Futebol

Entrevista de Brahimi ao Porto Canal

Argelino identificou, em declarações ao Porto Canal, aquele que considera ter sido o pior momento do seu trajeto desde que assinou pelo FC Porto.

Derrota na Taça de Portugal frente ao Braga: “Foi a forma como perdemos, foi duro. Estávamos a perder 2-0, empatámos ao minuto 90+4 e eu pensei: “vamos ganhar”. Houve uma euforia, fomos aos penáltis e tínhamos na cabeça que íamos ganhar. E perdemos! Para mim foi o momento mais difícil desde que cheguei ao FC Porto. Dois anos a jogar no Porto e não ganhar nada… para mim era impossível. Foi muito difícil!”

Volta por cima após início de época fora das opções: “Para mim, no futebol há momentos que são mais difíceis do que outros. Eu sempre uma linha de orientação comigo, que é trabalhar, trabalhar, trabalhar. Porque falar não serve de nada. Podes falar, criticar, mas não serve de nada. Restou-me trabalhar e estar seguro de que o meu momento haveria de chegar. Depois, quando chegar, tens de aproveitá-lo. Eu sou assim: trabalho e não penso em mais coisas. É possível que quando tive 17/18 anos estivesse um pouco nervoso, impaciente, mas a cada ano que passa estou mais tranquilo, com mais maturidade. Sempre que entrava tentava fazer o meu máximo para ajudar os meus companheiros e a equipa”.

Após a vitória sobre o Bayern de Munique [Liga dos Campeões 2014/15], a equipa chegou a pensar ir longe?: “Depois de vencermos no Porto 3-1, sabíamos que o jogo da Alemanha ia ser difícil, todos sonhámos em passar à meia-final. Ir sem os dois laterais foi determinante. Esse jogo foi duro para mim, acho que podíamos ter feito melhor, mas são coisas que acontecem no futebol e são experiências para o futuro. Acabámos esse ano com muitas desilusões porque tínhamos equipa para ganhar a Liga, falhámos em momentos cruciais, importantes. Ainda hoje não sei como não conseguimos ganhar nada nesse ano. Não sei o que dizer mais, é quase inexplicável”.

Isso influenciou a equipa na época seguinte?: “Sim, influenciou. O facto de estar há dois/três anos sem ganhar nada meteu-se na nossa cabeça. Na Champions tínhamos dez pontos, mas perdemos em casa com o Dínamo Kiev. Esse momento marcou a época, pois sabíamos que com um empate estávamos qualificados. Não sei também o que se passou, perdemos 2-0 em casa contra uma equipa – embora com respeito – acho que podíamos ter ganho ou, no mínimo, empatar. Depois tínhamos de ganhar em Londres ao Chelsea e era muito difícil. Não sei se foi a partir deste momento que as coisas começaram a ficar difíceis porque acabámos o ano em primeiro. Depois perdemos contra o Sporting e a partir do empate do Rio Ave, em casa, foi complicado. É possível que o grupo se sentisse com mais pressão ao jogar no Dragão, eles esperavam muito de nós. Depois trocámos de treinador e tudo isso teve um efeito um pouco estranho. Havia muitas coisas contra nós. Quando perdemos com o Tondela, tivemos 15 ocasiões. Mas nós tivemos responsabilidade, não fizemos coisas bem”.

Muçulmano no futebol: “Sim, sim, para mim a coisa mais importante da vida é Deus. Não vou demonstrar a toda a gente que creio em Deus. É entre mim e Deus. Vivemos muito bem por este tipo de coisas. São companheiros muito abertos, há gente que crê em coisas diferentes. Estou feliz e orgulhoso de fazer parte. Vamos acabar este ano com títulos”.

Infância em França: “Os meus pais são argelinos, é um facto, mas é verdade que nasci em França. Um país muito bom, no qual fiz toda as etapas da minha formação. Vivi com os meus pais e um irmão até aos 11 anos e depois fui para uma academia, que se chama Clairefontaine”

Sonho começou na rua: “É verdade, comecei a jogar na rua, quando tinha quatro/cinco anos. E desde pequeno, tal como muitos amigos meus, tinha o sonho de chegar a jogador profissional. Tive a sorte de ter o meu primeiro clube muito cedo, logo aos cinco anos, e a partir desse momento foquei-me em ser jogador de futebol”.

Hipótese de jogar por França: “Sim, é verdade. Estive até aos sub-21 na seleção francesa, tenho amigos de outros países como os Camarões, Costa do Marfim. Em França, sobretudo em Paris, há muitos jogadores de diferentes origens que chegam a diferentes seleções”.

Opção da Argélia: “Sempre me senti argelino, no futebol sempre me senti assim. Queria jogar pela Argélia. Foi uma decisão de coração. Mas tenho de agradecer todo o tempo que passei na formação de França. Agradeço, mas no coração sempre tive a vontade de representar a Argélia. Isso para mim era claro, não havia dúvidas! Foi a oportunidade que tive de jogar o primeiro Mundial e foi histórico porque foi a primeira vez que a Argélia chegou aos oitavos de final. Foi um sonho realizado

Momentos difíceis em França: “Claro que passámos por momentos difíceis, mas eu, pessoalmente, sempre vive bem em França. Claro que as dificuldades existem sempre para todos os jogadores. Mas as minhas origens deram-me mais vontade para seguir em frente. Ainda hoje, quando entro em campo nos jogos e nos treinos, recordo-me de onde vim e tudo o que fiz para chegar aqui. Para nunca parar e seguir sempre em frente”.

Início a imitar os ídolos: “Quando jogas na rua tentas sempre imitar os grandes jogadores, desde Zidane, Ronaldinho, todo esse tipo de jogadores. Sempre que via um jogador a aplicar uma técnica nova, um drible novo, tentava fazê-lo. Não sei se aprendi a minha forma de jogar na rua ou no campo, mas o mais importante na rua é a técnica e não o físico”.

Interesse do FC Porto depois do Mundial'2014: “Começou antes do Mundial e intensificou-se o interesse durante e depois. Foi através do Lopetegui e quando vi o interesse de um clube como o Porto para mim foi top. Eu queria jogar num grande clube e, como tal, foi uma decisão fácil de tomar”.

Em 2014/15 chegaram 16 jogadores novos ao clube, sentiu que entusiasmou os adeptos?: “Na verdade, o Mundial ajudou-me muito e quando cheguei aqui senti que as pessoas esperavam muito de mim. E isso foi muito bom”.

Primeiras sensações no estádio, centro de treinos e cidade: “Foi a minha primeira vez em Portugal. A primeira coisa que fiz foi visitar o estádio e a primeira coisa que mais me surpreendeu foi o museu. Quando vi os troféus, todas as taças que o clube ganhou senti logo que estava num clube top, muito grande. A partir desse momento senti mais força a dar pelo clube. Estava muito feliz”.

Primeira apresentação aos adeptos: “Era completamente diferente do Granada, um clube que gosto muito. Era diferente jogar num clube para não descer e um em que jogas sempre para ganhar. São duas coisas completamente distintas. Sou um ganhador, quero sempre ganhar. E ao vir para o Porto não podia pedir mais”.

Brahimi ainda recordou o golo de calcanhar que apontou ao Leicester, na goleada dos azuis e brancos frente aos campeões ingleses: “Depois disso toda a gente me perguntava se tinha visto o golo do Madjer ao Bayern na final… Foi um orgulho para mim e estava feliz por ajudar a minha equipa. Fizemos um grande jogo, que nos deu a qualificação para a Champions. Sempre que joga, ainda para mais no Dragão, estou muito feliz. Não me incomoda nada ser comparado ao Madjer, mas todos os jogadores são diferentes. É uma honra para mim ser comparado a ele”.

Expulsão frente ao Moreirense e tema das arbitragens: “Era importante para nós não pensar mais nos árbitros. Se entrássemos em campo a pensar que aquele árbitro nos iria prejudicar, seria complicado. Somos jogadores, temos de pensar só em marcar golos, em defender e jogar bem. Temos de ter confiança nos árbitros. Foi importante perceber isso porque estamos mais focados no futebol”.

Críticas por não ser “jogador de equipa”: “Já ouço esse tipo de críticas desde os meus 15 anos. Por não me conhecerem e pela minha forma de jogar, às vezes podem pensar que sou individualista, por exemplo. Mas tudo o que faça em campo é em prol da equipa, quando driblo, quando defendo, quanto remato é sempre para ajudar os meus companheiros e para que a equipa ganhe. Não faço um passe porque sou egoísta, nunca! Qualquer tipo de crítica não me faz nada porque sei quem sou, meus companheiros também, não sou uma pessoa pretensiosa, que pensa que é o melhor do Mundo, nunca! Sou simples e quero sempre que a minha equipa ganhe quando entro em campo. Sou o mesmo de sempre, desde pequeno. Não mudei. Marque 15 golos, ou não, serei sempre a mesma pessoa. Antes de ser um jogador, sou homem. Nunca carreira, há momentos bons e outros mais difíceis”.

Golo de Rui Pedro: “Não sei se era falta de sorte, não se explicar isso. Mas esse golo, já no fim, mudou muitas coisas. Estávamos numa fase de empatar jogos, em que criávamos 15 oportunidades e não fazíamos golo. A bola não queria entrar. O golo do Rui Pedro foi muito importante para a confiança do grupo e para o resto do campeonato”.

Chegada de Soares: “Os golos que ele marca e a sua presença em campo ajuda-nos muito. Precisamos de jogadores como ele para conseguir os nossos objetivos”.

Obsessão sadia pelo título: “Sim, claro, não podemos mentir. E digo-o porque tenho isso no coração: queremos ser campeões, não há mais nada que passe pela minha cabeça e posso falar em nome dos meus companheiros. Só temos isso na cabeça. Vamos lutar até ao fim para conseguir este objetivo”.

Estreia e primeiro golo pelo FC Porto aconteceram frente ao Lille, clube com quem se tinha estreado também no Rennes: “O estádio do Lille já é outro, novo. Foram dois jogos importantes, não era a fase de grupos da Champions, mas era quase. E tinha muita força para estar presente na Champions. No segundo jogo, em casa, fizemos uma boa exibição e marquei o meu primeiro golo. Estava muito feliz. Já fazia muito tempo que não fazia um golo de livre”.

Empatia com os adeptos: “Depois deste jogo [Lille] senti isso. É sempre bom quando sentimos que nos empurram para fazer melhor”.

Hat-trick frente ao BATE Borisov: “Foi a primeira vez que fiz três golos e também o meu primeiro jogo na fase de grupos da Champions. Foi uma noite incrível, ganhámos 6-0, e marquei de livre novamente. Não é todos os dias que marcas três golos. Fiquei com a bola do jogo, que foi assinada por todos os jogadores do Porto que estiveram em campo”.

Deco e FC Porto campeão europeu em 2004: “O que mais me surpreendia era o facto de haver sempre muitas mudanças e [o FC Porto] mantinha o nível desportivo. E o incrível é que ficava mais forte com jogadores que de início quase ninguém conhecia. E, entretanto, ficaram jogadores top. O Deco já conhecia, era top”.

Primeira vénia dos adeptos: “Na verdade, fiquei um pouco surpreendido porque fazia apenas mês e meio/dois meses que estava no FC Porto e isso dá-me mais força e estou mais orgulhoso de vestir esta camisola”.

 

(Fonte ojogo.pt)