativas — como construções a dois centrais com laterais mais baixos, ou a atração de adversários para zonas específicas com o objetivo de libertar o lado contrário. A imprevisibilidade na primeira fase de construção é fundamental para escapar à previsibilidade e ao bloqueio de equipas bem organizadas.
Em resumo:
A base está lançada e os princípios são promissores. Mas tudo dependerá da capacidade dos jogadores interpretarem os momentos do jogo com inteligência, de manterem o equilíbrio entre risco e segurança, e da capacidade do treinador em ajustar os comportamentos consoante o adversário. Como bem disseste: a época promete, mas exigirá muito rigor na execução.