Os primeiros sinais de impaciência de uma parte dos adeptos do FC Porto surgiram após apenas 11 jogos da nova temporada. No encontro da Liga Europa contra o Manchester United e no campeonato frente ao Braga, a conhecida exigência dos adeptos do clube azul e branco manifestou-se através de assobios em certos momentos do jogo, uma atitude que, segundo as opiniões recolhidas por O JOGO, é considerada tanto legítima como prematura.
Na realidade, os dragões já conquistaram um troféu (Supertaça) contra um rival direto (Sporting) e, até ao momento, registaram oito vitórias em dez desafios desde o início da temporada até esta pausa para as selecções. Além disso, o escritor Francisco José Viegas recorda que a equipa de Vítor Bruno está a “passar por um processo, muito necessário, de transformação”. O músico Miguel Guedes, por sua vez, afirma que “a equipa tem conseguido resultados que nos permitem uma projeção de esperança”.
Miguel Brás da Cunha, advogado e membro do Conselho Superior do FC Porto, interpreta esta atitude como “a vontade dos sócios de quererem ver a equipa a jogar na perfeição”, e assinala que “não é diferente do que ocorre em outros estádios e do que se passava nas Antas”. O célebre “tribunal” do antigo estádio do Porto parece agora estar mais presente do que nunca no Dragão, mas Paulo Teixeira está convicto de que “os assobios serão passageiras”. “Em breve, os que assobiam vão aplaudir”, acrescenta o advogado, que é também membro eleito daquele órgão consultivo dos azuis e brancos nas últimas eleições.
O próximo encontro em casa do FC Porto está marcado para o final do mês, frente ao Hoffenheim, e terá uma importância redobrada devido ao início complicado na Liga Europa. Uma exibição sólida, acompanhada de uma vitória, ajudará a silenciar alguns assobios.
Dupla a pedir calma
Os assobios dirigidos ao Braga levaram a uma reação de Galeno e Samu. O extremo apelou à calma, enquanto o avançado repetiu um gesto que já tinha feito contra o United, simulando um assobio e, em seguida, fazendo um gesto de reprovação com o dedo indicador, pedindo apoio.
Inquérito
1 Como interpreta os assobios que se ouviram com o Manchester United e o Braga?
2 Samu e Galeno pediram calma. Que impacto têm estas reações dos adeptos na equipa?
3 Tendo em conta o que aconteceu até agora, considera que são justificados?
“Equipa e clube em transformação”
1 Se se trata de “interpretar”, considero que são reações normais. A equipa também já tinha sido assobiada mesmo quando a guarda pretoriana estava em jogo. É natural que alguém assobie após uma série de falhanços, e que depois exploda de alegria. É uma troca: dás-me bom futebol e eu retribuo com aplausos. Os assobiadores são, depois, os primeiros a celebrar.
2 Aplaudo o gesto de Samu e Galeno. Demonstra que perceberam que têm uma multidão exigente ao seu lado e dirigiram-se diretamente a ela. Acredito que parte dessa multidão (excluindo alguns, a “tribo fúnebre”) acalmou. Sentiram-se ouvidos.
3 Acredito que a equipa e o clube estão a passar por um processo, muito necessário, de transformação e reconstrução. Não será, nem é, um processo fácil ou rápido. Será doloroso e exigirá um compromisso com os adeptos. A imensa maioria compreende que será um tempo de muito trabalho.
Francisco José Viegas, escritor
“É preciso paciência”
1 As reações dos adeptos são sempre legítimas. No entanto, numa fase tão prematura, em que se está a adicionar rotinas às que já se tinham e a tentar crescer na competição, os adeptos não estão a usar a melhor tática para ajudar.
2 Os jogadores têm de saber como lidar com as reações da massa adepta, e os adeptos têm de os compreender. Se pedem apoio e, de uma forma natural, que não sejam assobiados, os adeptos não devem levar a mal esses gestos simbólicos dos jogadores, uma vez que são feitos com o maior respeito. Tanto os jogadores como os adeptos estão sujeitos a críticas, mas os sócios é que têm sempre a palavra final.
3 É necessário paciência, uma vez que há muito a ser construído. A equipa tem conseguido, com algumas exceções, resultados que nos permitem uma projeção de esperança. É preciso um sentido crítico, mas também um apoio incondicional.
Miguel Guedes, músico
“Os que assobiam vão aplaudir”
1 Sou um adepto como a maioria, com um nível de exigência elevado, mas não assobiei. No FC Porto, a fasquia é muito alta e, por vezes, a nossa exigência leva ao assobio. Estamos habituados a ganhar e, por isso, compreendo, mas também é necessário ter em conta que estamos a lidar com uma equipa jovem, que está em fase de formação e de mudança de ciclo.
2 Essas reações são uma prova clara de que estão a dar o seu melhor, pois não querem ouvir assobios. É uma situação pontual. Os jogadores já demonstraram, na Supertaça e em outros jogos em que estiveram a perder, que se esforçam ao máximo. Errar é humano, e reconhecer o erro é uma atitude positiva.
3 Não. No entanto, o domingo também foi um dia atípico, com o mau tempo, e é natural que as pessoas tivessem um estado de espírito diferente. Estou convicto de que esses assobios serão passageiras e, em breve, os que assobiam vão aplaudir.
Paulo Teixeira, advogado
“É a vontade de ver a perfeição”
1 Interpreto como tem sido ao longo de todas as épocas: é a vontade dos sócios de quererem ver a equipa a jogar de forma perfeita. E quando isso não acontece, ficam ansiosos e assobiam. Não é diferente do que acontece em outros estádios e do que se passava nas Antas.
2 Quando o FC Porto joga em casa, a expectativa é que a equipa seja apoiada do início ao fim, quer o desempenho seja bom ou menos bom. É natural que, para uma equipa jovem como a que temos, possam sentir mais esses momentos de maior ansiedade nas bancadas. Pode haver uma ansiedade um pouco maior, mas a equipa sentirá que tem e pode contar com o apoio, independentemente do que se passar.
3 O que qualquer portista deseja ver é apoio desde o início até ao fim, seja no estádio ou no Dragão Arena. Não há momento bom para a equipa ouvir assobios.
Miguel Brás da Cunha, advogado